O primeiro longa-metragem brasileiro da mostra competitiva, Duas Vezes com Helena, exibido ontem, não empolgou nem decepcionou. A reação do público refletiu isso: o filme foi aplaudido, como é de praxe no Festival, mas os aplausos não duraram muito tempo nem mostraram muita empolgação.O enredo do filme é um triângulo amoroso entre o professor Alberto (Carlos Gregório), sua bela mulher, Helena (Christine Fernandes), e seu aluno preferido, Polydoro (Fábio Assunção). O filme retrata dois encontros entre os dois "amores" do professor. O primeiro, aos 25 anos de Polydoro, quando este é seduzido por Helena em Campos do Jordão e vive um tórrido caso de amor por quatro dias, ao final do qual é dispensado por ela e, por conta disso, acaba afastando-se do professor. No segundo encontro, 25 anos depois, o twist da história: Helena conta o que a levou a seduzi-lo naquela época, revelando que foi mais que uma mera aventura.
Essa virada é o centro do filme, e todo o enredo, como se descobre depois, gira em torno dela. Infelizmente, o twist não é tão surpreendente assim para sustentar todo um longa-metragem. O roteiro, apesar de bem-costurado e sem falhas à primeira vista, peca pela superficialidade.
A proposta é ser uma história sensível sobre um triângulo amoroso, mas a construção dos personagens - à exceção de Helena, uma mulher submissa, porém séria e de forte caráter - não permite a imersão do espectador em seu universo. Pequenos detalhes dos personagens que, no entanto, não parecem verossímeis e não têm sua relação com o enredo bem explicada, roubam tempo que poderia ser melhor aproveitado na exploração das relações entre eles, como, por exemplo, o amor paternal do aluno e do professor. Exemplos dessas características mal-explicadas e, por isso, aparentemente desnecessárias, são a aversão do protagonista, Polydoro, a seu nome (a explicação é que ele o considera "nome de palhaço") ou a obsessão estranha do professor por números, depois que o relacionamento com seu pupilo é rompido.
Como o ator Fábio Assunção já havia revelado o "segredo" da trama - o motivo de Helena para ter o caso com Polydoro - na entrevista coletiva, o filme não teve muita graça. Pouco se viu da sensibilidade e da trama mais autoral, anunciados por Assunção. A relação entre as personagens é explicada por elas, mas isso não se repete na interpretação. Não ficam dúvidas, no final, sobre a virada e a relação entre as personagens, mas também não dá vontade de falar do filme depois de assisti-lo.
A única coisa que fica sem explicação é a razão de o diretor Mauro Farias ter inserido imagens em vídeo e fusões em alguns momentos do filme, quando a proposta é explorar os personagens e não linguagens cinematográficas. O uso desses recursos, que dão ao longa ares de videoclipe em certos momentos, parecem ter sido jogados no filme sem qualquer propósito.
Outro pecado acontece durante uma das cenas mais interessantes e bem-feitas do filme, quando Helena seduz Polydoro durante um jantar. Ela, sempre de olhos baixos, serve o jantar sem falar nada, enquanto ele tenta quebrar o gelo contando histórias e fazendo comentários sobre a comida. No ar, uma tensão erótica permite um dos poucos momentos de imersão do espectador no filme. Ao ver o sorriso de Helena em certo momento, Polydoro reage com uma ereção - mostrada ao espectador com um close no colo dele. Risos da platéia. Porém, quebra-se o ritmo e a beleza da cena de sedução, mesmo durante as próximas cenas de amor entre os dois. Uma pitada desnecessária de humor que estragou o resto da receita.
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