Debate 'Cérebro na Narrativa' mostra caminhos ilimitados
O principal espaço da Cidade das Artes, uma sala de concerto com capacidade para 1200 pessoas, foi pequeno para o debate que reuniu três nomes importantes de produção audiovisual, na tarde desta sexta, no antepenúltimo dia da Rio2C (Rio Creative Conference). Glória Perez, o diretor Fernando Coimbra e o roteirista Braulio Montavani falaram sobre experiências de personagens com sérios distúrbios e com os quais trabalharam. O tema em pauta era 'O Cérebro no Centro da Narrativa'.
Glória falou do desafio de criar o personagem Edu (Bruno Gagliasso), da série 'Dupla Identidade', exibida pela TV Globo em 2014. Um psicopata que se apresenta como amoroso, acolhedor, educado, romântico, bom filho, etc, e que se mostra um assassino em série. "Ali funciona um cérebro compartimentado; ele vive cada característica com a maior tranquilidade."
Para a autora, escritora e produtora, abordar "cérebro, no centro da narrativa" é algo sem limites. "Cada cérebro tem sua maneira de enxergar o mundo, com o seu grau de sensibilidade ou insensibilidade. No caso de psicopatas, eles vivem em desconexão com o sentimento dos demais seres humanos. E agem como camaleões."
Glória foi mãe da atriz Daniella Perez, assasinada a punhaladas pelo ex-ator e colega de trabalho Guilherme de Pádua e pela ex-esposa dele, Paula Thomaz, numa emboscada no Rio, em 1992.
Em sua participação, Fernando Coimbra citou o filme dirigido por ele, O Lobo Atrás da Porta', para entrar no tema. O longa, de 2013, trata de uma história real - a 'fera da Penha', alcunha criada pela imprensa carioca para identificar a mulher que matou uma criança sem piedade no Rio, a fim de se vingar do amante, pai da vítima.
"Fugi do sensacionalismo, não tratei o caso como loucura, bestialidade ou coisa de monstro. Tentei mergulhar naquele cérebro para ver como aquele comportamento está próximo de nós. E está. A construção de um personagem com distúrbios psíquicos requer a busca da neutralidade. Penso assim. Importante é procurar a conexão com o emocional do telespectador."
Já Bráulio Montavani, roteirista de 'Cidade de Deus' (2002), atesta que "o nosso cérebro é faminto por relações de casualidade e é ele que constrói os sentidos". Para o cinema e demais produções audiovisuais, segundo ele, é preciso subverter o desejo implícito do cérebro de querer explicar o mundo à base de causas e efeitos. "Leio muito sobre neurociência e isso tem sido fundamental para o meu trabalho."