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Embora jovem (36 anos), o japonês Shinji Aoyama já tem seis filmes no currículo. Nenhum dos cinco anteriores circulou nos festivais internacionais ou teve lançamento no Ocidente. O cineasta que será revelado hoje ao público da Mostra é, portanto, um desconhecido. Não será por muito tempo. Em Cannes, em maio, foi a mesma coisa. Aoyama virou uma celebridade no momento seguinte à exibição de Eureka. Seu filme terminou ganhando o prêmio da crítica - por unanimidade. É outro filme de crítico, alguém poderá dizer - como Gente da Sicília, de Jean-Marie Straub e Daniele Huillet, premiado na Mostra do ano passado. Eureka tem quase quatro horas de duração. Não desanime com o que será uma experiência rara. Essas quatro horas vêm embaladas numa suntuosa fotografia em preto-e-branco, formato cinemascope. Aoyama explica sua opção pelo preto-e-branco. "A cor dá muitas informações e termina distraindo o espectador; eu queria justamente o contrário, a concentração do público." Eureka concentra-se em poucos personagens. Um motorista de ônibus, dois escolares. São os sobreviventes do seqüestro de um ônibus que ocorre logo no começo. Traumatizado pela experiência, o trio forma um simulacro de família. Há um quarto personagem, o primo dos escolares. Aoyama está longe de ser um intuitivo. É um intelectual assumido. Cinéfilo, formado em direção na Universidade de Tóquio, exerceu a função de crítico e já tem pronto um livro sobre Wim Wenders. Em Cannes, ele explicou as mudanças profundas que ocorreram na sociedade japonesa nos anos 90. O atentado com gás sarin da seita Aoum lançou o Japão numa espécie de miniguerra civil. Simultaneamente, ocorreram outros fatos perturbadores - não parou de aumentar o número de crianças que assassinaram os próprios pais. Tudo isso fez com que, após um período de estabilidade, os japoneses compreendessem que o mundo estava mudando - e a mudança encerrava de vez com as concepções tradicionais de família e sociedade no país. Esse filme tenta colocar na tela os problemas complexos do Japão atual. Como sobreviver a uma tal tomada de consciência da desintegração de todo um sistema familiar e social? Aoyama não dá respostas. Prefere colocar a questão. Embora Yasujiro Ozu, Kenji Mizogucvhi e Akira Kurosawa sejam refererenciais para o estudo da sociedade japonesa no pós-guerra, ele diz que John Cassavetes e Clint Eastwood foram mais importantes em sua formação. E acha que a duração de Eureka é uma necessidade do próprio tema - a queda dos personagens e o seu renascimento, após a catástrofe, não podiam ser esquematizados. Um grande filme, mesmo.
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