Prefeitura de SP quer retomar reconhecimento facial da população
Videomonitoramento vai investir R$ 70 milhões por ano para integrar mais de 20 mil câmeras até 2024; iniciativa esbarra em questões racistas
A licitação para a contratação da nova plataforma de videomonitoramento em São Paulo será retomada, segundo anunciou o prefeito da cidade de São Paulo, Ricardo Nunes (MDB). Mas o relançamento somente será possível quando a prefeitura responder a questionamentos feitos no Tribunal de Contas do Município.
"Se o tribunal de contas liberar, eu solto amanhã", disse o prefeito em entrevista à Folha de S. Paulo publicada na última sexta-feira (13).
Smart Sampa
A iniciativa, conhecida por Smart Sampa, pretende modernizar e ampliar o monitoramento de câmeras na capital. Ele traz o conceito de cidades inteligentes e afirma obter mais eficácia e agilidade no atendimento de ocorrências da Guarda Civil Metropolitana e demais órgãos de segurança.
O pregão era previsto para 5 de dezembro passado, mas foi suspenso pela gestão do município para rever pontos criticados em função de viés racista na tecnologia e em termos utilizados na versão original do texto, como a identificação de "vadiagem" e "cor", este substituído por "estrutura corporal".
A contratação de um sistema de inteligência para reconhecimento facial e a integração de serviços públicos, o que exigiria o compartilhamento de dados de cidadãos, também foram motivos de contestação.
A Smart Sampa tem previsão de integrar mais de 20 mil câmeras até 2024 e prevê investimento de R$ 70 milhões por ano.
As vantagens
Com a tecnologia, a administração municipal espera alcançar um monitoramento mais inteligente e especializado pelo uso de analíse de dados.
Órgãos de segurança promoverão a filtragem instantânea de imagens de ocorrências. Com recursos de identificação facial e detecção de movimento, as câmeras reconhecerão atitudes suspeitas, pessoas procuradas, placas de veículos e objetos perdidos.
Os órgãos de segurança terão como monitorar escolas, UBS e demais equipamentos públicos, o que aumentaria a segurança desses locais.
Outra facilidade que a plataforma deve oferecer é a integração de serviços municipais, como CET, SAMU, Defesa Civil e GCM, com a criação de uma Central de Monitoramento Integrada.
Os entraves
Em reportagem do Estadão em dezembro, especialistas em direito digital e organizações defenderam o banimento da tecnologia, assim como ocorreu em cidades norte-americanas, e avaliam que o edital dava margem para uma judicialização.
Também há aqueles que defendem a aplicação responsável da biometria facial, chamam as críticas de "ludismo", isto é, de resistência à inovação sem justificativas. Essas pessoas acreditaam que deve haver o aprimoramento e não a suspensão do recurso em caso de eventuais problemas.
Já o TCM disse ter seis representações contra o projeto no tribunal, sob a relatoria do conselheiro Roberto Braguim. Entre elas está a anunciada pela deputada federal Erika Hilton (PSOL), então vereadora de São Paulo, sobre o risco de que a tecnologia do Smart Sampa se juntasse a outras violências praticadas contra pessoas negras.
Existe ainda a alegação de que o Smart Sampa não é um bem ou serviço comum, o que impediria a contratação por meio de pregão eletrônico.
As representações também questionam a falta de delimitação do objeto e um direcionamento para encontrar empresas que já prestem serviços baseadas na lei europeia de proteção de dados sem especificar os critérios sobre isso.
A questão da LGPD (Lei Geral de Proteção de Dados) está entre os pontos de análise, já que os cidadãos monitorados não teriam meios de consentir a cada ação.