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O elogio veio do próprio Ariano Suassuna. Matheus Nachtergaele é o melhor de todos os intérpretes de João Grilo, no teatro e no cinema. Os olhos de Nachtergaele brilham. "Ele disse isso? Que legal." É sábado de tarde, no camarim do Teatro Glória. Na noite anterior, houve a estréia de "A Controvérsia". É a segunda apresentação da peça de Jean-Claude Carrire sobre a violência dos conquistadores espanhóis na América recém-descoberta. Paulo José é ator e diretor, há outros nomes importantes no elenco (Otávio Augusto, Ivan Albuquerque e o veterano Ankito), mas quem domina a cena, numa interpretação elétrica, é Nachtergaele. Ele está em todas. No teatro, com "A Controvérsia"; nos cinemas, com "O Auto da Compadecida". Deve começar a gravar a minissérie "Os Maias", que Luiz Fernando Carvalho vai dirigir baseada no romance de Eça de Queirós, adaptado por Maria Adelaide Amaral (que usa elementos de outro livro do autor, "A Relíquia"). Nachtergaele também está em "Bufo & Spallanzani", o policial que Flávio R. Tambellini adaptou do livro de Rubem Fonseca (e deve estrear no 2.º Festival do Rio BR, em outubro). Como se não bastasse, Nachtergaele está em processo de "namoro", como diz, com vistas a dois outros filmes - "Dionísio Ressuscitado", de Arthur Omar, e "Deus É Brasileiro", de Cacá Diegues. Não sabe se esses namoros vão adiante, mas gostaria que sim. Nachtergaele adora fazer cinema. Sua interpretação como João Grilo arrebatou os críticos, além do próprio criador do personagem. Mas ele confessa que não foi fácil assumir-se como Grilo. Para início de conversa, ele nunca se considerou um ator cômico. Considera-se um ator dramático, trágico mesmo. Mas Guel o cooptou, convencido, a partir de um episódio da "Comédia da Vida Privada", que ele seria o Grilo perfeito. Nachtergaele tinha dúvidas, mas fingia que não. Ficava dizendo como queria criar o personagem. Achava Grilo difícil. O humor bufo, arlequinesco do personagem, a forma de auto, baseada nas representações da Idade Média, tudo lhe parecia intransponível. Leu tudo de Suassuna, devorou o Lazzarillo de Tormes, que Guel lhe apresentou. Dizia que ia criar o Grilo homem, sem perder de vista o arlequim, mas no fundo não estava muito convencido. Chegou a Cabaceiras, para o início das gravações, ainda em dúvida. E jura que tremia quando foi gravar sua primeira cena - a chegada do major Antônio Morais, da qual participa com Chicó. O que ocorreu, então, ele diz que faz parte da mágica do processo da criação artística. "Treino é treino, jogo é jogo", compara. Guel gritou "Gravando!", ele incorporou no ato João Grilo e percebeu no olhar de aprovação do diretor e dos colegas, após a gravação, que havia chegado lá. "Minha vida mudou depois do João Grilo", ele diz. E dá exemplos práticos. Depois que a série passou na Globo, ele se tornou íntimo do povo brasileiro. É recebido, acolhido, carinhosamente, onde quer que vá. As pessoas dizem "Entra, senta", compartilham o que têm, principalmente o carinho, com ele. Elogia a participação do colega, Selton Melo, o Chicó. "A trajetória do Selton é muito interessante", avalia. Ele começou muito cedo na TV, mas com o tempo tomou gosto pela representação e descobriu que era um verdadeiro ator. "Da TV saltou para o teatro e o cinema, fez um (Harold) Pinter excelente" (refere-se a "O Zelador"). Conta que ele próprio virou ator por causa das novelas, que via desde pequeno. Só conheceu o teatro quando entrou para a trupe de Antunes Filho, em 1989. Desde então, não parou mais. Teatro, cinema e TV - apesar da pouca estatura, é um raro e grande ator, um dos maiores do País.
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