Por que empresas de tecnologia estão recorrendo à energia nuclear em projetos de IA
Google se juntou nesta segunda-feira (14/10) a uma lista de gigantes da tecnologia que está se voltando à energia nuclear para abastecer a 'faminta' Inteligência Artificial (IA).
O Google anunciou na segunda-feira (14/10) um acordo para usar pequenos reatores nucleares que devem abastecer centros de processamento de dados de inteligência artificial (IA).
De acordo com a empresa de tecnologia, o acordo com a companhia do setor de energia Kairos Power permitirá que o primeiro reator seja usado nessa década e que mais deles sejam implementados até 2035.
As partes não deram detalhes sobre o valor do acordo e a localização das usinas que serão construídas.
Empresas de tecnologia estão se voltando cada vez mais para fontes nucleares para obter a eletricidade necessária para grandes data centers (centros de processamento de dados) que impulsionam a IA e demandam muita energia.
"A rede precisa de novas fontes de eletricidade para dar suporte às tecnologias de IA", disse Michael Terrell, diretor-sênior de energia e clima do Google.
"Este acordo ajuda a acelerar uma nova tecnologia para atender às necessidades de energia de forma limpa e confiável, e a liberar todo o potencial da IA para todos."
A energia nuclear, uma fonte essencialmente livre da emissão de carbono e capaz de fornecer eletricidade 24 horas por dia, tem se tornado cada vez mais atraente para a indústria de tecnologia — que tenta cortar emissões de poluentes ao mesmo tempo em que precisa de mais energia para nova tecnologias.
A IA requer muito mais poder de processamento do que a computação padrão.
"Um data center normal precisa de 32 megawatts de energia. Para um data center de IA, são 80 megawatts", explica Chris Sharp, diretor de tecnologia da Digital Realty, uma empresa dos EUA que constrói esses centros de processamento.
No mês passado, a Microsoft fechou um acordo de 20 anos para reiniciar as operações na usina Three Mile Island, o local do pior acidente nuclear dos Estados Unidos em 1979. A previsão é que a usina seja reaberta em 2028 após reformas.
Segundo a empresa Constellation Energy, responsável pelo local, o reator a ser reativado é "totalmente independente" da unidade que esteve envolvida no acidente de 1979.
A ocorrência não causou ferimentos ou mortes, mas provocou medo e desconfiança generalizados entre os americanos, desencorajando o desenvolvimento da energia nuclear nos EUA por décadas.
O presidente-executivo da Constellation, Joe Dominguez, disse em setembro que o acordo era um "símbolo poderoso do renascimento da energia nuclear como um recurso de energia limpo e confiável".
Dominguez defendeu que as usinas nucleares são as "únicas fontes de energia" que podem fornecer uma "abundância" de energia livre de carbono de forma consistente.
A Microsoft classificou o acordo como um "marco" em seus esforços para "ajudar a descarbonizar a rede".
Em março, a Amazon anunciou que compraria um data center movido a energia nuclear no Estado da Pensilvânia.
Reatores 'embutidos' nos data centers
O acordo do Google com a Kairos Power envolve a construção dos chamados pequenos reatores modulares (SMRs, na sigla em inglês), que podem ser integrados aos próprios data centers, que teriam suas próprias pequenas usinas.
Para Chris Sharp, da Digital Realty, esse é o futuro da energia a abastecer a IA.
Embora ainda não haja SMRs em operação comercial ao redor do mundo, a China está construindo o primeiro do mundo, e tecnologia semelhante já é usada por submarinos movidos a energia nuclear.
Enquanto isso, universidades, como o Imperial College London do Reino Unido, operam há anos pequenos reatores nucleares para fins de ensino e treinamento.
Hoje, a maioria das empresas que desenvolvem SMRs para uso comercial está se concentrando em abastecer cidades.
No entanto, um grupo de empresas especializadas aposta que os data centers são os melhores candidatos para seus projetos de SMR.
"Data centers são coisas famintas por energia, mas com a IA, estamos chegando a um novo nível de demanda", explica Michael Bluck, diretor do Centro de Engenharia Nuclear do Imperial College London.
"Existem cerca de 50 projetos de SMR por aí. O desafio é construí-los com unidades semelhantes, estilo fábrica, padronizando linhas de produção."
Já Doug Parr, cientista chefe do Greenpeace Reino Unido, disse em fevereiro à BBC que o alto custo dos SMRs deverá ser uma barreira muito grande.
"Há um ânimo pouco realista por trás das estimativas de custo dos SMR", afirmou Parr.
"Esse ânimo vai decair à medida que atrasos e dificuldades surgirem", disse, defendendo que fontes de energia renováveis seriam mais vantajosas economicamente.
O Greenpeace também se opõe à energia nuclear por motivos de segurança, apontando o risco de acidentes e a necessidade de lidar com os resíduos radioativos.
*Com informações de João da Silva, Natalie Sherman e Michael Dempsey, da BBC News