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Com guerra de narrativas, Telegram assume papel do WhatsApp nas eleições

Grupos via WhatsApp e Telegram movimentam campanhas de Lula e Jair Bolsonaro; boatos sobre maçonaria e satanismo iniciaram segundo turno

6 out 2022 - 05h00
(atualizado em 7/10/2022 às 14h06)
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Grupos do Telegram associados a Bolsonaro são maiores e com mais engajamento
Grupos do Telegram associados a Bolsonaro são maiores e com mais engajamento
Foto: Reprodução

A campanha presidencial online entre Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e Jair Bolsonaro (PL) está a todo gás nos primeiros dias do segundo turno das eleições. Por conta de boatos e desinformação sobre as preferências religiosas dos candidatos, só nesta terça-feira (4) a palavra “maçonaria” teve um crescimento de mais de 90%, enquanto que o termo “satanismo” também cresceu cerca de 70% nas buscas do Google

As polêmicas invadiram até mesmo os grupos de Telegram dos candidatos, principalmente os bolsonaristas, que desde 2018 possuem uma atuação forte e um número alto de membros.

Os termos não são arbitrários: em resposta a ataques que vinham acontecendo a Lula e acusações de que o candidato teria ligações com satanismo – com imagens do candidato em espaços de religiões de matriz africana – montagens e vídeos de Jair Bolsonaro discursando em um templo de maçonaria também agitaram as redes.

Um vídeo com declarações do pastor evangélico André Valadão, explicando que a maçonaria não seria uma prática aceitável entre cristãos, também circulou e gerou polêmica.

Telegram tem tanto peso assim na campanha eleitoral?

Leonardo Nascimento, pós-doutor na pós-graduação em ciências sociais da UFBA (Universidade Federal da Bahia), diz que não é possível afirmar ainda se os grupos bolsonaristas no Telegram influenciaram ou não os resultados de última hora. Mas certamente boatos que circularam no dia das eleições tiveram bastante impacto, como a fake news de que o candidato Lula teria relações com Marcola, líder da facção criminosa PCC (Primeiro Comando da Capital).

Ainda assim, ele acredita que isso não teria sido suficiente para uma modificação tão grande em relação ao que indicavam os institutos de pesquisa e o que foi verificado de fato. 

Os grupos do candidato Lula expandiram seus horários de postagens desde maio deste ano, mas parecem ser um fenômeno ainda novo e mais ligado ao contexto da campanha presidencial. Já os grupos ligados ao presidente Jair Bolsonaro são um fenômeno registrado desde 2018. No Telegram, contam com cerca de 20 a 60 mil inscritos, de acordo com a mestranda em Ciência Política Thatiane Moreira, que acompanha essa movimentação online em sua recente pesquisa. 

Acusações associadas à religião foram usadas por grupos bolsonaristas próximo do primeiro turno das eleições
Acusações associadas à religião foram usadas por grupos bolsonaristas próximo do primeiro turno das eleições
Foto: Aaron Burden / Unsplash

Religião foi estratégia mais usada de última hora

De acordo com Moreira, a pauta da religião – junto a outras pautas morais – tomou bastante espaço a partir do dia da Independência, em 7 de setembro, quando Bolsonaro realizou grandes eventos oficiais que foram acusados pela oposição de propaganda eleitoral indevida.

Alguns pontos reforçados na campanha online bolsonarista, principalmente nas duas últimas semanas antes do dia do pirmeiro turno das eleições, foram a ideia de que a esquerda é anticristã, com compartilhamento de fotos de Lula em centros de religiões de matriz africana, reforçando a tese de que era impossível ser cristão e votar na esquerda.

Além disso, a chamada pelo voto útil no Lula aumentou o medo de que o candidato do PT pudesse vencer a disputa, o que mobilizou muitas mensagens. Segundo Moreira, uma forte campanha de última hora com mensagens como “conquiste um indeciso”, mostrando como convencer quem ainda não se decidiu, foi registrada nos grupos pró-Bolsonaro.

O sentimento de muitos bolsonaristas de que iriam vencer as eleições fez com que muitos também se decepcionassem com os resultados do primeiro turno e compartilhassem mensagens como “não podemos desistir, perdemos uma batalha, mas não a guerra”. 

Segundo o mestre em produção jornalística e mercado pela ESPM (Escola Superior de Propaganda e Marketing) Raul Galhardi, que analisa grupos alinhados tanto a Bolsonaro quanto a Lula, a movimentação de grupos lulistas e bolsonaristas é desproporcional. 

“Faço parte de dois grupos petistas apenas, contra vários bolsonaristas. Mas além de ter pouca gente, são grupos de WhatsApp, então a movimentação e as postagens são muito inferiores em quantidade, engajamento e interação do que os grupos bolsonaristas. No microcosmo que eu estou analisando, a esquerda deixa a desejar e muito no que diz respeito a estratégias de mobilização via aplicativos de mensagem”, diz ele.

Enquanto o WhatsApp tem atualmente um limite de até 256 pessoas por grupo, no Telegram são permitidos até 200 mil membros, além dos canais, com número ilimitado de inscritos.

São diversos os grupos bolsonaristas que Galhardi faz parte no Telegram: o canal oficial do presidente “Jair M.Bolsonaro 1”, com 1 milhão e 620 mil inscritos; “Patriotas Conservadores SP”, com 10.162 pessoas; “Super GrupoB-38 Oficial”, com 59.306 pessoas; “Os Patriotas BR Canal Oficial”, com 3.406 pessoas; “Bolsonaro 22”, 51.885 pessoas; e o “Canal do Carlos Bolsonaro”, com 106.548 pessoas. Já no Whatsapp, ele está no “Liga Conservadora do Brasil SP 2”, com 80 membros; “Muda Brasil”, 99 membros; “APB 1 - Aliança pelo Brasil”, 182 membros; e “Presidente Bolsonaro B22”, com 48 membros. 

Limitação de mensagens no WhatsApp em 256 membros fez com que grupos ligados a Bolsonaro migrassem para o Telegram
Limitação de mensagens no WhatsApp em 256 membros fez com que grupos ligados a Bolsonaro migrassem para o Telegram
Foto: Rubaitul Azad / Unsplash

Telegram é o Whatsapp de 2018?

De acordo com reportagem do Núcleo Jornalismo, a limitação de membros nos grupos do WhatsApp fez com que, ainda em 2021, os grupos ligados a Bolsonaro migrassem quase que totalmente para o Telegram. E Galhardi diz que, atualmente, os grupos de WhatsApp, mesmo os bolsonaristas, são bem menos movimentados que os da plataforma rival. 

Além dos grupos, os canais no Telegram permitem que o administrador manda mensagens para um número muito grande de pessoas. A afirmação está alinhada à pesquisa recente do InternetLab, que mostrou um uso maior do WhatsApp para fins pessoais, enquanto que o Telegram é mais usado para acesso a conteúdos. 

Mas há uma diferença entre como o app da Meta atuou em 2018 e a situação atual do Telegram. "Como no WhatsApp, apesar de ter menos gente, você tem uma relação com aquelas pessoas, talvez confie nelas, então provavelmente você vai acreditar muito mais nos conteúdos que chegam do que no Telegram", explica Nascimento.

Na véspera das eleições, Galhardi conta que os conteúdos no Telegram também falavam muito sobre alianças do Lula com outros líderes polêmicos, como Daniel Ortega (Nicarágua), Hugo Chávez (Venezuela, morto em 2013) e Fidel Castro (Cuba, morto em 2016). Também compartilharam muito o que Geraldo Alckmin (PSB), atual vice-presidente na chapa lulista, falava sobre o petista no passado.

Depois dos resultados, no início pairavam entre bolsonaristas os questionamentos das urnas eletrônicas,e uma comparação do número de candidatos de direita eleitos com os votos para a presidência. Depois que Bolsonaro declarou que os resultados tinham sido positivos, o foco mudou. 

Na terça-feira (4), após a circulação de uma montagem do presidente junto a um quadro do Baphomet, símbolo associado ao satanismo, os grupos assumiram uma atitude de defesa e mostraram que ao menos esta imagem específica não era real. Ainda assim, os vídeos de Bolsonaro em um templo maçom são considerados verídicos. 

Já nesta quarta-feira (5), segundo Moreira, o que repercutiu negativamente nos grupos do Telegram foi a recirculação da informação que Jair Bolsonaro teria pensado em abortar seu filho "04", Renan Bolsonaro.

Fonte: Redação Byte
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