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Liv Ullman filma adultério com roteiro de Ingmar Bergman



Muitas mulheres já marcaram sua presença aqui no festival como diretoras. Samira Makhmalbaf trouxe Sakhte Siah (O Quadro-Negro): continua usando o chador, obrigatório para as mulheres iranianas, mas está mais bonita do que quando esteve em São Paulo, com uma maquiagem suave que destaca a beleza dos olhos. Maria de Medeiros é outra que tem olhos muito expressivos. Leon Cakoff deve levar para a próxima mostra o filme que ela dirigiu, Capitães de Abril, mostrando sua versão afetiva da revolucão dos cravos.

Todas essas mulheres são ótimas, melhores até do que seus filmes, mas Liv Ullman tem um algo mais. Ela está aqui mostrando, em competição, o filme Trolosa (Faithless/Infidele), que tem roteiro de Ingmar Bergman. Se existe essa coisa chamada beleza interior, com certeza aplica-se a Liv. Com seus magníficos olhos claros, ela transmite uma calma, uma serenidade que encanta quem fala com ela. Liv Ullman é zen. Mas seu filme é hard.

Depois das cenas de um casamento, Bergman escreveu as cenas de um adultério. É o segundo filme que Liv realiza com roteiro de seu ex-marido. O primeiro foi Confessions, exibido em Cannes em 1997. "O filme anterior contava um episódio da vida dos pais de Ingmar; era ambientado no começo do século e pude, por meio dele, oferecer um belíssimo papel para Pernilla August; Trolosa é mais sombrio, embora trate de temas parecidos, senão os mesmos, casamento e adultério; dessa vez narra um episódio da vida do próprio Ingmar."

Quando Bergman lhe entregou o roteiro, dizendo que não tinha intenção de realizá-lo, Liv assumiu o projeto e imediatamente fez um detalhado storyboard. Como ela diz, ressaltou alguns personagens - o próprio Bergman, interpretado por Erland Josephson, que fala com uma atriz e, a partir daí, encena a história sobre um divórcio traumático.

É uma crítica que se pode fazer a Liv. Seu trabalho com os atores é fantástico, mas ela ainda não é uma diretora. O timing do filme é duro e difícil, até os enquadramentos deixam a desejar. Se ela gostasse um pouco menos de Bergman, diminuiria a importância do personagem de Josephson para concentrar-se na história do marido, da mulher e do amante. Mas Liv ainda ama Bergman.

Há mais do que respeito e admiracão pelo grande diretor quando ela fala dele. Bergman escreveu o principal papel feminino, o de Marianne, especialmente para Lena Endre, a quem dirigiu diversas vezes no teatro. No cinema, Lena apareceu em Jerusalém, de Bille August, e também fez In the Presence of a Clown, que o próprio Bergman dirigiu para a televisão. Lena É extraordinaria. Um eventual prêmio de interpretação para ela não seria injusto, por mais que a Elpidia Carrillo de Bread And Roses, de Ken Loach, pareça ainda melhor.

Como Lena, o marido e o amante, Thomas Hanzon e Krister Heniksson, também vieram do teatro. Liv fez um mês de ensaios com os atores antes de iniciar a rodagem. "Eles possuem a técnica, mas a técnica não é tudo no cinema; é preciso uma ligação especial com a câmera para conseguir passar aquilo que se pretende." Um filme de atores. E Liv, como se sente? Não gostaria de voltar a atuar? "Estou gostando demais da atividade como diretora; acho que, durante toda a minha vida, era o que queria fazer; além do mais, já passei da idade que interessa aos roteiristas; ninguém escreve bons papéis para mulheres da minha idade."

Ela acrescenta que o que a levou a fazer esse filme foi a constatação de que, na virada do milênio, estão desaparecendo as exigências morais. "Sempre houve adultério, mas as pessoas estão mais egoístas hoje em dia, vivem pelo próprio prazer." Ela não quer condenar ninguém, mas acha que o verdadeiro sentimento ficou mais difícil. Fala com convicção sobre o filme que realizou. Só se descontrola um pouco quando o assunto cai numa decisão do marido traído - num assomo de desespero e autodestruição, ele chega a propor à filha pequena que ambos se matem. Liv emociona-se só ao pensar. Desvia os olhos, fita um ponto no vazio. "É terrível demais, é algo que eu tento entender, mas não consigo explicar; e, ao mesmo tempo, foi esse tipo de coisa que me levou a querer fazer o filme; é preciso iluminar as áreas mais sombrias da experiência humana." (Agência Estado)

 

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