Fim dos cookies: como as marcas vão superar esse desafio para a publicidade digital?
Google anunciou este ano que vai bloquear o uso de cookies de rastreamento de terceiros em seu navegador Chrome
Abrir um navegador na internet e se deparar com diversos cookies saltando na tela é uma experiência que está com os dias contados. O que pode ser um alívio para alguns usuários, representa um grande desafio para a publicidade. Como se reinventar para anunciar na internet?
O Google anunciou este ano que vai bloquear o uso de cookies de rastreamento de terceiros em seu navegador Chrome. Conforme a empresa, anunciantes não vão poder conectar seus ficheirosa sites nos quais não têm domínio. Com isso, as empresas ficarão bloqueadas de rastrear usuários enquanto navegam na internet.
A partir de então, ocorre uma transição com a remoção do atual modelo de cookies de terceiros, que vigora há quase 30 anos, para tecnologia Privacy Sandbox – novo sistema do Google.
O objetivo é desligar gradualmente os cookies de terceiros para todas as pessoas a partir do segundo semestre de 2024.
Em entrevista ao Byte, o Google afirmou que o objetivo do Privacy Sandbox é o desenvolvimento de novas tecnologias, priorizando a privacidade, mas mantendo a monetização e uma web livre e saudável para os usuários e os negócios.
Carolina Medina, head de Privacidade e Parcerias de Chrome para a América Latina, explica que, atualmente, a indústria reconhece que a tecnologia de cookies de terceiros não é a ideal sobre a perspectiva de privacidade dos usuários.
"Além de entregar casos muito legais, como a personalização do carrinho de compra preservada, essa tecnologia também permite a identificação do usuário: a indústria combina pequenos pedaços de dados para conseguir chegar à informação de ID único. E essa pressão de privacidade, que surge do usuário e da indústria, acabou impulsionando a mudança dessa tecnologia", disse Carolina.
Outros navegadores como o Safari, da Apple, e o Firefox, da Mozilla, já bloquearam cookies de terceiros, mas o Chrome tem alcance maior, o que pode resultar em impacto mais relevante para a publicidade online.
Segundo um levantamento realizado em 2023 pela Wibson, startup argentina com soluções para privacidade digital, 94% dos brasileiros aceitam os cookies de maneira automática nos sites que visitam. Além disso, apenas 1% analisa e personaliza a autorização para uso de dados.
O que são cookies?
Antes de abordar os impactos para o mercado e para o público, vale entender melhor o que são os cookies de navegação. Se tratam de pequenos arquivos de texto salvos na memória do seu celular, computador e em outros dispositivos ao acessar páginas e site.
Esses pequenos pedaços de texto são enviados ao seu navegador por um site que você visita. Eles ajudam o site a lembrar informações sobre sua visita, o que pode facilitar o retorno do usuário ao site.
O nome da tecnologia é inspirado no próprio biscoito (cookie, em inglês), pois eles guardam pedaços de dados assim como os biscoitos contêm pequenas gotas de chocolate ao seu redor. Criativo, né? O criador dessa ideia é o programador Lou Montulli, que fez a primeira aplicação dos cookies no antigo navegador Netscape.
Qual o impacto do fim dos cookies para a publicidade?
A mudança pode aumentar a privacidade dos usuários, mas, pode ser um novo desafio para a publicidade digital de empresas.
O fim dos cookies trará benefícios para a privacidade e segurança online, afirma André Assis, CEO da XLab, empresa desenvolvedora de tecnologias. Entretanto, o especialista acredita que a medida também pode resultar em anúncios menos relevantes e traz dificuldades para pequenas empresas que dependem desses ficheiros.
"Podemos prever um impacto significativo no mercado digital. As empresas enfrentarão desafios na segmentação de anúncios, eficiência das campanhas de marketing, custo de aquisição de clientes e concorrência com grandes empresas que possuem seus próprios dados", afirma. Assis.
No entanto, André Assis afirma que o fim dos cookies de terceiros representa uma oportunidade para a evolução do mercado digital para um modelo mais sustentável e centrado no usuário.
Agora, segundo o especialista, as marcas precisarão se adaptar a um novo cenário focado na privacidade e na experiência do cliente. Para isso, o CEO da XLab elencou algumas estratégias:
- Priorizar o marketing de primeira parte, coletando dados diretamente dos clientes e construindo relacionamentos de confiança;
- Explorar soluções alternativas de segmentação, como direcionar anúncios com base no conteúdo que o usuário está vendo e identificar padrões de comportamento por meio de inteligência artificial;
- Investir em conteúdo de qualidade, criando material relevante e otimizado para SEO em diferentes formatos;
- Ser transparente sobre a coleta e uso de dados, informando os clientes, obtendo seu consentimento e fornecendo opções de controle.
"Recursos de inteligência artificial"
Rodrigo Carvalho, head de Produtos para Mensuração do Google Brasil, disse ao Byte que um dos principais impactos para as marcas é que elas precisam cada vez mais estabelecer relações diretas com seus consumidores, uma vez que a mudança torna essencial adotar uma estratégia baseada em dados primários compartilhados conscientemente e com consentimento.
"É importante que as marcas revisem seus processos de tomada de decisão e otimização dentro do marketing para funcionalidades que utilizem mais dados primários e recursos de inteligência artificial, o que maximizará seus benefícios", afirmou.
Carvalho lembrou que, no primeiro trimestre de 2023, o Google realizou uma experiência para entender o desempenho das campanhas de publicidade que utilizaram públicos baseados em interesses sem cookies de terceiros.
"Nela, descobrimos que as campanhas baseadas no interesse do público, com sinais que preservam a privacidade das pessoas, são promissoras quando comparadas às campanhas que utilizam cookies de terceiros", afirmou.
"Ao mesmo tempo, temos trabalhado com os anunciantes para mostrar a importância de dados primários e soluções baseadas em inteligência artificial, que serão fundamentais para oferecer uma experiência personalizada, não intrusiva e segura", completou o head de Produtos para Mensuração do Google Brasil.
O que muda para os usuários?
Em entrevista ao Byte, o professor do IAB Brasil (Interactive Advertising Bureau) José Calazans explica que o impacto principal desta medida das big techs é positivo tanto para o mercado quanto para os próprios consumidores.
"Alguns navegadores já vinham há mais de cinco anos restringindo a ativação desses cookies, para acompanhar as novas exigências de controle dos dados pessoais e a crescente demanda dos consumidores por privacidade", disse Calazans.
Para o professor, as marcas agora devem adotar uma postura de respeito à privacidade como premissa.
"A otimização do uso dos dados já disponíveis é um primeiro passo importante, mesmo para aquelas que consideram que estão começando com atraso. Melhorar a comunicação com o consumidor, destacando a transparência, é fundamental", disse o professor do IAB Brasil.
Os "riscos" dos cookies para os usuários
A advogada especialista em Direito Digital e CTO da consultoria de proteção de dados DataLegal, Camila Studart, afirma que os cookies nem sempre são vilões, e que podem ser muito úteis, mas, "a transparência que se busca é fundamental".
A especialista explica que, embora geralmente não coletem diretamente informações que identificam uma pessoa, como nome ou endereço de e-mail, eles são usados em conjunto com outras técnicas para deduzir identidades ou vincular a dados que identificam pessoalmente o usuário em outro lugar.
Também podem coletar histórico de navegação, incluindo quanto tempo o usuário passou em cada página, e em que ordem as páginas foram visitadas, além de dados de localização geográfica, atividades de cliques e interação.
"A coleta de dados dos usuários deve ser feita de forma ética e transparente, e é aí que as críticas a estes cookies encontram seu fundamento, passando pela falta de privacidade e suas questões legais, perfilamento do usuário, segurança de dados, manipulação, influência de publicidade direcionada e a manipulação de opiniões e emoções para fins políticos ou comerciais, e rastreamento involuntário, todos nós já nos sentimos perseguidos assim", disse a advogada.