Monitoramento tecnológico pode afetar saúde mental até dos pets
Câmeras com voz ou coleiras de rastreio podem ser aliados dos tutores, mas devem ser usados com cautela
O monitoramento de animais de estimação é uma tendência que vem crescendo nos últimos anos. Com o avanço da tecnologia, tutores estão cada vez mais preocupados com a segurança e bem-estar de seus pets, mesmo quando estão fora de casa.
Segundo uma pesquisa realizada pela empresa de pesquisa de mercado Statista, o mercado de câmeras de segurança para bichos deve atingir US$ 4,3 bilhões até 2025. Já o mercado de coleiras inteligentes para pets deve atingir US$ 3,7 bilhões até 2024.
No entanto, especialistas alertam que a disponibilidade de mais tecnologias que promovem a conexão entre o tutor e o animal podem causar um cuidado excessivo e a "humanização" nociva dos pets. Segundo o veterinário Dennes Marques de Souza, que atende na Clínica Veterinária Ipiranga, em São Paulo, os casos de ansiedade animal têm aumentado muito.
"As pessoas não deixam mais o animal interagir com o meio, não deixa o animal ser animal. Está ocorrendo muito essa 'humanização', com pets com o comportamento dos tutores, com ansiedade e insegurança de socializar", disse ao Byte.
Uma das opções de monitoramento mais populares são as câmeras com voz. Esses dispositivos permitem que os donos observem seus animais de estimação em tempo real, além de poderem falar com eles através do microfone.
Isso pode ser uma forma de amenizar a ausência e os sintomas dos bichos sofrem de ansiedade de separação, ou simplesmente de dar um oi para eles.
Outra opção são as coleiras com comandos remotos. Esses objetos permitem que os tutores dêem comandos aos seus animais de estimação, como sentar, deitar ou voltar. Isso pode ser útil para controlar o comportamento dos animais de estimação, ou até para brincar.
Veja exemplos de aparelhos
A empresa Petlove, em parceria com a Samsung, lançou um dispositivo chamado Galaxy Smart Tag 2, que permite que os tutores acompanhem seus animais de estimação de forma precisa e em tempo real.
O aparelho pode ser acoplado à coleira e tem alerta emitido por um gadget caso o pet se afaste do endereço residencial cadastrado. O dispositivo possui três formas de localização:
- Mapa: o tutor pode visualizar a localização do pet em tempo real no mapa do aplicativo SmartThings ou no navegador da web.
- Modo bússola: o dispositivo guia o tutor até o pet quando ele estiver próximo.
- Modo perdido: quando o animal de estimação se perde, qualquer pessoa que encontrar o dispositivo poderá encontrar o contato do tutor encostando um dispositivo móvel com leitor NFC e navegador da web no Galaxy SmartTag 2.
O Galaxy SmartTag 2 pode ser adaptado a qualquer coleira de animal de estimação, independentemente do porte, idade ou peso.
A empresa Verisure, que trabalha com monitoramento residencial, lançou a câmera Arlo, que é integrada ao sistema de monitoramento com capacidade de fala e escuta, o que permite que o dono possa interagir com o ambiente monitorado pelo nosso alarme.
O aparelho é à prova d’água e tem um armazenamento privado em nuvem; áudio bidirecional; ângulo de visão de 130º e visualização ao vivo.
“Essa câmera possui qualidade em alta resolução e de fácil acesso por um aplicativo, o que facilita a visualização rápida e nítida do que acontece no ambiente”, comenta Henrique Chimara, diretor de tecnologia e projetos da Verisure Brasil.
Preocupações éticas e de privacidade
Adna Moreira, de 26 anos, é petlover e mãe de dois cachorros. Ela contou em entrevista ao Byte que sua rotina de plantões no hospital são intensas e por conta disso passa muito tempo fora de casa.
“Eu encontrei nas câmeras uma solução para passar mais tempo com eles e ficar de olho, até porque um deles era filhote e pelo comando de voz eu conseguia acalmá-lo”, disse.
Ainda que veterinários concordem que a tecnologia pode oferecer benefícios significativos, como a recuperação de animais perdidos, a garantia de segurança e a promoção da saúde, eles alertam para uma dependência emocional que os pets possam ter.
Para Fernando Abi Hanna, médico veterinário em São Paulo, a tecnologia sempre está vindo para ajudar nosso dia a dia, mas é preciso ter cautela.
Isso porque o monitoramento constante também suscita preocupações éticas e bem-estar mental dos pets e de privacidade.
Os tutores devem equilibrar o desejo de manter seus animais de estimação seguros com a necessidade de respeitar sua privacidade, segundo o profissional.
“O que eu tenho percebido é um excesso de cuidados com os pets, tem pessoas que não vivem mais suas vidas a não ser em função aos animais domésticos”, afirmou Abi Hanna.
Em relação aos aparelhos que coletam dados dos tutores, André Romeiro, diretor de marcas e comunicação da Petlove, disse em entrevista ao Byte que as informações de contato são cadastradas pelo tutor através de uma mensagem disponibilizada pelo Modo Perdido do Galaxy SmartTag 2.
Nesse caso, “a privacidade é protegida já que a localização do dispositivo só será disponibilizada com a permissão do usuário”, disse.
O SmartThings Find também criptografa os dados e é compatível com Samsung Knox para uma camada extra de segurança.
Além disso, a desativação do Modo Perdido oculta imediatamente as informações de contato dos proprietários e apaga a mensagem deixada pelo dono do dispositivo, explicou Romeiro.
E a saúde mental do pet?
O monitoramento de animais de estimação apresenta uma série de prós e contras.
Eles vão desde a segurança, com câmeras e coleiras inteligentes podem ajudar a proteger gatos e cães de roubos ou maus-tratos ao controle do comportamento dos bichos, evitando que eles façam bagunça ou se coloquem em risco.
No entanto,também existem alguns pontos de atenção como a dependência emocional gerada pelo monitoramento constante.
Um estudo da Universidade Federal Fluminense (UFF) revelou que 55% dos cães que moram em apartamentos sofrem com a chamada síndrome de ansiedade de separação (SAS).
Esta condição se manifesta quando os animais desenvolvem ansiedade e angústia quando separados de seus tutores, mesmo que por curtos períodos.
A constante presença virtual do tutor através de câmeras e alarmes de dispositivos pode, paradoxalmente, contribuir para essa ansiedade, pois os animais podem se tornar excessivamente dependentes da presença do dono, menos que não-física.
“Eu não vejo problemas no monitoramento, pelo contrário, acho que deixa os cachorros mais calmos quando escutam minha voz e eu fico mais tranquila em saber que eles estão bem”, afirmou Adna Moreira.
O veterinário Abi Hanna explicou, no entanto, que a vigia constante pode gerar uma dependência emocional, caracterizada pelo apego excessivo do pet em relação ao tutor.
“O animal pode mudar de comportamento, ficando depressivo e até mesmo agressivo por conta desse monitoramento constante”, afirma.
Isso pode variar desde a destruição de objetos a micção constante em móveis, cama e outros lugares de casa.
Os especialistas concordam que o ideal é buscar o equilíbrio: manter vigilância nos pets, mas não esquecer de cuidar da pessoa física e das tarefas do dia a dia, para viver em função de monitoramento dos animais.
Em outras palavras, deixar o animal ser animal.
"Creches, passeios frequentes, interação com outros cachorros, respeitando a natureza dele, o extinto dele para diminuir essa ansiedade", conta o veterinário Dennes Marques de Souza.