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Evitar atentados a escolas vai além de monitorar web, dizem especialistas

Autor de atentado em escola de SP teve comportamento comum de fóruns de incels mas é preciso mais assistência social para evitar novos casos

29 mar 2023 - 05h00
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Adolescente fez postagens horas antes do atentado
Adolescente fez postagens horas antes do atentado
Foto: Reprodução/Google Maps

Antes do jovem de 13 anos atacar a Escola Estadual Thomazia Montoro, em São Paulo, na segunda-feira (27), ele havia postado no Twitter a seguinte frase: "esperei por esse momento minha vida inteira, tomara que consiga alguma kill [morte] pelo menos".

A postagem tem um teor ao que é observado em fóruns extremistas de incels, movimento cujas repercussões no ambiente offline parecem ameaçar cada vez mais a sociedade brasileira.

Perfis nas redes sociais e plataformas usadas pelo adolescente exaltavam estética de autores de massacres ao redor do mundo, compartilham vídeos do ocorrido e postam todo tipo de conteúdo violento.

Mesmo assim, especialistas ressaltam que a identificação prévia a incidentes como esse não é nada fácil, por envolver muitos fatores fora da bolha online.

  • Requer, por exemplo, um delicado trabalho de inteligência de órgãos públicos;
  • Apenas monitorar os fóruns não basta, sendo preciso preciso um programa de mais assistência social mais amplo para combater o problema a longo prazo;
  • Nessa questão, o governo federal ainda engatinha, com políticas públicas atrasadas em entender a complexidade e tamanho do problema.

A equipe de transição de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) chegou a trabalhar com um relatório sobre atentados a escolas, mas ainda não tomou decisões concretas sobre o assunto.

"Agulha no palheiro"

O garoto de 13 anos já havia sido denunciado por professoras de outras instituições devido a seu comportamento. Segundo as docentes, que fizeram um boletim de ocorrência, ele demonstrava interesse anormal por armas de fogo. 

O pensamento geral é que uma tragédia poderia ter sido evitada devido ao seu comportamento prévio. Mas, na verdade, não é bem assim que funciona. A grande maioria das pessoas que participam de comunidades extremistas pode até expressar alguns pensamentos nessa linha, mas são poucos os que partem para a consumação de atos violentos. 

"A maioria dessas pessoas não comete, mas incita o outro a cometer. A partir daí, um episódio de descontrole emocional pode fazer com que a pessoa execute", explica Maycon Torres, doutor em psicologia e professor da Universidade Federal Fluminense (UFF). 

Paulo Rená, codiretor executivo do AqualtuneLab, coletivo jurídico voltado a direitos humanos na web, afirma que monitorar a internet para prever situações como essa, do ponto de vista tecnológico, é "procurar agulha no palheiro".

"A internet se mostra um ponto, mas nunca é apenas ela. Então, apesar de os grupos serem espaços execráveis, de muita toxicidade, com violência verbal e gráfica, estabelecer qualquer correlação depende de trabalho de inteligência dedicado, custoso e especializado. Nossa segurança pública não parecem ter condições materiais e humanas de realizar todo esse trabalho", diz.

Um relatório usado pela equipe de transição do governo Lula, chefiado pelo pesquisador da USP Daniel Cara, afirma que existe um processo de cooptação pela extrema-direita por meio de interações virtuais:

  • O adolescente é normalmente exposto com frequência a conteúdo extremista em aplicativos de mensagens como WhatsApp e Telegram, jogos, fóruns de discussão e redes sociais;
  • O mesmo documento pontua que a ideia de supremacia branca e masculina é um elemento constitutivo desses grupos;
  • Eles têm como alvo recrutar adolescentes brancos, heterossexuais, com problemas de autoestima e traços antissociais. 

Portanto, é consenso entre os especialistas que o Estado não está bem aparelhado para prevenir que esse tipo de situação aconteça, mesmo conhecendo os meios e os discursos onde os incels se comunicam. 

"[Não há] uma política de educação para o respeito à diferença, um sistema de assistência social para acolher esse adolescente que expressava insatisfação e ódio ou um sistema de saúde disponível para lidar com questões mentais e emocionais sem preconceito", pontua Rená.

Postagens prévias

O adolescente entrou na escola da Vila Sônia por volta das 7h da segunda-feira (27), portando uma tesoura e uma faca. Ele matou a professora Elizabeth Terneiro, 71 anos, e machucou outras cinco pessoas até ser contido. 

Na bolha do jovem, outros perfis interagiram com curtidas e respostas. As postagens incluíam vídeos exaltando autores de outros atentados no passado, como o da Escola Estadual Professor Raul Brasil, em Suzano, em 2019. O endeusamento a massacres em escolas é comum em fóruns de incels.

"Em todo massacre, sempre aparecem os que incentivam e os que comemoram. Para os que incentivam massacres, a realização de um é quase uma vitória pessoal. Para os que comemoram, é a promessa de que outros virão", disse a Byte Lola Aronovich, ativista e professora da Universidade Federal do Ceará (UFC), atacada por fóruns do tipo desde 2008.

A hashtag #tcctwt, atribuída à comunidade do Twitter que gosta de histórias de crimes reais, está em diversas publicações. Em um dos tuítes, um usuário comenta que o garoto é uma "cria" deles, em um sentido de pertencimento.

Fonte: Redação Byte
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