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Telegram vira local para seguir o BBB e app muda de status

Com número ilimitado de participantes e ferramentas de divulgação, app de mensagens vira ponto de discussão sobre o programa da TV Globo; movimento contribui para popularização do aplicativo, mas origem do conteúdo levanta questões sobre pirataria

14 fev 2021 - 13h01
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Com a presença de influenciadores digitais, a edição de 2020 do Big Brother Brasil (BBB) foi marcante. O enredo fez os números de audiência da TV Globo explodirem, o que deixou expectativas altas para a temporada 2021. No ano passado, o Twitter foi um dos grandes propulsores do programa, permitindo que conteúdos e discussões se espalhassem pela internet. Neste ano, porém, uma nova via ganhou relevância para aqueles que querem acompanhar o reality: o Telegram.

É difícil percorrer as redes sociais em busca de informações — ou fofocas — sobre o BBB e não dar de cara com capturas de tela saídas diretamente do app de mensagens. Lançado em 2013, o app é concorrente do WhatsApp, mas conseguiu expandir suas funções para além de mensagens entre duas pessoas. O serviço se especializou em não ser só uma alternativa para conversar, mas também como um repositório de vídeos e imagens - no caso do BBB, a circulação do material levanta questões sobre pirataria. Procurada pelo Estadão para comentar o assunto, a TV Globo diz em nota é comprometida com as práticas de combate à pirataria e que utiliza "diversas ferramentas tecnológicas e estratégias de proteção ao conteúdo".

Os grupos no Telegram contam com um detalhe importante: eles podem comportar milhares de pessoas, sem limites em relação ao número de membros. Lucas Lucena, 22 anos, e Allanis Araújo, 20 anos, são testemunhas do sucesso dessas ferramentas. Ambos administram o maior grupo na rede social voltado para o BBB, o Canal BBB 21. Ele tem mais de 320 mil inscritos e é dedicado a contar a vida dos brothers dentro da casa, 24 horas por dia, com mensagens em textos, fotos e vídeos.

"Começamos a postar como hobby, mas o grupo foi crescendo. Neste ano, estão falando mais do Telegram. Por conta do sucesso do BBB no ano passado, as pessoas estavam esperando que essa edição fosse igual ou ainda maior. As pessoas que utilizam indicam para os amigos. E as pessoas que estão começando a usar o app se interessam pelas ferramentas", explica Lucena, criador do grupo.

Criado em 2020, o grupo terminou a edição passada com pouco mais de 7 mil inscritos. Com apenas duas semanas da edição de 2021, o Canal BBB21 viu sua média de inscritos aumentar significativamente: só no dia 7 de fevereiro, dia da festa que resultou na saída do participante Lucas Penteado, o grupo registrou um aumento de 48 mil inscritos durante a madrugada.

Segundo Carlos Affonso Souza, diretor do Instituto de Tecnologia e Sociedade (ITS-Rio), há algum tempo o Telegram vinha desempenhando papel de alternativa ao WhatsApp por alguns nichos. A emergência dos grupos voltados para o BBB, porém, parecem ter furado a bolha, aumentando a exposição do app no País.

"Esse é o segundo grande momento de exposição do Telegram no Brasil. Talvez, seja comparável apenas ao vazamento de mensagens da Lava Jato", afirma Souza. Ele faz referência ao fato de que os procuradores da operação se comunicavam pelo app, o que possibilitou as mensagens a serem tornadas públicas.

A estudante Laura Costa, 18, baixou o app apenas para acompanhar as informações publicadas pelos canais especializados. "Eu já tinha escutado sobre o Telegram, mas a primeira coisa que eu fiz quando baixei o app foi entrar no grupo de BBB."

Paredão

Com a sede por conteúdo relacionado a BBB no Telegram, os grupos entraram em uma disputa por inscritos — é quase como estar no 'paredão'. Erica Mathias conta que era parte do grupo Canal BBB 21, mas que divergências fizeram com que ela criasse seu próprio reduto na rede. O Canal Espiadinha nasceu ainda para a edição de 2020 do programa, mas também alcançou o auge neste ano. Com 240 mil inscritos, o grupo recebe por dia em média 15 mil novos participantes.

"Depois de um ano comentando só porque a gente gostava, eu e alguns amigos decidimos montar uma equipe para comentar realities pelo Telegram. Nesse período inteiro, tínhamos no máximo 4 mil inscritos. Temos a visão de que ainda vai crescer mais".

Erica não é inexperiente na internet. A dona do Espiadinha é a autora de uma das histórias mais compartilhadas na web: a ficção (ou 'fanfic') "You are my love, my destruction", que conta a história de amor fictícia entre o apresentador Fausto Silva e a cantora Selena Gomez. O romance tem mais de 250 mil visualizações oficiais e é famoso entre os usuários do Twitter.

Para dar conta de todo conteúdo, os grupos se desdobram em provas de resistência. As equipes costumam se dividir em períodos, para cobrir todas as câmeras transmitidas da casa no canal pago da emissora. A partir dessa "curadoria", o trabalho também envolve transcrever as conversas, gravar ou procurar os vídeos cedidos pela TV Globo e interagir com os participantes, por meio de enquetes e perguntas no chat - os grupos são tão organizados que têm canais dedicados: alguns apenas distribuem conteúdo, enquanto outros permitem comentários.

Todo esse trabalho é o que agrada aqueles que dispensam o programa exibido todas as noites na TV. A designer Julia Gomes, 27, passou a acompanhar o BBB mais pela tela do celular do que a da TV. Ela também ensinou a mãe, Ana Cláudia, 50, a usar os grupos.

"Eu sou usuária do Telegram há muito tempo. Minha mãe usava só profissionalmente, e não sabia desses grupos. É a primeira edição que ela fica realmente empolgada e eu falei para ela acompanhar por lá também. Eu chego em casa e ela já me pergunta 'você viu o que aconteceu lá no grupo?'. Estamos bem envolvidas por curiosidade pelo programa mesmo".

Estalecas

A popularidade desses grupos também têm encontrado um caminho muito explorado por criadores de conteúdo na internet: a monetização. Ao perceber o alcance das mensagens, alguns grupos têm veiculados anúncios pagos, quase como postagens patrocinadas do Instagram. No Canal BBB 21, já são cerca de 20 anunciantes, e uma arrecadação média de R$ 2,5 mil por mês.

Esse é um caminho que pode se consolidar no Telegram. Alexandre Inagaki, consultor em redes sociais, enxerga que a massiva participação nos grupos abre espaço para a visibilidade de anunciantes e de ofertas para os inscritos. A estratégia, já consolidada em outros apps, é uma forma de utilizar a influência para crescer ainda mais.

"Já é possível encontrar muita publicidade direta sendo feita no app e é natural. Já acontecia no Instagram e no Telegram. Com cada vez mais gente utilizando e com a vantagem de não ter limite de pessoas participando de grupo, é inevitável. No final das contas, qualquer conteúdo na internet uma hora ou outra acaba sendo monetizado", afirma.

Prova do Líder

Se os grupos estivessem no queridômetro do BBB, certamente encontrariam muitos emojis de coração no feed. A ascensão dos grupos no Telegram aproveitou da onda de crescimento dos downloads do app, mas não se resume a isso. Souza afirma que as ferramentas oferecidas pelo aplicativo, como o número ilimitado de membros no grupo, a possibilidade de fazer parte desses canais sem convite ou solicitação prévia, e a facilidade na divulgação do conteúdo ajudaram a plataforma a se tornar um grande hub de informações sobre o programa.

"Os grupos permitem uma interação 24 horas por dia sobre os mais diversos temas. As pessoas se sentem muito mais parte do 'jogo'", diz.

O momento para o crescimento também não poderia ser melhor para o Telegram. Com o anúncio da nova política de privacidade do WhatsApp, muitas pessoas escolheram baixar o o app como alternativa de app para conversar. Só no mês de janeiro, ele alcançou a marca de 50 milhões de downloads no mundo, segundo o SensorTower. Por aqui, o barulho da mudança na rede de Mark Zuckerberg e o surgimento de funcionalidades, como a possibilidade de importar conversas do WhatsApp, ajudou a tornar o app ainda mais acessível.

A mesma estratégia não seria possível para grupos no WhatsApp. Por lá, os grupos são limitados a 250 pessoas, e é necessário que um administrador aprove a entrada dos participantes, o que dificultaria a dinâmica dos milhares de seguidores.

Mais do que superar o rival, o Telegram pode ter cimentado de vez o papel dos smartphones para acompanhar eventos e programas de longa duração. "Talvez, o celular não seja mais uma segunda tela. Ele virou a primeira tela. É ali que as pessoas participam do BBB, assistem o programa e interagem com outras pessoas. A ideia de que celular é segunda tela morreu no BBB", afirma Souza.

*É estagiária sob supervisão do editor Bruno Romani

Estadão
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