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Netto Perde sua Alma é a atração da noite

Rafael Soares / Terra

A equipe do filme na chegada ao Palácio

Quarta, 08 de agosto de 2001, 14h13

O cinema gaúcho retorna à competição dos longas de Gramado – depois de Um Homem Tem de Ser Morto (1974) e Verdes Anos (1984) – disposto a provar que é bom de briga.

Netto Perde sua Alma, co-direção de Beto Souza e Tabajara Ruas, é um épico ambientado na Revolução Farroupilha (1835 – 1845) e na Guerra do Paraguai (1864 – 1870) com direito a cargas de cavalaria e batalhas com mais de 700 figurantes. Tudo para contar a história do general e estancieiro (o que, na época, dava quase na mesma) Antonio Netto.

O roteiro do filme foi baseado no livro homônimo de Tabajara Ruas, lançado em 1995. As cenas iniciais mostram Netto (vivido por Werner Schünemann) internado em um hospital, recuperando-se de ferimentos sofridos no cerco ao líder paraguaio Solano Lopez. Num clima equilibrado entre o delírio e a realidade, ardendo de malária, Netto recebe um ex-companheiro, o sargento negro Caldeira, para relembrar suas muitas lutas e seus poucos amores, suas pequenas bravatas e grandes obras, como a de proclamar a República Rio-Grandense. Como uma ironia a seu passado heróico, o último feito de Netto será o de justiçar o cirurgião do hospital.

Tabajara, 58 anos, faz questão de dizer que ele e Beto não são historiadores, mas cineastas. "Quisemos apenas fazer um bom espetáculo", afirma.

Além de oferecer uma cuidadosa reconstituição de época, Netto Perde sua Alma levanta uma série de questões escondidas na escassa história oficial, como o caso do Corpo dos Lanceiros Negros, um destacamento de escravos fugidos que voluntariamente integravam a tropa do abolicionista general Netto. "Foi durante a Revolução Farroupilha que os negros conquistaram pela primeira vez seus direitos. Mas, com a derrota dos Farrapos, eles foram abandonados e voltaram à escravidão", diz Tabajara.

A produção de Netto Perde sua Alma, que estréia comercialmente dia 14 de setembro em Porto Alegre e outras 11 cidades, também foi uma batalha. Entre a concepção inicial e a conclusão, se passaram quase três anos, de janeiro de 1999 a julho de 2001. As primeiras filmagens foram realizadas em setembro de 1999, em Uruguaiana, na Fronteira Oeste do Estado, rodando as cenas da batalha do Seival com mais de 750 cavaleiros e uma equipe de mais de 150 pessoas, erguendo um acampamento no meio do Pampa. A desvalorização do Real, em janeiro daquele ano, foi o inimigo mais feroz que Netto enfrentou.

"Tínhamos o equivalente a quase US$ 1,1 milhão (do prêmio RGE Governo do Estado de Cinema) e, de um dia para o outro, ficamos com apenas US$ 600 mil para filmar", lembra Ruas. Segundo ele, a solução foi fazer como qualquer casa decente faz: cortar as festas. "Tivemos de cortar algumas seqüências como a de uma festa que teria fandango, corrida de cavalos, churrasco e música ao vivo. O filme ficou mais sombrio, mas não sacrificamos nada em termos de estética."

Beto Souza, 40 anos, não acredita que a questão do insurrecionismo gaúcho, que, no filme, tem seu clímax com a proclamação da República do Piratini, acabe monopolizando o interesse do público pelo longa-metragem. "A figura de Netto, seu idealismo, seu sucesso e seu fracasso são temas universais", garante.

Além de lutar contra os humores do câmbio, a produção de Netto Perde sua Alma teve de garimpar informações e driblar as plantações de eucaliptos. Para desenhar os figurinos, Tânia Oliveira consultou pinturas e desenhos de Juan Manuel Blanes, artista uruguaio do século 19. Para criar a bandeira da tropa de Netto, a diretora de arte Adriana Nascimento Borba se inspirou no estandarte de uma outra brigada, do tempo da Revolução de 35.

O diretor de fotografia Roberto Henkin penou para não enquadrar reses da raça Hereford, cercas e pés de eucalipto, que não existiam no Rio Grande do Sul na época de Netto, mas são comuns no Pampa de hoje. A fotografia do filme reforçou os contrastes claro/escuro inspirados nas iluminuras de Rembrandt.

Celau Moreira, que já havia feito a trilha para Lua de Outubro junto com Sergio Rojas, enfatizou a dramaticidade das batalhas explorando as áreas graves, com sons criados por violoncelos, evitando o piano ("que soaria como algo da cidade") e incluindo algumas citações, como Boi Barroso e o Hino da República Rio-Grandense. Bebeto Alves e Giba Giba fizeram figuração em Netto Perde sua Alma, tocando composições próprias, que entraram na trilha do filme.

Agência RBS

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