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"Cronicamente Inviável", o retrato do Brasil na visão de Sérgio Bianchi
Quando Sérgio Bianchi começou a filmar não tinha muita certeza se o filme iria chamar-se Cronicamente Inviável ou Eu não Tenho Culpa. Optou pelo primeiro. Embora não seja o título ideal, reconhece o diretor, tem a vantagem de expor com clareza a forma como ele vê o Brasil. Na entrevista, Bianchi assume que é um filme de montagem. Ele rodou muito, mais do que para qualquer outro filme que tenha feito antes. O desafio foi juntar todo esse material para dele retirar um retrato ácido do Brasil.
Como documentário é falso. Não há uma só cena que não tenha sido encenada. Dessa sucessão de cenas autônomas sai o mais lúcido e cruel retrato que o cinema brasileiro fez do País nos últimos anos. Bianchi investe contra a hipocrisia social e o mito de harmonia racial que somente serve para mascarar a tragédia brasileira. No tempo da ditadura dizia-se que este era um país que ia para a frente. Alimentam-se hoje outras fantasias aquilo que o diretor chama de clichês esquizofrênicos, otimistas e cínicos.
Será o Brasil um país cronicamente inviável? Embora chame assim seu filme, Bianchi não quer acreditar que seja verdade. E, apesar de ter arquivado o título alternativo, Eu não Tenho Culpa, ele quer justamente colocar o dedo na ferida dos que se eximem de responsabilidade em relação às mazelas brasileiras. É uma sociedade ao mesmo tempo injusta e incompetente. Injusta por sua soma vergonhosa de desigualdades, incompetente porque não há interesse em resolver nenhum dos graves problemas que assolam o País se a solução tiver de passar por alguma forma de perda dos privilégios.
Bianchi teceu, por meio da sua fantasia ancorada na dura realidade brasileira, um conto moral. Sua idéia é a de que a classe dominante alimenta o monstro social. Não é um discurso fácil de ser assimilado. Como exercício de razão política, é provocativo, mesmo que Bianchi diga que não fez "Cronicamente Inviável" para provocar. Como cinema, é ótimo. Por melhores que sejam Romance e Causa Secreta, há nesses filmes uma tendência à verborragia. Bianchi não precisa mais ser verborrágico. Ele bota o dedo na ferida e assina um grande filme para expressar sua indignação pelo Brasil. (Agência Estado)
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