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Camurati interrompe "Copacabana" para ser jurada na Mostra de SP


"Estou nervosa, não gosto da
posição de julgar os outros"
(Rosane Bekierman/AE)

Carla Camurati interrompe a finalização de Copacabana, seu terceiro longa-metragem, para exercer seu olhar crítico. A diretora carioca de 39 anos foi convidada por Leon Cakoff para integrar o júri da 24ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo, que será inaugurada hoje na Sala São Paulo com a projeção, só para convidados, do filme português Palavra e Utopia, de Manuel de Oliveira.

"Não é uma posição confortável, mas não pude recusar. Foi a segunda vez que o Cakoff me convidou", conta a diretora, que dividirá a tarefa de avaliar os títulos da mostra Novos Diretores com o diretor suíço Richard Dindo, a atriz portuguesa Leonor Silveira (no elenco de Palavra e Utopia), o jornalista e crítico mexicano Leonardo Garcia Tsao e o diretor da Cinemateca Uruguaia Manuel Martinez Carril.

Ao todo, 65 filmes participam da mostra competitiva - exclusiva para cineastas com, no máximo, três filmes no currículo. O público se encarrega da pré-seleção, elegendo os dez melhores - a partir de cédulas de votação que são entregues antes de cada sessão. Definidos os dez preferidos do público, o júri entra em cena e escolhe o vencedor do troféu Bandeira Paulista.

Em entrevista, concedida por telefone durante um intervalo no trabalho de edição de Copacabana, Carla Camurati falou sobre o papel de jurada e sobre o filme que está concluindo. Com orçamento de R$ 2 milhões e elenco formado por Marco Nanini, Louise Cardoso, Walderez de Barros e Laura Cardoso, a produção promete chegar aos cinemas no início de 2001. "Como estou na reta final, fico ansiosa para terminar.

Pareço mulher grávida que não vê a hora de o bebê nascer."

Pela primeira vez você vai julgar o trabalho de outros cineastas. Como se sente nesse papel?
Estou nervosa com isso. Sinceramente, não gosto muito de estar nessa posição, a de julgar os outros.

O que a atrai na Mostra de São Paulo?
Sempre fui cinéfila. Além dos dez filmes selecionados pelo público, pretendo ver muito mais. O aspecto mais interessante de uma mostra como essa é a possibilidade de ver trabalhos que fogem à globalização. Para entrar no mercado internacional, os filmes estão cada vez mais despersonalizados. E a Mostra traz filmes realizados sob outra ótica, com um olhar diferenciado.

Muitas vezes, uma produção leva o espectador a um lugar onde ele jamais sonhou estar.

Por ser cineasta você será mais rigorosa na avaliação ou tentará ver os filmes como os olhos leigos do público?
O meu gosto não está tão distante das preferências do público.

Grandes sucessos nacionais, como Central do Brasil e Baile Perfumado, títulos que foram bem-sucedidos nas bilheterias, também me tocaram. A diferença é que eu vejo defeitos e problemas que a platéia geralmente não vê. Quando um cineasta assiste a um filme, ele geralmente passa mais tempo pensando nas coisas que faria diferente. É normal. Mas quando o filme é excepcional, você esquece tudo isso. Pára de reparar na engrenagem técnica e se deixa levar.

Apesar de exibidos no exterior, seus dois longas (Carlota Joaquina, de 1995, e La Serva Padrona, de 1997) não competiram em festivais. Foi uma opção?
Como sou muito ansiosa, nunca inscrevi meus filmes para competição lá fora. Quando o filme está pronto, tenho pressa. Preciso lançá-lo imediatamente. E para colocar um título para competir em festivais, principalmente nos internacionais, a obra precisa ser inédita.

Copacabana reforça sua ousadia cinematográfica. Depois de rodar Carlota Joaquina em período de agonia para o cinema nacional e dirigir La Serva Padrona, sobre um gênero pouco difundido (a ópera), você aborda um tema que incomoda: a velhice.
Prefiro tocar em assuntos com os quais o brasileiro não tenha ligação forte. Quando rodei Carlota Joaquina, todos diziam que eu estava louca. "As pessoas odeiam história", diziam. A mesma coisa com La Serva Padrona, já que o brasileiro supostamente não gosta de ópera. Mas como é que as pessoas podem dizer isso se o brasileiro não conhece ópera? Copacabana nasceu no mesmo espírito. Acho que o Brasil se prende muito a coisas frágeis, como à beleza e juventude. O mais interessante na vida é você ter a noção da continuidade. Ter fôlego para isso. E o problema do brasileiro é que ele não pensa na velhice. As pessoas parecem acreditar que os velhos já nasceram velhos.

Qual o tom do filme? Você abordará aspectos menos atraentes, como abandono e aposentadoria?
Não. O que eu quero mostrar é justamente o contrário. Apesar de achar que o público precisa ter noções de aposentadoria, já que seremos os aposentados de amanhã, não vou tocar no assunto. A intenção é mostrar que os idosos são pessoas normais. Ninguém precisa necessariamente regredir ou se transformar em uma pessoa amargurada. Tudo isso vai depender de como você conduziu a sua vida. A velhice também pode ser boa. Por que não?

Copacabana é uma comédia filosófica que abre as portas para novas formas de encarar a velhice. O filme dá alguns toques importantes. A amizade, por exemplo, é uma das coisas que se mostra ainda mais valiosa na velhice. Nem todos os romances duram para sempre e, com os familiares, há muitos choques de geração. Já os amigos são os verdadeiros cúmplices, as pessoas com quem você pode relembrar os melhores momentos. E isso é saudável. Algumas coisas são insubstituíveis.

Qual o papel de Copacabana na história?
Todos os personagens moram em Copacabana, um dos lugares mais saudáveis para a velhice. É um mundo à parte. Um bairro cosmopolita onde as pessoas se aceitam mais, até porque estão acostumadas a conviver com prostitutas, travestis e meninos de rua. Quem fica isolado não acompanha a velocidade com que o mundo gira e fica cheio de preconceitos. Em Copacabana, os idosos vão à praia, saem com os amigos, jogam, freqüentam bingos. Eles têm vida para contar. Sofrem problemas sim, principalmente de saúde. Mas a velhice não é uma catástrofe. Os idosos não são uns coitados. Tenho uma avó de 85 anos e um avô de 87 que se mantêm ativos. Meu avô nada três vezes por semana e minha avó vê todos os espetáculos teatrais do Rio. Vê muito mais do que eu.

Eles aparecem no filme?
Minha avó aparece, mas meu avô não quis. Pediu: "Por favor, não me faça passar por isso a esta altura da vida".
(Jornal da Tarde)

 

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