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Mulheres na tecnologia chegam aos tão sonhados 51%

O mundo precisará de 257 anos para superar essa desigualdade de gênero no trabalho.

14 mar 2022 - 03h00
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Franciely Charleaux
Franciely Charleaux
Foto: Divulgação

Há aproximadamente cinco anos fiz a migração da minha carreira de publicitária para UX (User Experience). Na época, existiam no máximo três cursos sobre este assunto no Brasil. Ninguém entendia direito o que era e o que se fazia. Hoje, após cinco anos, o número de profissionais na área de UX vem crescendo exponencialmente, mas não o suficiente para fazer frente à alta demanda do mercado. E, com isso, nossa responsabilidade social como líderes na comunidade cresce junto. Por isso é preciso refletir sobre quais valores estão sendo criados para este grupo.

De acordo com a última pesquisa realizada pelo Panorama UX, no mês abril/2021, o mercado de UX reflete fielmente a divisão de gênero do Brasil: 51% de mulheres e 49% de homens. Este número deve ser comemorado por todas nós, pois são raras as profissões em que alcançamos este feito ― ainda mais, em áreas historicamente dominadas por homens.

Mas será que isso é o suficiente? Sem dúvidas não.

Como UX sabemos que um dado isolado pode não retratar a realidade, trazendo em algumas ocasiões informações enviesadas. É necessário unir esta informação com outras, para que seja possível ter uma visão clara e realista do verdadeiro cenário no qual estamos inseridos. E é por isso que trago aqui algumas provocações:

Entrada de mulheres no mercado

Hoje a escolaridade das mulheres é superior a dos homens, representamos 60% do total de formados em universidades pelo país. Mas ainda existem alguns gaps a serem resolvidos, como por exemplo: apenas 10,7% das mulheres brasileiras estão matriculadas em cursos de Ciência, Tecnologia, Engenharia e Matemática, contra 28,6% dos homens. 

Apesar de existirem alguns avanços, como na área de UX, ainda há um longo caminho pela frente.

Autoexigência feminina

Em pesquisa realizada pelo Google (“Women in Tech”), destacou-se a falta de inspiração e modelos para as mulheres trabalharem. Outro ponto levantado é a autoexigência das mulheres na hora de se candidatar a uma vaga: elas tentam 20% menos vagas que os homens, pois entendem que precisam cumprir 100% dos requisitos da vaga, enquanto os homens, se candidatam em vagas cumprindo apenas 60% dos requisitos.

Isso está fortemente ligado à nossa cultura: as mulheres foram criadas para cuidar da família e não para se arriscarem. Desde a infância, elas são estimuladas a se comportar como " uma dama": sem posicionamento político e social, priorizando a todos antes de si mesma. Esta criação produz forte influência sobre as mulheres pelo resto de suas vidas, impactando nas suas tomadas de decisões, algumas vezes impedindo de optar por benefício próprio, causando uma frustração crônica.

Mais que um trabalho, uma carreira com propósito

Representatividade e igualdade salarial, estes dois fatores são cruciais para o desenvolvimento das mulheres no mercado de trabalho. As empresas precisam entender que as mulheres, na maioria das vezes, possuem jornada dupla ou tripla.

Não se deve comparar o trabalho de dois líderes que possuem cargos equivalentes sendo um homem solteiro e sem filhos e o outro uma mulher casada com dois filhos pequenos. Na maioria das vezes, o homem pode oferecer mais tempo para se dedicar a iniciativas para a companhia e, em contrapartida, a mulher pode trazer ideias mais diversas e humanas para a empresa. Ambos devem ser valorizados, pois são complementares, formando uma equipe mais diversa.

Com a evolução da tecnologia, práticas e metodologias de trabalho, é preciso avançar na maneira que os profissionais são avaliados. Os profissionais da atualidade devem ser medidos pelo impacto que causam seu ambiente de influência e não por parâmetros clássicos de performance.

Quando vemos mulheres em cargos estratégicos ou de gestão, temos uma demonstração forte de exemplos práticos de onde outras mulheres podem chegar, e isso cria o que se chama em psicologia de Efeito Ancoragem, um viés cognitivo do ser humano de se basear em características recebidas quando está em um processo de tomada de decisão. 

Assim, se uma profissional está em um ambiente de trabalho onde a representatividade é valorizada, ela irá usar isso como parâmetro para seus outros meios sociais, impactando não só a empresa, mas a sociedade em geral.

Hoje vivemos o paradoxo no mercado: enquanto a proporção de mulheres entre os profissionais qualificados continua a aumentar, as disparidades de renda persistem e poucas mulheres estão representadas em cargos gerenciais. Segundo o Fórum Econômico Mundial, no ritmo atual, o mundo precisará de 257 anos para superar essa desigualdade de gênero no trabalho.

Precisamos derrubar esta convicção e diminuir este tempo de 257 anos. É necessário focar em oportunidades para mulheres, treinar os talentos para chegar até os altos cargos e fomentar iniciativas de mentoria entre elas para prepará-las psicologicamente para esta mudança.

Mas como iremos fazer isso? O processo não é simples e nem linear, a comunidade está aprendendo em conjunto e deve trocar estes conhecimentos para acelerar a mudança. Todas nós devemos levantar as mãos para essa discussão. 

Não será fácil, mas deve ser um esforço diário, pois estaremos em lugares que nunca estivemos antes e seremos muitas vezes as primeiras a estarem ali. Mas creio que juntas iremos conseguir, mudando um número de cada vez.

(*) Franciely Charleaux é Líder de Designer de Experiência do Usuário na NTT Data.

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