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Concorrendo no mais recente Festival de Cinema de Veneza, o coreano A Ilha provocou polêmica. Foi considerado violento. E sua violência, tida como gratuita. Durante a sessão para a imprensa, duas jornalistas passaram mal. A projeção teve de ser interrompida para que uma delas, branca como papel, fosse conduzida para fora da sala. Esse tipo de reação não diz nada sobre a qualidade intrínseca de uma obra. Um filme pode ser chocante e nem por isso será bom. Pode ser apenas apelação. Aliás, os franceses têm uma ótima expressão para casos assim - succès de scandale, sucessos de escândalo, obras vazias que não deixam resíduo depois de produzir um choque temporário. O diretor Ki-Duk Kim provoca (ou tenta provocar) esse efeito em duas cenas principais, julgadas intoleráveis pela platéia italiana. Numa delas, o personagem masculino tenta se suicidar engolindo uma linha com vários anzóis e, depois de devidamente fisgado, puxando-os para fora. Em outra, a personagem feminina faz tentativa semelhante, mas os anzóis são enfiados em outro lugar do corpo. Bem. Nenhuma das cenas é bonita de se ver. Há outras, também pouco edificantes. Numa delas, outro personagem tira um peixe da água, corta duas fatias de sushi, come-as e devolve o animal, vivo, ao lago. As cenas chocantes não dizem tudo sobre o filme. Os personagens são mais interessantes. A mulher é Hee-Jin e vive sozinha em uma ilha de pesca, onde as pessoas vão espairecer ou simplesmente transar com uma companhia de ocasião. Ela serve comida durante o dia e se prostitui à noite. O homem é Hyun-Shik, policial que atirou na mulher infiel e se refugia na ilha, onde planeja se matar. Desesperados e terminais, Hee-Jin e Hyun-Shik acabam se envolvendo e protagonizam um estranho caso de amor. Tivesse o cineasta concentrado seus esforços em aprofundar a relação entre personagens potencialmente ricos, poderia ter feito um belo filme. Escolheu um tratamento chocante, eficaz, mas às vezes parece apelativo. Vale pela ousadia, mas esta, quando se esgota em si mesma, parece apenas mais uma variante da esterilidade.
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