Sphere: casa de shows com megatela esférica funcionaria no Brasil?
Maior estrutura tecnológica esférica do mundo em Las Vegas custou mais de R$ 11 bilhões e é revestida por 54 mil m² de tela de LED
Las Vegas, nos Estados Unidos, é conhecida há décadas como a capital do entretenimento, com inúmeros shows, luzes e performances de artistas de renome global. Com isso, a cidade foi a escolhida para inaugurar a maior estrutura tecnológica esférica do mundo: a casa de eventos The Sphere.
A megaconstrução traz números impressionantes: são 111 metros de altura, sendo maior que o Cristo Redentor, do Rio de Janeiro, e a Estátua da Liberdade, de Nova York. O lado externo da esfera é revestido com a maior tela de LED do planeta: são 54 mil metros quadrados projetando vídeos em alta resolução.
A estrutura da Sphere, que parece ter vindo dos filmes de ficção científica, foi inaugurada em 29 de setembro deste ano e promete revolucionar a indústria de entretenimento nos EUA. Segundo divulgado, o projeto custou US$ 2,3 bilhões (cerca de R$ 11 bilhões).
Ao Byte, a Sphere Entertainment, empresa responsável pelo projeto, afirmou que a casa tem capacidade para 17.600 pessoas sentadas e 20 mil pessoas em pé. Também pretende receber "uma ampla variedade de eventos, concertos e ser residência dos maiores artistas do mundo, dos principais nomes criativos de Hollywood e eventos importantes”, disse a empresa.
Experiências imersivas
O objetivo do projeto é aguçar os cinco sentidos dos telespectadores ao assistirem a um espetáculo. Para isso, investiu em experiências imersivas “em grande escala”. Em 10 mil assentos foi implementada uma tecnologia háptica que vibra de acordo com o que o passa na tela.
O recurso também cria efeitos de vento, odor e temperatura. Algumas das experiências que podem ser vividas na esfera, segundo a empresa relatou ao Byte, são:
- Som imersivo da tecnologia alemã Holoplot, com 1.600 caixas de som fixas, 300 móveis do sistema Holoplot X1 Matrix Array, além de 167 mil drivers de alto-falante amplificados;
- Experiências auditivas semelhantes às de fones de ouvido sem esses aparelhos, diz a empresa;
- Altíssima resolução de tela LED 16K x 16K, possivelmente a mais alta do mundo;
- Conexão de wi-fi de mais de 25 megabits por segundo de dados para cada convidado.
Inteligência artificial é fundamental no projeto
A inteligência artificial já está massivamente incluída em projetos de tecnologia com foco em eventos. A Olimpíada de Paris 2024, por exemplo, contará com IA na vigilância. O Conselho Constitucional da França autorizou o governo a utilizar o sistema de vídeo-vigilância algorítmica (AVS) para monitorar multidões.
No projeto Sphere não foi diferente. A inteligência artificial foi usada de inúmeras formas: desde a etapa inicial do projeto, que demandava uma precisão extrema nos testes, até os softwares que amparam esse tipo de imagem.
“Nas projeções, muitas das animações que aparecem tanto no lado externo quanto no interno foram criadas com a ajuda de IA. E o local também conta com cinco humanoides que têm IA no seu software e que são usados para recepcionar o público”, disse Arthur Igreja, professor de decisões de negócios na Fundação Getúliio Vargas (FGV) e especialista em inovação.
Ele se refere ao Aura, um “robô humanoide da vida real”, que mostra na Sphere como a cultura, a tecnologia, a ciência e a arte sempre estiveram interligadas ao longo da história humana. Ele divulga a experiência imersiva “Cartão Postal para a Terra”, um filme multissensorial do cineasta Darren Aronofsky, como “um retrato do nosso planeta, reimaginado como uma experiência de ficção científica que aproveita todas as tecnologias experienciais do Sphere”, segundo a dona do local.
Thoran Rodrigues, CEO da datatech BigDataCorp, diz que a IA da esfera de Las Vegas tem servido como um "portal" de exibição para novos tipos de obras de arte, além de produzir gráficos e outros elementos interativos para serem exibidos nos shows.
“A inteligência artificial tem o potencial de reduzir significativamente o custo de produção relacionado com entretenimento de todos os tipos — vídeo, música, livros —, o que permite a entrada de novas empresas entregando produtos com a mesma qualidade e experiência que as mais antigas do mercado”, disse Rodrigues.
Brasil tem maturidade tecnológica para isso?
No Brasil, ainda não há um projeto com tecnologia similar ao The Sphere, pois é algo “absolutamente inédito”, explica Igreja.
“Nós temos projeções de grande tamanho, feitas em prédios, apresentações, especialmente, nos festivais de música eletrônica, efeitos bastante impressionantes, como no Tomorrowland, projeções em grandes espaços como no Ibirapuera. Mas nada chega perto do Sphere”, disse Igreja.
“Várias exposições no Brasil usaram tetos em formato esférico para trazer um pouco desse efeito, mas com aquela magnitude, resolução e tecnologia do Sphere, jamais foi visto em âmbito mundial”, acrescentou.
Richard Albanesi, CEO da empresa de paineis publicitários The LED, diz que o projeto Sphere ainda é único com suas características e dimensões. Mas ele ressalta que deve se tornar uma inspiração para o segmento brasileiro de shows e entretenimento.
“Vale destacar que, aqui no Brasil, guardadas as proporções, temos verificado o sucesso desse tipo de experiência imersiva, como o obtido pela exposição Van Gogh Live 8K, por exemplo, o que revela um mercado consumidor cada vez mais atento e ávido pelas possibilidades oferecidas pela tecnologia”, comenta.
Além disso, o Brasil foi um pioneiro no uso de tecnologia de IA em museus. Temos como exemplo o projeto “A Voz da Arte", realizado em 2017 pela Pinacoteca de São Paulo com a IBM. A exposição usava a inteligência artificial para permitir que os visitantes perguntassem sobre as obras usando a voz e recebessem as respostas por uma inteligência artificial.
“O showbizz brasileiro é bem maduro, não com esse nível de tecnologia, mas é perfeitamente possível se adaptar com velocidade, afinal tem vários brasileiros também que trabalham nessas iniciativas em vários outros países”, disse Igreja.
Sobre a aplicação de inteligência artificial no setor de eventos, Thoran Rodrigues, da BigDataCorp, destaca que a oportunidade existe tanto no Brasil quanto em qualquer outro país. “Diferente do que aconteceu em outros momentos de transformação econômica, o acesso às tecnologias e aos profissionais relacionados com a inteligência artificial é praticamente igual em todos os lugares do mundo”.
Qual a estrutura e grana necessária para uma “Esfera”?
Considerando o ponto de vista de urbanismo e planejamento, uma estrutura grandiosa como a Sphere deve ser muito bem planejada, especialmente em respeito à geografia e urbanismo da região.
O arquiteto Mohammad Najjar, professor da Politécnica da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), diz que para ter uma estrutura igual no Brasil seria necessária uma análise profunda em termos de construção sustentável, conforto de construção e engenharia urbana.
"Na primeira etapa, será importante fazer um estudo de viabilidade para verificar a necessidade de tal equipamento urbano na região ou cidade selecionada. Esta etapa requer avaliar as características do terreno, bem como o entorno imediato na região", disse Najjar.
Em seguida, explica o arquiteto, deverá ser feita uma análise mais aprofundada para avaliar os impactos ambientais, econômicos e sociais de um edifício desse tipo ao longo de todo o seu ciclo de vida.
"O Brasil ocupa um vasto território e, portanto, possui diversas classificações climáticas. A este nível da análise, a utilização das energias renováveis afigura-se uma necessidade urgente de edifícios mais eficientes em termos energéticos e de redução dos custos de operação de tais tipos de projetos", afirma o professor da UFRJ.
Um projeto como o Sphere, avalia o arquiteto, requer a utilização de vários equipamentos e tecnologias modernas. De forma que, mais análises devem ser realizadas para avaliar os três pilares do conforto ambiental: conforto térmico, conforto acústico e conforto visual.
"Sugere-se a utilização de recursos computacionais como o BIM (Building Information Modeling) para facilitar a realização das análises na fase de design e planejamento, antes de iniciar a construção, fazendo alguns experimentes de materiais de construção e equipamentos tecnológicos para construir um Sphere mais confortável e sustentável", diz Najjar.
Na Inglaterra, o projeto já vem sido visto com certa polêmica. A empresa London Legacy Development Corporation (LLDC) aprovou planos para a uma exposição publicitária com mais de um milhão de díodos emissores de luz que exibirá vídeos e anúncios, em um projeto similar ao de Las Vegas, mas na cidade britânica de Stratford.
A informação é do jornal The Guardian, que levantou o tema em uma reportagem sobre a preocupação dos moradores com a poluição luminosa desse tipo de estrutura. “É quase como construir um sol na Terra”, disse um morador de Las Vegas ao Guardian. É possível, portanto, que essas queixas se repitam em outras cidades e nações se o projeto der frutos.
Já sobre a viabilidade econômica de outros países para suas próprias Spheres, incluindo o Brasil, o empresário Richard Albanesi diz que é preciso pensar o quanto o projeto deve gerar em termos financeiros para a região, além da maior visibilidade turística gerada pelo empreendimento. No caso de Las Vegas, já conhecida por casas de shows grandiosas, a conta deve compensar.
Mas ele ressalta que para um projeto dessa magnitude, o ideal é achar um ponto de equilíbrio financeiro que possa atender todas as expectativas envolvidas. “Primeiro, encontrar o lugar certo e promover uma entrega de resultados e retorno para a cidade no qual será instalado, integrando-se como um ponto de referência”, disse.