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Legado de inventor que queria energia pelo ar corre perigo

6 mai 2009 - 14h54
(atualizado às 17h13)
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William J. Broad

Em 1901, Nikola Tesla começou a trabalhar em um sistema global de torres gigantes destinado a transmitir pelo ar não apenas notícias, informações da bolsa e imagens, mas também - sem o conhecimento de investidores como J. Pierpont Morgan - eletricidade gratuita para todos. Esse foi o maior projeto do inventor, e seu mais audacioso.

Nikola Tesla iniciou em 1903 um audacioso projeto para transmitir eletricidade gratuita pelo ar
Nikola Tesla iniciou em 1903 um audacioso projeto para transmitir eletricidade gratuita pelo ar
Foto: The New York Times

A primeira torre foi erguida na rural Long Island de 1903 e tinha mais de 18 andares de altura. Em uma noite de verão, ela emitiu um ruído abafado e depois lançou raios de eletricidade pelo céu. Segundo o New York Sun, as luzes cegantes "pareciam disparar para a escuridão em uma viagem misteriosa". Mas o sistema fracassou por falta de dinheiro e, pelo menos parcialmente, viabilidade científica. Tesla nunca terminou o protótipo de sua torre e foi forçado a abandonar seu laboratório adjacente.

Hoje, um conflito paira sobre os vestígios fantasmagóricos do local, chamado Wardenclyffe - considerado por especialistas em Tesla o único local de trabalho remanescente do excêntrico gênio, que sonhou coisas incontáveis enquanto foi pioneiro na comunicação sem fio e na corrente alternada. A discordância surgiu recentemente após a propriedade ter sido posta à venda em Shoreham, Nova York.

Um grupo de cientistas de Long Island quer transformar a área de 6,4 hectares em um centro educativo e museu sobre Tesla, e espera conseguir a doação do terreno para esse fim. Mas a dona, Agfa Corp., afirma que precisa vender a propriedade para levantar dinheiro em tempos econômicos difíceis. A imobiliária da companhia diz que o terreno, avaliado em US$ 1,6 milhão, pode "ser entregue totalmente limpo e aplainado", um anúncio que pôs conservacionistas em ação.

As ruínas de Wardenclyffe incluem as fundações da torre e o grande laboratório de tijolos, projetado por um amigo de Tesla, Stanford White, o célebre arquiteto. "É imensamente importante preservar essa área", disse Marc J. Seifer, autor de "Wizard", uma biografia de Tesla. "Ele é um ícone. Ele defende aquilo que humanos deveriam fazer - honrar a natureza enquanto usam alta tecnologia para canalizar seus poderes."

Recentemente, o Estado de Nova York respondeu à avaliação. O comissário de preservação histórica escreveu a Seifer em nome do governador David A. Paterson para apoiar a conservação de Wardenclyffe e tombá-lo no Registro Nacional do Patrimônio Histórico. Em Long Island, admiradores de Tesla prometem obter o terreno de uma forma ou de outra, dizendo que salvar um símbolo das conquistas de Tesla ajudaria a recuperar a posição merecida do visionário como um arquiteto da idade moderna.

"Muito de seu trabalho estava à frente de seu tempo", disse Jane Alcorn, presidente do Tesla Science Center, um grupo privado de Shoreham que tenta adquirir Wardenclyffe. O doutor Ljubo Vujovic, presidente da Tesla Memorial Society of New York, disse que destruir o antigo laboratório "seria algo terrível para os Estados Unidos e o mundo. Faz parte da história".

Tesla, que viveu de 1856 a 1943, fez inimigos ferozes que desprezaram algumas de suas alegações, chamando-as de exageradas, o que contribuiu para manchar sua reputação em vida. Ele era em parte um homem recluso, em parte um exibicionista. Ele publicou fotos de divulgação (que na verdade foram tiradas em dupla exposição) que o mostravam lendo sossegado em seu laboratório em meio a raios mortíferos. Hoje, os trabalhos de Tesla tendem a ser pouco conhecidos entre cientistas, embora alguns o chamem de gênio intuitivo na vanguarda de seus colegas.

Socialmente, sua popularidade aumentou, elevando-o ao status de cult. Livros e websites se multiplicam. A Wikipédia afirma que o inventor obteve pelo menos 700 patentes. O YouTube tem vários vídeos de Tesla, inclusive um de uma invasão em Wardenclyffe. Uma banda de rock se chama Tesla. Uma companhia de carros elétricos amparada pelos fundadores do Google se nomeou Tesla Motors.

Larry Page, co-fundador do Google, vê a vida do inventor como uma lição de cautela. "É uma história muito triste", disse Page à revista Fortune no ano passado. O inventor "não conseguia comercializar nada. Ele mal conseguia bancar sua própria pesquisa". Wardenclyffe é uma síntese desse tipo de falta de praticidade visionária.

Tesla iniciou o projeto colossal aos 44 anos, quando vivia na cidade de Nova York. Um bon vivant impecavelmente vestido de origem sérvia, ele ganhou grande fama por invenções de motores e sistemas de distribuição de energia que usam uma forma de eletricidade conhecida como corrente alternada, que supera a corrente contínua (e Thomas Edison) no fornecimento de eletricidade no mundo.

Suas patentes o tornaram um homem rico, pelo menos por um tempo. Ele morava no hotel Waldorf-Astoria e adorava passar o tempo entre famosos no restaurante Delmonico's e no Players Club. Por volta de 1900, enquanto Tesla planejava o que se tornaria Wardenclyffe, inventores ao redor do mundo corriam em busca do que era considerado o próximo grande salto - a comunicação sem fio. O plano de Tesla era transformar corrente alternada em ondas eletromagnéticas que saíam de antenas para receptores distantes.

Isso é basicamente o que entendemos como transmissão de rádio. Porém, a escala de sua visão era colossal, eclipsando a de qualquer rival. Investidores prestaram atenção, dadas as conquistas de Tesla na eletricidade. O maior deles foi J. Pierpont Morgan, um grande financista. Ele injetou US$ 150 mil (hoje mais de US$ 3 milhões) na aventura mundial sem fio de Tesla.

Os trabalhos no protótipo da torre começaram em meados de 1901, na costa norte de Long Island - uma área que Tesla batizou em homenagem a um benfeitor e aos rochedos da região. "A usina proposta em Wardenclyffe", noticiou o New York Times, "será a primeira de várias que o eletricista propõe criar neste e em outros países".

O choque aconteceu em 12 de dezembro de 1901. Naquele dia, Marconi teve êxito ao enviar sinais de rádio através do Atlântico, acabando com as esperanças de Tesla de glória pioneira. Mesmo assim, Wardenclyffe crescia, com guardas sob ordens estritas de manter visitantes longe. A torre de madeira se estendia por 57 metros acima de uma longa haste que descia 36,5 metros para ancorar a antena. Moradores disseram ao New York Times que o solo sob a torre era "como uma colméia, com passagens subterrâneas".

Próximo à torre, o laboratório de tijolos vermelhos, com janelas em arco e altas chaminés, tinha ferramentas, geradores, uma oficina de usinagem, transformadores elétricos, equipamentos de fabricação de vidro, uma biblioteca e um escritório. Mas Morgan não estava mais encantado. Ele recusou a dar mais dinheiro a Tesla.

Desesperado, o inventor apelou para o que considerava seu ás na manga. As torres transmitiriam não apenas informação ao redor do planeta, escreveu ao financista em julho de 1903, mas também energia elétrica. "Não estou disposto¿, respondeu Morgan friamente, ¿a realizar qualquer outro avanço".

Margaret Cheney, uma biógrafa de Tesla, observou que Tesla havia julgado erroneamente seu rico benfeitor, um homem profundamente comprometido com o lucro. "A perspectiva de transmitir eletricidade para zulus e pigmeus sem um centavo", ela escreveu, deve ter diminuído o entusiasmo do investidor.

Foi aí que Tesla, cambaleando financeira e emocionalmente, ligou a torre pela primeira e última vez. Ele acabou vendendo Wardenclyffe para quitar os US$ 20 mil (hoje cerca de US$ 400 mil) em dívidas contraídas com o Waldorf. Em 1917, os novos proprietários destruíram a torre gigante e a venderam como sucata.

Hoje, o plano exato de Tesla para o local permanece um mistério, mesmo com cientistas concordando sobre a impraticabilidade de sua visão: a torre poderia ter sucesso na transmissão de informação, mas não de energia.

Tradução: Amy Traduções

The New York Times
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