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Brasileira: pesquisa aponta novo caminho para vacina da aids

16 out 2012 - 07h35
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Descobertas recentes tornam a cura da aids visível no horizonte. Hoje se sabe muito mais sobre a síndrome da imunodeficiência adquirida do que há 30 anos, quando ela foi descoberta. O resultado desse conhecimento e das campanhas de conscientização é que o número de novos casos tem diminuído ano após ano, em todo o mundo. Com o subsídio dos governos ao coquetel de medicamentos necessário para o portador combater o vírus, os índices de mortalidade caem consideravelmente. Ninguém se arrisca, no entanto, a dizer que esse é um cenário animador, pois não se consegue erradicar a doença apenas com campanhas preventivas. Por isso, a grande batalha científica concentra-se na busca de uma cura para a doença e na produção de vacinas imunizadoras.

A criança se recuperou de uma cirurgia para corrigir um desvio de 42° na coluna vertebral. Ele teve que usar durante três meses a proteção
A criança se recuperou de uma cirurgia para corrigir um desvio de 42° na coluna vertebral. Ele teve que usar durante três meses a proteção
Foto: Barcroft Media / Getty Images

A revista científica Nature destacou, em setembro, uma nova técnica que renova essas esperanças. Uma equipe liderada pelo pesquisador David Watkins, da Universidade de Washington, com a participação de cientistas do Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz), identificou uma característica particular nos controladores de elite. Assim são chamadas as pessoas que possuem o vírus HIV, causador da aids, mas não adquirem a doença. A descoberta é que isso acontece pela ação das células T CD8 protetoras, que, nessas pessoas, atuam matando as células T CD4, que são infectadas pelo HIV.

Embora já houvesse estudos indicando o papel das células T CD8, as pesquisas, até agora, focavam na função dos anticorpos no combate à doença, e pela primeira vez é mostrado que a resposta dessas células pode ser suficiente para o controle do vírus, impedindo a sua progressão. "É como se, na rodovia do estudo de vacinas para a aids, estivéssemos fixando uma placa nova, apontando para um novo caminho, baseado na abordagem celular", explica a pesquisadora Myrna Bonaldo, chefe do Laboratório de Biologia Molecular de Flavírus do Instituto Oswaldo Cruz e uma das colaboradoras do projeto.

Além dela, participam também Ricardo Galler e Marlon Santana, da Fiocruz, e o também brasileiro Maurício Martins, que faz parte da equipe de Watkins nos Estados Unidos. "O nosso trabalho tem um mecanismo de base celular, mediante o estímulo de produção de células T CD8. Este é um conhecimento que contribui para que se descubra o que é importante no desenvolvimento de uma vacina eficaz", completa Myrna. Portanto ainda não se pode dizer que se está prestes a descobrir uma cura. Isso ainda vai depender de mais pesquisas - e tempo. "Os resultados obtidos neste estudo podem em muito ajudar o estabelecimento de estratégias de vacinação para o HIV. Entretanto é prematuro demais falar em uma potencial formulação de vacina", diz a pesquisadora.

T CD8

A pessoa se torna portadora do vírus HIV quando este infecta as células T CD4, nas quais irá se replicar, gerando mais vírus, que infectarão mais células do mesmo tipo. Nas pessoas em que o HIV é controlado, as células T CD8 atuam como assassinas, matando as células contaminadas. "São células com capacidade citotóxica, isto é, que podem reconhecer células com alterações, como as cancerosas ou infectadas com um vírus, por exemplo, e eliminá-las do organismo, matando-as", explica Myrna Bonaldo, lembrando que um em cada 300 pacientes é controlador de elite e não precisa de medicamentos para ter a doença sob controle.

A pesquisa originou-se de um estudo da própria Myrna, patenteado pela Fiocruz em 2005, que propunha a engenharia de novas vacinas a partir da introdução de modificações genéticas. Para o trabalho liderado por Watkins, foi inserido em um grupo de macacos o vírus SIV, semelhante ao HIV, e parte deles recebeu compostos indutores de produção de células T CD8. Esses tiveram a replicação viral reduzida substancialmente. Segundo Myrna, foi identificado nesse estudo que o aumento na produção das T CD8 ocorre de forma independente à ação dos anticorpos.

A DOENÇA

O vírus da imunodeficiência humana, HIV, é o causador da aids. Quando uma pessoa é infectada, o vírus reduz progressivamente a eficácia do sistema imunológico. Dessa forma, alguma infecção oportunista que, em outras pessoas, poderia ser apenas um incômodo, a um portador de aids pode ser fatal, dependendo do estágio da enfermidade. Apesar de ter sido descoberto apenas em 1981, estima-se que o HIV exista desde o final do século 19 ou início do 20. Ele descende do vírus da imunodeficiência símia, o SIV, que teve origem na África. Quem tem acesso ao coquetel de medicamentos que compõem o tratamento antirretroviral tem prolongada a sua vida e sofre muito menos. Apesar de retardar o curso da doença, não se trata de uma cura ou vacina.

fita vermelha tornou-se o símbolo da luta contra a aids em 1991, quando a doença ultrapassou a marca dos 10 milhões de infectados no mundo. Hoje, estima-se que sejam 34 milhões, dos quais 90% estão no continente africano. De acordo com o boletim epidemiológico de 2011, divulgado pelo Ministério da Saúde brasileiro, o país tem 608 mil portadores do vírus.

PESQUISAS

Desde a descoberta da doença, o desenvolvimento de sua cura virou um dos grandes objetivos da medicina no mundo todo. Um caso que se tornou um símbolo dessa luta - e desse avanço científico - foi o do americano Timothy Brown, também conhecido como o "Paciente de Berlim", que em 2007 recebeu células-tronco de um doador que possuía uma mutação genética que o tornava resistente ao vírus. As células T CD4 do doador, que são infectadas pelo HIV, não possuíam o receptor CCR5, a porta de entrada do vírus. Brown foi diagnosticado então como curado, pois o vírus não se manifestou mais. Entretanto ainda não é possível que o procedimento seja feito em larga escala, pois os custos são altos, o transplante é arriscado e é muito difícil encontrar doadores compatíveis.

"A descoberta de uma vacina é a grande esperança de conter a epidemia, mas o seu desenvolvimento demanda um esforço coletivo internacional, que envolve pesquisadores, sociedade civil, instituições governamentais, acadêmicas, iniciativa privada e pessoas vivendo com HIV e aids", diz José Carlos Veloso, ex-presidente do Grupo de Apoio à Prevenção à Aids (Gapa) de São Paulo. O professor Enrique Roberto Argañaraz, do Departamento de Farmácia da Universidade de Brasília, é otimista em relação às pesquisas, mas pensa que o Brasil poderia participar mais. "Várias vacinas foram desenvolvidas nos últimos anos com resultados promissores em testes com macacos. Existe uma intensa atividade de pesquisa nessa área, o que lamentavelmente não acontece aqui no Brasil."

Entre os pesquisadores, a descoberta da cura é geralmente tratada com muita cautela. O próprio David Watkins, depois de anunciar a nova abordagem proposta, lembrou que, após a descoberta do vírus, em 1981, falou-se que em dois anos se chegaria a sua cura. "Este é um percurso difícil e ainda temos muito chão a percorrer. Trata-se de um vírus com altíssima variabilidade genética, portanto é como se tentássemos atingir um alvo que se movimenta", opina Myrna Bonaldo.

Enquanto isso, a virologista francesa Françoise Barre-Sinoussi, vencedora do prêmio Nobel da Medicina e uma das pesquisadoras da equipe que descobriu o vírus, dá manifestações de que a cura está à vista, mostrando-se otimista com o caso do paciente de Berlim. Ele concorda: "Há muito ceticismo, mas quero deixar claro: agora sou HIV negativo", declarou Timothy Brown na 19ª Conferência Internacional sobre a Aids, em julho deste ano. Ao lançar sua própria fundação de pesquisas sobre a doença, ele afirmou: "A esperança está viva, e a cura, no horizonte".

Fonte: GHX Comunicação
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