O Brasil Que deu Certo abusa dos memes para agregar a zoeira do país
Comandado por jornalistas, projeto tem mais de 750 mil seguidores que se divertem com o “pack de brasilidades”
O que o Brasil tem de mais peculiar? Cultura, alegria e o jeitinho brasileiro que “nem a Nasa explica” são alguns dos fatores abordados de forma divertida pelo perfil O Brasil Que Deu Certo.
Comandado por dois jornalistas, o projeto começou com canal no YouTube e migrou para o Facebook e o Instagram, hoje são mais de 750 mil seguidores que se divertem com o “pack de brasilidades”. Os memes divulgados pela página retratam cenas inusitadas do cotidiano brasileiro, sempre priorizando o humor e o respeito.
Em entrevista a Byte, o jornalista Ciro Hamen conta que tudo começou com a ideia de retratar histórias de um Brasil que deu certo. Histórias que só seriam possíveis no Brasil, como por exemplo a de uma pizzaria que ficou famosa pelos sabores de pizza diferentões, como frango assado e arroz e feijão.
“A proposta não era ‘rir da desgraça', era mais uma coisa de mostrar como o Brasil era diferente, divertido e legal, mesmo com todos os problemas somos um país cheio de peculiaridades. A Pizzaria Bate-Papo mesmo acho que é um ótimo exemplo de ‘pô, isso só aconteceria no Brasil!’, comenta Hamen.
Ciro tem como sócio o jornalista Matheus Laneri, ambos se conheceram em um bar, em São Paulo, depois de serem apresentados por amigos por “gostarem das mesmas besteiras”. Hoje, eles administram o canal no YouTube, fazem a curadoria e produção da página O Brasil Que Deu Certo no Facebook e no Instagram.
A página usa o humor para retratar cultura pop, brasilidades e política de forma leve. Conheça mais sobre O Brasil Que Deu Certo na entrevista abaixo:
Como surgiu a inspiração para criar O Brasil Que Deu Certo?
Ciro Hamen: O Brasil Que Deu Certo começou mais ou menos em 2015, quando eu resolvi criar um canal no YouTube. Nessa época, um pouco depois da Copa de 2014, havia uma declaração do Parreira, que então estava trabalhando na seleção brasileira, dizendo que a "CBF era o Brasil que deu certo".
Eu comecei a usar essa frase em diversas situações, muitas vezes de maneira não irônica. Coincidiu que era exatamente no momento em que eu estava começando a montar o canal e ainda não tinha um nome. Até que numa dessas conversas de bar com amigos veio a ideia de chamar de O Brasil Que Deu Certo.
A ideia inicial era entrevistar pessoas que eu considerava "O Brasil Que Deu Certo", fazer conversas divertidas, às vezes no local de trabalho da pessoa ou até em lugares inusitados, tipo na Pizzaria Bate-Papo, no Guarujá, que nessa época ficou bem famosa na internet por conta das pizzas diferenciadas, com frango assado etc.
Em que momento você notou que o projeto tinha dado certo e crescido na internet?
Ciro Hamen: Para divulgar os vídeos, criei uma página no Facebook. Porém, sempre tinha um tempo entre um vídeo e outro, pois como eu não tinha equipamento, nem muitos recursos, demorava. E aí para a página não ficar parada, eu postava imagens que eram "O Brasil Que Deu Certo".
Rapidamente começou a viralizar e não demorou muito para a página ter milhares de seguidores. Durante muito tempo as pessoas conheciam apenas a página do Facebook, mesmo com o canal no YouTube tendo sido criado antes. Neste momento já era bem visível que o projeto tinha crescido, por conta dos números.
Logo eu passei a receber centenas de mensagens diariamente com sugestões de imagens para postar. Pouco tempo depois, o Matheus Laneri, meu sócio, chegou para ajudar, e estamos fazendo tudo junto até hoje: canal, redes sociais e loja.
Os produtos da loja virtual seguem o perfil do que é proposto na página?
Ciro Hamen: Sim, toda a marca "O Brasil Que Deu Certo" está ligada a essa proposta de humor e cultura pop. Temos a meia da grávida de Taubaté, por exemplo, que é um grande sucesso de vendas e é um momento histórico recente da TV brasileira, que já citamos em vários vídeos do canal. Então o público se identifica porque é uma referência que eles têm também.
Muitas das artes das nossas camisetas, meias ou panos de prato são de artistas que a gente curte o trabalho. Hoje tem até camiseta com o meu rosto e com um bordão que ficou famoso no canal, que é o "Matheus, eu tô triste", que era como eu geralmente começava os vídeos depois de assistir alguma coisa muito ruim.
Só de saber que as pessoas têm interesse em ter uma camiseta com esse tipo de besteira, que a gente foi criando no canal, é muito legal e de certa forma recompensador porque o trabalho é sempre feito com muito carinho.
Você acha que o Brasil deu certo? O que você destaca de bom e o que poderia melhorar no país?
Ciro Hamen: Infelizmente o Brasil não deu certo. De 2015, que foi quando eu comecei a ter a ideia do projeto, para cá, o Brasil mudou muito. Passamos por vários governos, golpes, eleições etc. A impressão que eu tenho é que naquela época ainda existia algum tipo de esperança de que o Brasil seria o país ideal.
Muita coisa aconteceu, tomamos muitos choques de realidade, muitas vezes chegamos a ter raiva do Brasil, mas ainda assim o amor pelo país nunca foi embora. Acredito que o Matheus compartilha da mesma opinião que eu neste sentido, mas o Brasil realmente é o melhor que temos.
Mesmo com todos os problemas, aqui ainda é a nossa casa, é onde nos sentimos à vontade, é onde estão praticamente todas as nossas referências, é onde a gente dá risada. É muito chato conversar com um estrangeiro e não poder falar sobre o Gugu, por exemplo.
O que eu destacaria de bom é a cultura muito popular brasileira, que é o nosso forte no canal. Os programas de televisão, a música brasileira, o humor são alguns dos nossos fortes também. Lógico que há muito o que melhorar, ainda mais depois dos catastróficos últimos anos. A desigualdade social aumentou muito, a pobreza, a fome, isso tudo entristece muito, ainda mais sabendo do potencial que esse país tem.
Qual a importância de influenciadores digitais abordarem temas políticos? Vocês receberam críticas ou perderam seguidores por isso?
A gente recebe críticas de um público que não nos interessa. Lógico que se a gente não se posicionasse politicamente, talvez hoje a gente tivesse muito mais seguidores, mas isso seria simplesmente impossível.
A gente faz vídeo de opinião no canal e mesmo comentando sobre televisão, BBB ou assuntos considerados mais "leves" não tem como não ficar explícito o nosso posicionamento político.
Eu não tenho o menor interesse em ter milhões de seguidores. Hoje, trabalhando na internet, você consegue se virar muito bem com um público mais de nicho e eu prefiro muito mais dessa forma. O que a gente tem, nos satisfaz. A paz e a saúde mental em dia não tem dinheiro que pague.
Vocês recebem dos seguidores indicações de memes que tenham "a cara" do Brasil que deu certo?
Sim, desde os primórdios da página, a gente sempre recebe imagens de seguidores com sugestões de post. Nas redes sociais, o trabalho é praticamente de curadoria mesmo. A gente vê se a imagem realmente é engraçada (e não é ofensiva), se ela tem um potencial de engajamento, de ser bastante compartilhada, e basicamente é isso.
Acho que são muitos anos já trabalhando com isso e com internet, que entender qual imagem vai dar certo ou não vira um processo quase natural. Claro que às vezes a gente aposta em algo achando que vai dar certo e não dá, mas acho que é isso é algo normal em qualquer tipo de trabalho.