Pesquisa busca entender motivos que levam à pedofilia
Um projeto estuda imagens do cérebro geradas por estímulos para entender atração sexual por crianças. Por meio de ressonância magnética, cientistas já conseguem identificar pedófilos.
Este estudo inédito uniu cinco centros de pesquisas na Alemanha na busca das causas da pedofilia. Apesar de o tema ser o foco de pesquisas internacionais na França, Canadá e na Escandinávia, são poucos os estudos que associam a pedofilia ao funcionamento do cérebro.
É nessa linha que trabalha o departamento de medicina sexual da Clinica Universitária de Schleswig-Holstein (UKSH), em Kiel, integrante do projeto alemão. Ele é o único dentre os cinco centros que conta com aparelho de ressonância magnética (IRM), capaz de produzir imagens transversais de partes do corpo. A técnica possibilita observar diretamente o cérebro dos pacientes.
"A ressonância magnética oferece condições ideais para o exame das atividades e a estrutura cerebral. Sem precisar abrir a cabeça, podemos dizer com precisão quais áreas do cérebro estão ativas e quais não estão. A resolução da imagem que podemos observar é de cerca de um milímetro", explica o psicoterapeuta Jorge Ponseti.
Coeficiente de inteligência abaixo da média
O uso da ressonância magnética aumentou o conhecimento sobre a pedofilia. Para a medicina sexual, existem características típicas que indicam um diagnóstico. "Os pedófilos têm uma série de abnormalidades neuropsicológicas", diz Ponseti. "Seu coeficiente de inteligência é cerca de oito pontos menor que a média".
"Outro ponto interessante é que a idade da vítima está relacionada com o QI do criminoso sexual", diz o pesquisador. Isso quer dizer que, quanto menor o nível intelectual do infrator, mais jovem é a criança. "Há também evidências de que os pedófilos têm a estatura mais baixa que a média da população. Pesquisadores canadenses também descobriram que pedófilos têm duas vezes mais lesões na cabeça durante a infância que a maioria das pessoas".
Doença ou orientação sexual?
O estudo dos pesquisadores em Kiel é feito em estrito anonimato. No hospital universitário, condições propícias foram criadas para a pesquisa, como uma linha telefônica e o contato direto via internet. "Isso foi muito importante porque nem todo pedófilo abusa de crianças, é o abuso que faz dele um criminoso", diz Ponseti. O pesquisador admite que essa distinção é muito difícil de explicar para pais que sofrem há muito tempo.
O que muitas pessoas não sabem é que, na medicina sexual, a pedofilia é classificada como uma desordem mental, ou seja, uma doença. No entanto, isso só se aplica caso essa descoberta cause danos para outros e para si mesmo. "De acordo com o novo sistema norte-americano de classificação de psiquiatria, um distúrbio pedófilo existe quando uma pessoa tem uma orientação sexual direcionada às crianças e a vivencia, ou sofre com o fato de ter essa orientação sexual", diz Jorge Ponseti. "Se o pedófilo tem uma tendência sem cometer um ato contra as crianças, podemos falar da pedofilia como orientação sexual".
Pedófilos comparados a pessoas saudáveis
Os resultados obtidos por Ponseti e seus colegas foram publicados pela Biology Letters da Royal Society britânica. Em seu último estudo, eles analisaram pedófilos e indivíduos saudáveis, que visualizaram imagens de pessoas de diferentes idades. O experimento mostrou que, nos pedófilos, a atividade cerebral na área responsável por reconhecer e processar faces era mais intensa quando esse grupo visualizava rostos de crianças. Já nos adultos saudáveis, a atividade nessa região aumentava quando enxergavam rostos do grupo de sua preferência sexual.
"Aparentemente, o cérebro humano tem um mecanismo que consegue avaliar a idade de uma pessoa por meio do rosto e que, consequentemente, ativa diferentes programas comportamentais", diz Ponseti. Entre os pedófilos, isso seria um padrão analógico somente sob diferentes sinais.
Centro de recompensa ativado
Há cerca de dois anos, os cientistas de Kiel fizeram testes semelhantes no centro de neurologia do hospital universitário. No local, eles também armazenam imagens de computador originadas durante pesquisas feitas com heterossexuais. As imagens mostram zonas do cérebro que ficaram mais vermelhas ou alaranjadas depois de um alto fornecimento de sangue ou teor de oxigênio.
"Pode-se ver nessas imagens o chamado centro de recompensa do cérebro", explica o pesquisador. "Na área do córtex visual, um pouco mais em baixo, a cor se intensifica quando um homem adulto heterossexual vê uma mulher de idade apropriada. Essa mesma área é ativada quando um homem pedófilo vê uma criança nua."
Para realizar esse teste, uma mistura de diversas imagens é mostrada aos participantes. Entre as fotos estão imagens de carros, casas ou cenas de férias, além de imagens que correspondem aos padrões de estímulo dos pedófilos. As imagens da ressonância magnética mostram apenas, inicialmente, blocos brancos e pretos. Os sexólogos recorrem a um complicado algoritmo para fazer a avaliação.
Pedófilo – sim ou não?
"Nós avaliamos a ativação de um único cérebro em relação à ativação média do grupo. Então, temos um número, uma espécie de 'medida' para a pedofilia", explica o pesquisador. "Na comparação com outras pessoas testadas, podemos identificar se a pessoa é ou não um pedófilo. Desde que começamos, há dois anos, acertamos em 95% dos casos", diz Ponseti, sem muito orgulho.
Além da atividade cerebral, os pesquisadores buscam identificar, com a ajuda de imagens, mudanças na estrutura do cérebro. Com a ajuda de um programa especial para tablet, eles avaliam a impulsividade e empatia. "Se fizermos um exame de sangue e tivermos acesso a análises genéticas e de neurotransmissores, talvez seja possível desvendar a pedofilia. Com o exame da ressonância, só podemos dizer quem é ou não é pedófilo – mas infelizmente, não podemos dizer o porquê", comenta Ponseti.
Mesmo que um diagnóstico objetivo da pedofilia seja possível, os cientistas ainda têm muito o que pesquisar. De acordo Posenti, um benefício prático no futuro poderia ser um plano de tratamento para a pedofilia.