Petróleo não é mais visto, mas ainda polui Golfo do México
Passados quase três anos da catástrofe na costa americana, pouco se vê do vazamento, mas o óleo liberado pela plataforma Deepwater Horizon ainda está lá: dissolvido na água ou em longas faixas no fundo do mar.
Na catástrofe da plataforma Deepwater Horizon, em abril de 2010, entre 500 mil e 1 milhão de toneladas de petróleo cru vazaram no Golfo do México. O acidente teve graves consequências para a vida animal: aves, mamíferos e tartarugas marinhas morreram vítimas das manchas de óleo. A limpeza das praias também implicou a destruição de muitos ninhos e locais de desova de tartaruga.
Hoje, o petróleo quase não pode ser mais visto, e a normalidade parece ter retornado ao Golfo do México – os navios pesqueiros voltaram a circular, e os turistas estão novamente frequentando as praias. Mas isso não significa que o óleo desapareceu. As consequências da catástrofe ainda são sentidas. As taxas de nascimento de golfinhos, por exemplo, são atualmente bem menores do que as de antes da catástrofe.
A principal razão é que mais da metade do petróleo vazado não chegou a atingir a superfície. Ao contrário de um derramamento de óleo de um navio, onde as manchas se espalham na superfície, no acidente da Deepwater Horizon boa parte do petróleo continuou no fundo do mar.
"O poço de petróleo tinha uma enorme pressão", diz Antje Boetius, bióloga do Instituto Alfred Wegener de Pesquisas Marinhas e Polares. E como o vazamento, explica, ocorreu por uma brecha muito estreita, o petróleo acabou saindo em forma de gotas e, por isso, continua no fundo do mar. "Gotas com apenas milésimos de milímetro de tamanho possuem uma superfície tão grande em relação ao seu próprio empuxo que não conseguem mais subir. Elas ficam à deriva em meio às massas d'água", completa a especialista.
Essas finas gotas de petróleo se misturam, entre mil e 2 mil metros de profundidade, com partículas em suspensão, como plâncton e minerais, sendo então aglutinadas. Esse processo as torna mais pesadas, fazendo com que desçam para o fundo do mar. Lá, elas formam novas manchas de óleo.
"Elas se parecem com a poeira em casa quando não é aspirada – só que em vermelho e marrom", descreve Boetius o óleo no fundo do mar, que fica depositado em camadas espessas e nos recifes de corais.
Colônia de bactérias a postos
Como no Golfo do México há uma emersão natural de petróleo, ali se instalaram bactérias que conseguem metabolizar o óleo por meio de enzimas especiais. Essa colônia de bactérias decompõe lentamente o petróleo vazado. Por um lado, isso é bom, já que o óleo desaparece, mas esse produto do metabolismo das bactérias nem sempre é inofensivo, diz Detlef Schulz-Bull, químico do Instituto Leibniz de Pesquisas do Mar Báltico.
O grau de toxicidade de produtos metabólicos bacterianos depende principalmente da composição do petróleo. O petróleo cru contém uma parcela de compostos aromáticos biorefratários altamente tóxicos. Quando as bactérias digerem a complexa mistura que compõe o petróleo, é muito difícil verificar a toxicidade dos produtos metabólicos, adverte Schulz-Bull.
O motivo está no fato de, após o processo de conversão bacteriana, a mistura de substâncias se tornar ainda mais complexa. "E também a sua toxicidade provavelmente aumenta", diz o perito marinho.
O problema principal é que os produtos metabólicos, tais como os ácidos graxos, são mais solúveis em água do que os compostos originais formados por longas cadeias de hidrocarboneto. Por esse motivo, eles também são mais fáceis de serem consumidos por micro-organismos. E, dessa forma, chegam à cadeia alimentar – do plâncton para os peixes, e destes para as baleias, golfinhos e para o prato do ser humano.
Outro problema é que as bactérias consomem grande quantidade de oxigênio, que pode acabar faltando no mar. Em seguida, entram em cena outras bactérias, que não precisam de oxigênio. "Quando elas entram em ação, provocam um efeito colateral desagradável: produzem sulfureto, ou seja, sulfeto de hidrogênio como produto final, espantando assim vermes, mexilhões e peixes", acrescenta Boetius.
Por esse motivo, a princípio, os biólogos temiam que o Golfo do México pudesse se tornar uma poça pútrida. Isso, porém, não aconteceu, já que as fortes correntes proporcionam um fornecimento contínuo de oxigênio e diluem o petróleo e os produtos metabólicos bacterianos.
Solventes retardam degradação natural
No entanto, agora ficou claro que os especialistas em combate à mancha de petróleo não facilitaram o trabalho das bactérias. Para evitar que chegasse à costa, eles pulverizaram grande quantidade do solvente tóxico Corexit sobre o óleo na superfície. Isso fez com que a mancha se dissolvesse, e assim criou-se um novo problema: o óleo e o Corexit chegaram em forma dissolvida à água, contaminando bactérias, larvas de peixes e organismos microscópicos.
"No combate a catástrofes provocadas pelo vazamento de petróleo, é preciso rapidamente estabelecer prioridades", explica Boetius, que diz que, provavelmente, os responsáveis tinham esperança de salvar pássaros, tartarugas e mamíferos marinhos com o uso de Corexit. "E o Corexit faz sentido, porque consegue espalhar o óleo fino. Mas a decomposição por meio das bactérias é retardada, e, quando o petróleo submerge para o fundo do mar, a decomposição é ainda pior."
Schulz-Bull tira daí uma lição: nenhum tipo de solvente deve ser utilizado em grandes derramamentos de petróleo, porque eles escondem somente os efeitos visíveis. Embora não possa ser visto, diz o químico, o petróleo ainda está presente, e a aplicação de Corexit torna tudo pior: "Adiciona-se ao sistema milhares de produtos químicos, que não são inofensivos, mas que em si já são tóxicos. Não se melhora realmente nada."
O químico também considera um erro a queima da mancha de petróleo, como tentou-se no Golfo do México, pois quando isso é feito em temperaturas baixas surgem compostos altamente tóxicos em altas concentrações, como hidrocarbonetos aromáticos policíclicos ou dioxinas. "Isso é um absurdo do ponto de vista ecológico", afirma.
Contra vazamentos de petróleo, só resta uma coisa a fazer, segundo o químico: é preciso cercar o óleo com barreiras de contenção, bombeá-lo e, se isso não funcionar, tentar agregá-lo na superfície, através do uso de materiais ecológicos, como pedaços especiais de madeira. Em seguida, pode-se tentar retirá-lo da superfície marinha.