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Retrospectiva de Pontecorvo é destaque no Festival Rio BR



John Waters, Terence Davies - a lista de convidados internacionais do Festival do Rio BR, que começa amanhã(05), traz diretores que são cults, mas talvez não sejam grandes. Grande é o italiano Gillo Pontecorvo, que desembarca nesta quinta-feira no Rio para prestigiar uma retrospectiva de sua obra. São poucos filmes, mas entre eles estão clássicos políticos dos anos 60 - A Batalha de Argel e Queimada. Justificam a reputação de mestre do cinema político que Pontecorvo ostenta. Mas ele, pessoalmente, prefere outro filme que fez em 1960 - Kapò. A retrospectiva vai dizer se ele tem razão. E inclui uma novidade, o especial Retorno a Argel, que Pontecorvo realizou com seu filho, o fotógrafo Marco Pontecorvo (a quem chama de Marcolino), retornando, 25 anos depois, à cidade em que rodou A Batalha de Argel. Retorno a Argel será exibido em vídeo.

Ele conversou pelo telefone, de Roma, com a reportagem. Falou italiano e francês, mas não inglês, língua à qual é avesso embora tenha trabalhado com atores americanos (Susan Strasberg em Kapò, Marlon Brando em Queimada) e também dirigido, durante cinco anos, o Festival de Veneza, um dos mais prestigiados do mundo. Explica por que parou de filmar após O Ogro, no fim dos anos 70. "Foi por problemas de saúde, jurei que só voltaria a dirigir se encontrasse um tema que me apaixonasse de verdade." Essa paixão só experimentou no documentário que fez com o filho. "Quer prazer maior para um pai do que trabalhar com seu filho? Foi uma das épocas mais felizes de minha vida, pelo companheirismo, pela integração."

Pontecorvo nasceu em Pisa, em 1919. Tem 81 anos, portanto. A família, numerosa. Seus pais tiveram oito filhos, cinco homens e três mulheres. Ele foi o caçula entre os homens. Queria estudar letras, mas conta que seria ridicularizado em casa, se o fizesse. Todos os homens da família eram cientistas. Um irmão, Bruno, foi físico famoso, adquirindo notoriedade internacional por suas pesquisas sobre energia atômica. Outro, Guido, foi um dos maiores biólogos do mundo, membro da Royal Academy da Inglaterra. Seguindo a tradição familiar, Gillo virou químico. Na seqüência, foi correspondente de jornais italianos em Paris. Começou a interessar-se pelo cinema. Virou assistente de Joris Ivens, Mario Monicelli e Yves Allegret. O primeiro apadrinhou sua estréia, no filme em epísódios Rosa dos Ventos, que teve supervisão de Ivens e Alberto Cavalcanti, incluindo, entre os demais episódios, um rodado no Brasil (Pontecorvo não se lembra o nome do diretor, mas era Alex Viany).

Jovem ainda, Gilberto (seu verdadeiro nome - ficou Gillo porque os irmãos assim o chamavam) inscreveu-se no Partido Comunista Italiano, mas abandonou-o em 1956, em parte desiludido com a repressão na Hungria, mas principalmente porque não se ajustava ao centralismo democrático do partido. Deixou de ser comunista, mas nunca abandonou a política. Depois do episódio Giovanna, de Rosa dos Ventos, e de A Grande Estrada Azul com Yves Montand, iniciou sua grande obra com Kapò. O repórter lembra que o crítico, hoje diretor, francês Eric Rohmer fez duras críticas à história da garota judia que vira supervisora num campo de concentração, colaborando com os nazistas. Pontecorvo diz não se lembrar, mas dá o troco. "Nunca consegui me interessar pelas comédias dele; pouco me importa sua opinião."

Adora o filme não só pela política, mas pela estética. Buscou um tipo de fotografia que se assemelhasse à dos cinejornais. Só que queria algo mais elaborado, experiência que repetiu em A Batalha de Argel, sobre o levante de 7 de outubro de 1957, quando os argelinos rebelaram-se contra os colonizadores franceses na Casbah. O filme reconstitui a luta do povo argelino pela liberdade. Critica os excessos, mas defende o terrorismo como instrumento de luta contra o colonialismo.

Em compahia do seu fotógrafo (Gatti), Pontecorvo ficou um mês na Argélia fazendo todo tipo de experiência até chegar ao estilo de imagem que queria. Buscava a autenticidade dos cinejornais, mas queria um filme que fosse bonito ("Seria desrespeito com o público pagante oferecer-lhe algo que não fosse elaborado, esteticamente"). O filme ganhou o Leão de Ouro no Festival de Veneza de 1966. Impressiona ainda hoje pela veracidade da reconstituição. Os argelinos foram às ruas participar da recriação, que Pontecorvo fazia, de um episódio fundamental da guerra anticolonial.

"A Batalha de Argel mostra o nascimento de uma nação", ele diz. Não usou uma só imagem de época, tudo foi reconstituído. Teve problemas com Yacef Saadi, o líder argelino que fazia o próprio papel. "Qualquer pessoa que se interprete a si mesma vira um inferno para o realizador." (Luiz Carlos Merten/ Agência Estado)

 

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