Eleições 2024: TSE proíbe deepfakes, mas como garantir cumprimento da medida?
Especialistas afirmam que a verificação de forma precisa e ágil pode ser um desafio do Tribunal; Big Techs também têm papel importante
O Tribunal Superior Eleitoral proibiu o uso de deepfakes nas campanhas eleitorais em 2024. No entanto, especialistas apontam dificuldades em garantir a verificação e remoção dos conteúdos, já que é preciso colaboração com as plataformas e redes sociais.
O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) aprovou, nesta terça-feira (27), todas as 12 resoluções que regerão as eleições municipais de 2024. Dentre as medidas, ficou determinado pelos ministros que o uso de deepfake e robô nas campanhas eleitorais serão proibidos.
Entretanto, especialistas ouvidos pelo Byte argumentam que o órgão ainda enfrentará desafios no controle de conteúdos falsos.
As novas normas se aplicam aos candidatos, partidos políticos e eleitores no pleito deste ano, que tem o 1º turno previsto para o dia 6 de outubro e definirá novos prefeitos, vice-prefeitos e vereadores em todo o país para os próximos quatro anos.
O que ficou determinado a partir de agora?
Por unanimidade, os ministros do TSE aprovaram a resolução que regulamenta o uso da inteligência artificial durante as eleições. A norma proíbe manipulações de conteúdo falso para criar ou substituir imagem ou voz de candidato com objetivo de prejudicar ou favorecer candidaturas.
A restrição do uso de chatbots e avatares para intermediar a comunicação das campanhas com pessoas reais também foi aprovada.
Com essa medida, o órgão visa evitar a circulação de montagens de imagens e vozes produzidas por aplicativos de inteligência artificial para manipular declarações falsas de candidatos e autoridades vinculadas às eleições.
Juliano Maranhão, professor da Universidade de São Paulo (USP) e diretor do Instituto Lawgorithm, associação que estuda IA aliada ao direito, afirmou ao Byte que a adoção de instrumentos jurídicos por autoridades como TSE é importante para a prevenção e o combate à desinformação.
Porém, é necessário que o Tribunal estabeleça regras claras para determinar as obrigações e responsabilidades de cada agente envolvido no debate público eleitoral.
"As ferramentas de inteligência artificial representam um desafio por sua facilidade de uso, potencial de escalabilidade e alta capilaridade, mas não devem ser vistas como “vilãs” das eleições. Por isso, são necessárias respostas cada vez mais rápidas e eficazes, conclusão inclusive já alcançada pelos setores público e privado", disse o professor.
A responsabilidade das redes sociais
Ainda para combater a desinformação durante a campanha, o TSE determinou que as redes sociais deverão tomar medidas para impedir ou diminuir a circulação de fatos inverídicos, ou descontextualizados.
As plataformas que não retirarem conteúdos antidemocráticos e com discurso de ódio, como falas racistas, homofóbicas ou nazistas, serão responsabilizadas.
Entretanto, especialistas apontam que essa verificação de forma precisa e ágil pode ser um desafio, especialmente em um período de campanha eleitoral.
A advogada especialista em Direito Digital e CTO da consultoria de proteção de dados DataLegal, Camila Studart, comentou ao Byte que, por esse motivo, criou-se a exigência de rótulos de identificação em conteúdos sintéticos multimídia e a restrição ao uso de chatbots e avatares para simular interações humanas.
"Existem desafios persistentes que não se resolverão da noite para o dia, como a detecção e remoção de conteúdo, já que, apesar dos avanços tecnológicos, as plataformas ainda enfrentam dificuldades em detectar e remover rapidamente todas as formas de desinformação, especialmente aquelas sofisticadamente disfarçadas ou incorporadas em memes e vídeos, como é o caso das deep fakes", comentou a advogada.
Para a especialista, a efetividade dessas medidas dependerá da capacidade e disposição das plataformas de mídia social em implementá-las rigorosamente e da agilidade do TSE em fiscalizar e aplicar as penalidades previstas.
"Como as novas regras pesam legalmente sobre as plataformas, que poderão responder nas esferas civil e administrativa, a efetividade das medidas tende ser maior", comenta Camila.
O Byte procurou o Google e a Meta para comentar como se adequarão às novas medidas aprovadas pelos ministros.
A Meta disse que ainda aguarda a íntegra das resoluções do TSE. O Google ainda não retornou o pedido.
Desafio de fiscalização no WhatsApp e Telegram
Em eleições passadas, o Brasil enfrentou desafios significativos com a disseminação de fake news, que incluíram desde a difusão de informações falsas sobre os candidatos até a manipulação de conteúdos para descreditar o processo eleitoral.
Esse conteúdo surgiu não apenas em redes sociais como Instagram, Facebook e Twitter, mas, principalmente, nas ferramentas de trocas de mensagens como o WhatsApp e o Telegram.
A cientista política e professora da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) Nara Pavão comentou ao Byte que avalia como muito positivo o engajamento do TSE em relação a desinformação, especificamente em relação ao uso de inteligência artificial.
Entretanto, a especialista acredita que as peças publicitárias que precisarão identificar quando estão usando inteligência artificial, não as campanhas informais, o que torna a fiscalização mais desafiadora.
"Ajuda a regular a campanha é oficial, porque são essas as campanhas que vão prestar conta ao TSE. Agora, o problema está nas campanhas informais, no corpo a corpo, nos conteúdos que circulam em ambientes que não têm transparência e regulação, que é, por exemplo, o Telegram e o WhatsApp", avaliou a cientista política.
Como denunciar?
A internet é uma arma de campanha eleitoral muito poderosa, que revolucionou a maneira como as campanhas são feitas no Brasil e no mundo, comenta a cientista política Nara Pavão.
Para a especialista, a principal vantagem da utilização da internet em campanhas eleitorais é fazer a campanha chegar onde ela deve chegar, ou seja, acertar o público certo. "A internet ajuda as campanhas a serem mais setorizadas; a conseguirem identificar públicos alvos que sejam mais propensos a serem afetados pelas campanhas", disse Nara.
Mas, infelizmente, a segmentação de conteúdo muitas vezes é usada de forma incorreta, espalhando, assim, as fake news sobre políticos ou partidos.
O professor da USP Juliano Maranhão explica que as autoridades e as plataformas digitais oferecem canais específicos para a realização de denúncias por quaisquer cidadãos.
"No que diz respeito especificamente aos ilícitos eleitorais, caso o cidadão considere que um conteúdo desvirtue o processo eleitoral, poderá apresentar denúncia ao Ministério Público Eleitoral que podem ser feitas por formulários disponibilizados na página da internet do órgão. Por sua vez, os candidatos e seus partidos poderão recorrer a remédios judiciais específicos perante a Justiça Eleitoral", afirma Maranhão.
"Como medida preventiva, também, há empresas de tecnologia que tem adotado notificações quanto ao fato de que determinado conteúdo foi gerado por meio de inteligência artificial", completou.
No caso do WhatsApp, a plataforma disponibiliza ferramentas para coibir o compartilhamento de conteúdo falso.
Por utilizar criptografia de ponta a ponta como padrão, o WhatsApp não tem acesso ao conteúdo das mensagens trocadas entre usuários e não realiza moderação de conteúdo. Porém, o aplicativo "encoraja que as pessoas reportem condutas inapropriadas diretamente nas conversas, por meio da opção denunciar”.
Também é possível enviar um e-mail para o suporte da plataforma, denunciando a mensagem inadequada:
- Pressione e segure a mensagem até aparecer o menu;
- Clique em ‘denunciar’;
- Selecione se apenas deseja denunciar ou se quer também bloquear o usuário;
- O usuário também pode enviar denúncias específicas para o e-mail support@whatsapp.com, detalhando o ocorrido com o máximo de informações possível e até anexando uma captura de tela.