Reféns do TikTok: cantores relatam pressão de gravadoras para viralizar na plataforma
Artistas contam como as dancinhas virais têm sido indicadores de sucesso para gravadoras e produtores investirem em músicas
É difícil demarcar quando o TikTok passou a ser referência do potencial de sucesso de produtos artísticos, mas, desde quando estourou para o grande público no Brasil, durante a pandemia, é comum que as músicas viralizem na plataforma antes de irem para o topo das paradas musicais. A banda Jovem Dionísio e o single 'Acorda, Pedrinho' são um exemplo disso.
Em entrevista ao Terra, o grupo contou que compôs o single em 2018. Mas foi apenas em maio de 2022 que a música gerou engajamento e uma agenda lotada de shows e publicidade, após viralizar no TikTok.
O alcance da plataforma, no entanto, é uma faca de dois gumes. Se, por um lado, leva a arte para milhões de pessoas, por outro condiciona as carreiras à repercussão na mídia social.
Grandes nomes da música têm reclamado da pressão das gravadoras para produzir dancinhas que viralizem as músicas. Anitta, Adele, Ed Sheeran, Halsey, Izzy La Reina e Manu Gavassi são alguns que já se posicionaram publicamente contra essa onda. O argumento é que o processo criativo não pode ser submetido a esse tipo de interferência.
O sertanejo Zé Felipe, que investe na plataforma e colhe os frutos das dancinhas virais, definiu como "burrice" remar contra essa maré. Entre os sucessos do cantor estão 'Bandido', 'Toma Toma Vapo Vapo' e 'Malvada'.
A também sertaneja Yasmin Santos relatou ao Terra que existe o que chamou de "incentivo" da gravadora, a Sony Music, para fortalecer seu conteúdo no TikTok. Ela, que se considera "sem molejo", tem pouca presença na plataforma, mas reconhece o potencial de interferência nos números.
"A plataforma tem mudado a vida das pessoas", avalia.
Viral e sem legado
Reféns do sucesso, artistas do mundo inteiro, independentemente de intimidade ou não com o TikTok, têm convivido com a influência das empresas nos samples e estratégias, além da cobrança para fazer dancinhas. A própria Anitta revelou em seu perfil no Twitter que precisou insistir muito para que 'Envolver', música recordista de streams, fosse trabalhada como single.
"A gravadora hoje em dia se liga muito no TikTok. Se não tem um sucesso logo de cara, eles dão tchau e fod*-se. É que nem 'Envolver'. Eu só gravei por pura insistência e só foi viralizar depois. É difícil você convencer as pessoas a continuarem o trabalho divulgando, mesmo que não seja sucesso instantâneo", reclamou a cantora, sugerindo que músicas sem potencial viral não têm espaço no mercado fonográfico.
O cantor Matheuzinho, ex-affair de Marília Mendonça e que trabalhou seu último single 'Lapadona' com a GR6 Explode, não esconde a cobrança nos bastidores para ter presença ativa no TikTok. A culpa pela ausência na plataforma, inclusive, é algo que habita a consciência do músico.
"Preciso me dedicar mais, mas, sim, quando gravamos os clipes, a gente já prepara três ou quatro dancinhas para divulgar lá [no TikTok]. Eles são meio rígidos, mas tenho que obedecer, tanto para meu bem, quanto para o bem da música. Às vezes, eu fico muito tempo sem postar e eles chamam atenção: 'Matheuzinho, faz um vídeo assim'", relata.
Dynho Alves, que já trabalhou com KondZilla e GR6 Explode, entre outras produtoras, encara o planejamento estratégico para bombar no TikTok de maneira bem tranquila e profissional. Para ele, independentemente de gostar ou não, o preparo de conteúdos que conversem com a plataforma se tornou uma obrigação do artista atual.
"Não chamo de pressão. Faz parte do trabalho. A produtora só dá o apoio", opina.
A reportagem do Terra procurou a assessoria da Sony Music, a GR6 Explode e Warner Music para ouvir o lado das empresas a respeito do assunto. Todavia, até a publicação da reportagem não houve resposta. O espaço segue aberto para posicionamentos.
*Com edição de Estela Marques.