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Radiogaláxia mais distante da Terra é descoberta com participação de brasileiro - e dá mais pistas sobre o Big Bang

Corpo celeste tem 12,4 bilhões de anos-luz, período em que o universo tinha apenas 7% da sua idade e tamanho atuais.

21 ago 2018 - 06h46
(atualizado às 11h58)
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Num trabalho conjunto, pesquisadores brasileiros e holandeses descobriram a radiogaláxia mais distante da Terra, a 12,4 bilhões de anos-luz, quando o universo tinha apenas 7% da sua idade e tamanho atuais.

Batizada de TGSS J1530+1049, ela bateu o recorde da TN J0924-2201, descoberta em 1999 a 12,2 bilhões de anos-luz. O encontro desse tipo de objeto é importante, porque ensina muito sobre a formação de galáxias e seus buracos negros logo após o Big Bang, a grande explosão que teria ocorrido entre 13,3 ou 13,9 bilhões de anos atrás e dado origem ao cosmo.

O estudo, publicado no Monthly Notices of the Royal Astronomical Society, em 6 de agosto, foi feito pelos alunos de doutorado Aayush Saxena, do Observatório de Leiden, na Holanda, e Murilo Marinello, do Observatório Nacional, que fez um estágio naquele país, por meio um convênio entre os dois institutos e o projeto Jovem Cientista do Nosso Estado da Fundação Carlos Chagas Filho de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (Faperj), do orientador dele, Roderik Overzier.

Radiogaláxias têm um grande buraco negro de alta rotação em seu centro, que emite quantidades colossais de radiação nas ondas de rádio do espectro eletromagnético. Nessas frequências, são como faróis brilhando intensamente nos confins do cosmo, quando o sistema solar nem sonhava em existir.

"Minha pesquisa é voltada para entender como as galáxias ativas funcionam e seu papel no universo", diz Marinello. "Esse tipo difere das normais por possuírem um brilho extraordinário, o qual não pode ser atribuído apenas ao das estrelas que o compõem."

O telescópio Gemini Norte; descoberta contribui para entendimento do Big Bang
O telescópio Gemini Norte; descoberta contribui para entendimento do Big Bang
Foto: Gemini Observatory/AURA image by Joy Pollard / BBC News Brasil

Quasares e espirais

Existem diversas tipos delas, como quasares (fontes extremamente luminosas e distantes, de aparência estelar ou quase estelar, daí o nome quasar QUAsi-StellAr Radio Source), seyfert (espirais que possuem núcleos extremamente pequenos e muito luminosos) e as próprias radiogaláxias. O buraco negro no centro delas, com massa milhões (e até mesmo bilhões) de vezes maior que a do Sol, é circundado por um disco de gás - chamado disco de acreção -, que vai sendo engolido paulatinamente por ele. Esse disco, por sua vez, é circundado por uma estrutura toroidal (que tem o formato de um pneu um pouco achatado) de poeira.

Marinello explica que, nesse processo, a matéria acrescida ao disco libera energia, alguma vezes em forma de poderosos jatos observados em frequências de rádio.

"Quando olhamos para essas galáxias podemos estar vendo diretamente a região nuclear delas, e neste caso as chamamos de quasares", explica. "Quando miramos na direção do toro de poeira, o núcleo fica obscurecido, mas ainda é possível ver os jatos de rádio. Nesse caso, temos o que chamamos de rádio galáxia."

Ou seja, quasares e radiogaláxia podem ser considerados o mesmo tipo de objeto. A diferença está apenas no ângulo que os jatos formam com a linha de visada do observador.

"A aparência delas depende da sua orientação em nossa direção", explica Overzier. "Quando o disco de acreção de gás ao redor do buraco negro e os jatos estão apontados diretamente em nossa direção, vemos um ponto extremamente brilhante. Este é chamado de quasar."

Se o disco de gás e os jatos estiverem apontados, no entanto, em outra direção, não se pode ver o primeiro perto do buraco negro, porque está obscurecido por nuvens de poeira, e os segundo aparecem mais fracos. "Neste caso, a galáxia ativa é do tipo 'quasar obscurecido' ou radiogaláxia (quando tem emissão de radiação na faixa das ondas de rádio por conta de rotação rápida do buraco negro)", diz Overzier.

A descoberta de Marinello não é algo trivial, pois as ativas são raras. Por dois motivos. "Primeiro, porque o período de atividade do buraco negro, que resulta na emissão de energia na frequência de rádio, é sempre curto, algo em torno 10 milhões de anos", explica Overzier. "Portanto, a maior parte do tempo cósmico as galáxias estão inativas. Além disso, as radiogaláxias também precisam ter buracos negros gigantes que estejam girando, o que é ainda menos comum."

Telescópio gigantesco ajudou na descoberta

O telescópio Gemini Norte é um dos maiores já construídos
O telescópio Gemini Norte é um dos maiores já construídos
Foto: Gemini Observatory/AURA / BBC News Brasil

Para descobrir a TGSS J1530+1049, Mainello não ficou apontando a esmo o telescópio para o céu. Ele sabia o que e onde procurar. "Ela foi pré-selecionada pelos nossos colaboradores na Holanda, analisando as imagens em diversas frequências de ondas de rádio", conta. "Esse tipo de análise pode estabelecer um limite inferior para a distância delas. As que foram escolhidas ainda não apareciam em imagens tomadas com telescópios ópticos. A amostra delas tinha características que indicavam que estas eram fontes distantes."

Tendo essas informações, os pesquisadores utilizaram o telescópio Gemini Norte, localizado no Havaí (ele tem "irmão gêmeo", o Gemini Sul, instalado no Chile), que é um dos maiores já construído, com um espelho de 8,2 m de diâmetro. O Brasil é associado a ele, por meio do Laboratório Nacional de Astrofísica (LNA), na cidade de Itajubá (MG). "As imagens em rádio dão uma grande precisão astrométrica, que indica a localização das galáxias no céu, para onde apontamos o instrumento", conta Marinello. "Nós então utilizamos espectroscopia para observá-las."

Ele preparou as observações e analisou os dados obtidos com elas. "Nos espectros da TGSS J1530+1049 encontramos uma única linha de emissão, o que nos possibilitou estimar a distância dela", explica Marinello. "Essa estimativa é feita comparando-se o comprimento de onda no qual a linha é emitida em laboratório e no qual ela é observada na radiogaláxia."

De acordo com ele, quanto mais longe o objeto se localiza, mais deslocada para maiores comprimentos de onda a linha observada estará. "A de hidrogênio que observamos deveria se encontrar no ultravioleta, mas porque a radiogaláxia é muito distante, ela foi observada na região do óptico", diz. "Este método foi o mesmo utilizado em 1999 na descoberta da até então mais afastada de nós."

Além de trazer novos conhecimentos sobre a formação de galáxias e seus buracos negros logo após o Big Bang, a busca pelas que emitem ondas de rádio distantes tem um importante motivo adicional. "No futuro, novos radiotelescópios, como o Low-frequency Array (LOFAR) e o Square Kilometer Array (SKA), serão capazes de analisar seus espectros, para estudar como a luz ionizante produzida pelas primeiras estrelas e galáxias do universo afetou as propriedades do espaço entre elas durante a "época da reionização", diz Roderik.

Esse período durou entre 300 mil e um bilhão de anos depois do Big Bang. Antes disso, o universo era opaco, ou seja, vivia numa espécie de era de trevas, na qual toda a matéria bariônica (aquela composta principalmente de prótons, nêutrons e elétrons) estava na forma, principalmente, de hidrogênio neutro ou não ionizado (e um pouco de hélio e lítio).

Depois das trevas, quando as primeiras estrelas e galáxias se formaram, elas produziram luz ultravioleta capaz de ionizar o hidrogênio neutro, separando o seu próton e elétron até toda a matéria no espaço entre os objetos cósmicos ser reionizada.

"Essa época de reionização é muito importante na cosmologia, mas ainda não é bem entendida", diz Overzier. "Assim, as radiogaláxias também podem ser usadas como ferramentas para descobrir mais sobre esse período."

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