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Cientistas visitam museu que interpreta evolução com a Bíblia

Cientistas visitam museu que interpreta evolução com a bíblia

3 jul 2009 - 10h46
(atualizado às 11h21)
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Kenneth Chang

A Dra. Tamaki Sato ficou um pouco confusa na ala dos dinossauros. Os cartazes descreviam os diversos dinossauros como originários de diferentes períodos geológicos - o estegossauro, do jurássico superior; o heterodontossauro, do jurássico inferior; o velociraptor, do cretáceo superior - , mas em cada um dos casos, a data de extinção oferecida na ficha de informações era a mesma: por volta de 2.438 AC.

"Eu fiquei curiosa quanto ao motivo para essa informação", diz Sato, professora de geologia na Universidade Tokyo Gakugei, no Japão. Para paleontologistas como Sato, as camadas de rochas da crosta terrestre representam acumulações de centenas de milhões de anos, e o jurássico inferior é um período muito mais velho que o cretáceo superior.

Mas no Museu da Criação, em Petersburg, no norte do Estado do Kentucky, a Terra e o universo têm pouco mais de seis mil anos de idade, e foram criados por Deus. O lema do museu afirma que "fatos iguais, conclusões diferentes", e interpreta os dados geológicos e paleontológicos de forma inequívoca: à luz de uma leitura literal da Bíblia.

Na interpretação criacionista do universo, as camadas de rochas foram todas formadas em um evento único - o dilúvio mundial no qual Deus decidiu limpar a terra de todas as criaturas exceto aqueles que estavam reunidas na arca de Noé - , e portanto todos os dinossauros morreram em 2348 AC, o ano do dilúvio.

"Isso foi uma das coisas que aprendi aqui", disse Sato, depois de sua visita ao museu. Os mundos da paleontologia acadêmica e do criacionismo raramente convergem, mas o primeiro fez uma visita ao segundo na quarta-feira desta semana. A Universidade de Cincinatti estava promovendo a Convenção Paleontológica Norte-Americana, na qual os cientistas apresentam os resultados de suas mais recentes pesquisas sobre as fronteiras do passado distante. Os participantes deixaram de lado as palestras convencionais por uma tarde, no entanto, e 70 deles embarcaram em ônibus escolares para uma visita ao Museu da Criação, localizado do lado oposto do rio Ohio.

"Eu estou muito curioso, e fascinado", disse o Dr. Stefan Bengtson, professor de paleozoologia no Museu Sueco de História Natural, antes da visita, "porque na Suécia não temos muitas coisas como essa".

O Dr. Arnold Miller, professor de geologia na Universidade de Cincinatti e presidente do comitê de organização da convenção paleontológica, sugeriu a visita. "Os acadêmicos tendem a ignorar com demasiada frequência aquilo que acontece no mundo em torno deles", ele afirmou. "Sinto que seria no mínimo valioso para os meus colegas descobrir um pouco sobre a forma pela qual os criacionistas estão retratando não só a mensagem deles mas a mensagem da paleontologia, e a da teoria da evolução".

Desde que o museu abriu as portas, dois anos atrás, a instituição recebeu 750 mil visitantes, mas os visitantes da quarta-feira foram o primeiro grande grupo de paleontologistas a aparecer por lá. O museu recebeu o grupo de visitantes atípicos com a hospitalidade generosa que o caracteriza. "Deus seja louvado, estamos tão felizes por receber vocês", disse Bonnie Mills, uma das recepcionistas do museu.

Os cientistas fizeram a visita pagando o preço de turnês em grupo, que dá direito a um almoço como bônus. O Dr. Terry Mortensen, professor e pesquisador da Answers in Genesis, a organização religiosa que construiu e opera o Museu da Criação, afirmou que não esperava que a visita resultasse em muitas mudanças de opinião. "Tenho certeza de que eles em geral terão opinião diferente daquela que é apresentada aqui", disse Mortenson. "Mas lhes daremos a liberdade de ver tudo aquilo que desejarem".

Perto da entrada das galerias do museu existe um display animado que inclui uma menina alimentando um esquilo com uma cenoura, sob o olhar de dois dinossauros posicionados nas proximidades, o que representa uma severa dissonância quanto à postura dos museus de história natural, segundo os quais os seres humanos viveram 65 milhões de anos depois dos dinossauros.

"Estou sem fala", disse o Dr. Derek Briggs, diretor do Museu Peabody de História Natural, na Universidade Yale, que percorria as galerias com os braços cruzados à altura do peito e uma careta de espanto. "É bem assustador".

Morteson e os demais funcionários do museu afirmam estudar as mesmas rochas e fósseis que os cientistas visitantes, mas que chegam a conclusões diferentes das de seus colegas porque partem de premissas diferentes. Por exemplo, eles afirmam que o dilúvio bíblico deu início a um gigantesco choque no interior da Terra que resultou na separação dos continentes e os conduziu às suas posições atuais, em lugar de acreditarem que o movimento dos continentes levou alguns bilhões de anos.

"Todo mundo trabalha com pressuposições sobre o que devem ser considerado e sobre que perguntas devem ser feitas", diz Mortenson, que tem um doutorado em história da geologia pela Universidade de Coventry, Inglaterra. "As primeiras duas salas de nosso museu falam sobre essa questão dos pontos de partida e das suposições. Nós contestamos de maneira muito vigorosa a posição dos evolucionistas, a de que eles estão deixando que os fatos falem por si mesmos".

A apresentação do museu atrai visitantes como Steve Leinberger e sua mulher Deborah, que vieram com um grupo da Igreja Luterana da Confissão, de Eau Claire, Wisconsin. "É isso que deveria ser ensinado até mesmo nas aulas de ciências", ele afirma.

Os fundadores do museu decidiram instalá-lo na região de Cincinatti porque ela fica a um dia de viagem de carro de dois terços da população dos Estados Unidos. A área há muito atrai as atenções dos paleontologistas, porque apresenta algumas das rochas com maior presença de fósseis na América do Norte, e é fácil, em algumas regiões, encontrar bem perto da estrada fósseis datados de milhões de anos. As rochas são tão bem conhecidas que seu nome é "Série Cincinatti", e representam um período de tempo que se estende de 453 milhões a 441 milhões de anos atrás.

Muitos dos paleontologistas consideram que o museu os representa de forma equívoca e ridiculariza, além de responsabilizá-los injustamente pelos males da sociedade.

"Creio que deveriam mudar o nome do museu, de Museu da Criação para Museu da Confusão", disse Lisa Park, professora de paleontologia na Universidade Akron. "Infelizmente, eles agem dessa forma deliberadamente", ela acrescenta. "Fico chocada. Como cristã, fico chocada".

Bengtson aponta que para explicar como as poucas espécies que poderiam ter sido transportadas pela arca se transformaram na multidão de animais que hoje conhecemos em espaço de apenas alguns milhares de anos, o museu afirma simplesmente que "Deus ofereceu aos organismos ferramentas especiais para que mudassem rapidamente".

"Ou seja, eles admitem em uma sentença que a evolução é real", diz Bengtson, "mas precisam invocar a magia para explicar como ela funciona".

No entanto, mesmo alguns dos que discordam sobre a informação e a mensagem do museu reconhecem que ele tem seus atrativos. "Odeio que isso aqui exista", diz Jason Rosenhouse, matemático na Universidade da Virgínia que mantém um blog sobre questões evolutivas. "Mas, já que existe, tenho de admitir que é divertido. O espetáculo é bacana, se você for uma pessoa crédula.

Pelo final da visita à galeria dos dinossauros, Briggs parecia estar se divertindo. "Gostei dos dinossauros na arca", diz. (Cerca de 50 espécies de dinossauros subiram à arca de Noé, o museu explica, mas depois pereceram por motivos desconhecidos.)

O museu, ele compreende, não deve mudar aquilo em que muita gente acredita. "Mas precisamos nos preocupar com as crianças", afirma.Sato comparou a instituição a um parque de diversões. "Gostei tanto daqui quanto da Disneylândia", ela comentou. E ela gostou da Disneylândia?"Não muito", afirmou.

The New York Times
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