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25ª Mostra: Festival traz 260 clássicos e consagrações

Sexta, 19 de outubro de 2001, 17h35

Cena de "Bully - Juventude Violenta", de Larry Clark
Começa nesta sexta-feira o festival de cinema de São Paulo, que vai até dia 1 de novembro com uma seleção de mais de 260 filmes.

Mudando de nome por conta de um novo patrocinador - agora, o título oficial é Mostra BR de Cinema -, mas não de espírito, o mais antigo festival da capital chega aos 25 anos de vida sem perder o hábito de abalar o sossego dos cinéfilos.

Notáveis Premiados
Diretamente do Festival de Cannes deste ano, comparece para as primeiras exibições desta sexta-feira o grande vencedor da Palma de Ouro, O Quarto do Filho, do italiano Nanni Moretti.

Conhecido por um estilo que costura política e vida familiar com um humor bastante irônico - caso de Caro Diário (1993) e Aprile (1998) - Moretti surpreende aqui com um drama inteiramente ficcional, em torno do impacto da morte de um jovem sobre uma família de classe média, cujo pai é o próprio Moretti, interpretando um psicanalista.

Outro grande premiado em Cannes é A Professora de Piano, do austríaco Michael Haneke - que arrebatou o Grande Prêmio do Júri, mais os troféus de melhor atriz para Isabelle Huppert e melhor ator para Benoît Magimel.

A história retrata a doentia relação entre uma professora de piano masoquista e um de seus jovens alunos, que sustenta com ela um jogo de alta perversidade.

Dono do prêmio de melhor roteiro no festival francês, a produção bósnia Terra de Ninguém, do estreante Danis Tanovic, surpreende por sua concisão e contundência, ao colocar na mesma trincheira um soldado sérvio e outro bósnio, em pleno fogo cruzado da guerra étnica, em 1993.

Curiosamente, o filme foi concretizado a partir do encontro de três dos jurados da Mostra em 1999: o produtor iugoslavo Cedomir Kolar (que voltará a São Paulo este ano), o coordenador da Fabrica Cinema, Marco Muller, e a diretora belga Marion Hansel, que apadrinharam o projeto.

Três premiados no último Festival de Veneza também marcam presença. É o caso da produção iraniana O Voto é Secreto, que deu o Leão de Prata de melhor diretor a Babak Payami, um novo nome apontando na prestigiada seleção de cineastas do país dos aiatolás.

Num ambiente árido e desolado, que lembra muito o mais remoto sertão nordestino do Brasil, narra-se o atraente embate entre uma dedicada agente eleitoral da cidade e o soldado camponês encarregado de protegê-la e à urna eleitoral que carrega, na busca obstinada por votantes renitentes.

Abusada e com diálogos bem ousados, a comédia E Sua Mãe Também, do mexicano Alfonso Cuarón, levou dois merecidos prêmios em Veneza, melhor roteiro e o troféu Marcello Mastroianni para jovens atores para os dois protagonistas, Diego Luna e Gael Garcia Bernal (este, conhecido no Brasil por sua atuação em Amores Brutos).

Mas quem surpreende, também, é a bela atriz espanhola Maribel Verdú, que expõe toda a sua sensualidade na pele de uma mulher que abandona o marido e parte numa viagem de redescoberta da paixão ao lado dos dois garotos.

Uma raríssima produção da Eslovênia, Pão e Leite, chega com a credencial do prêmio Leão do Futuro, troféu veneziano para um diretor estreante, no caso, Jan Civtkovic (outro convidado com presença confirmada pela Mostra).

Com um visual despojado e fotografia em preto-e-branco, a história delineia a destruição de uma pequena família por conta do alcoolismo do pai e o vício das drogas do filho.

Não premiados, mas muito notáveis
Filmes que não foram premiados em Cannes ou Veneza, mas bem mereciam ter sido, poderão ser dignamente apreciados pelo público paulistano.

É o caso da produção iraniana O Caminho para Kandahar, em que o cineasta Mohsen Makhmalbaf põe o dedo em duas feridas do tristemente famoso Afeganistão dos Talibans: a pobreza e a opressão feminina.

A protagonista é uma jornalista (Pazira Niloufar, que virá a São Paulo no dia 29) exilada no Canadá e que busca desesperadamente voltar ao Afeganistão para salvar sua irmã, à beira do suicídio.

A arte teatral é a moldura de Vou para Casa, trabalho do diretor português Manoel de Oliveira, em que o ator francês Michel Piccoli (de A Comilança) atinge o auge de sua forma justamente interpretando um veterano ator que entra em crise ao ser convidado a trocar os palcos pelo cinema.

Outra obra de Manoel de Oliveira será o belíssimo documentário Porto da Minha Infância, seleção do Festival de Veneza/2001, em que o nonagenário cineasta recupera as recordações de sua cidade natal e até se arrisca numa pequena ponta como ator, justamente numa cena teatral, ao lado da atriz Maria de Medeiros.

Um novo retrato de uma nova geração perdida e criminosa está em Bully - Juventude Violenta, do diretor americano Larry Clark, que chocou o mundo com Kids, vencedor da Palma de Ouro em Cannes em 95.

Baseado num fato real, o novo filme conta a história de dois amigos desde a infância, o dominador Bobby (Nick Stahl) e o complexado Marty (Brad Renfro, de O Aprendiz), seguindo um itinerário que terminará em assassinato.

Como Bully, parte da seleção oficial de Veneza/2001, o suspense Os Outros, do chileno Alejandro Amenábar, tem na atriz Nicole Kidman sua grande atração. Num trabalho de grande densidade dramática, a bela atriz interpreta uma mulher atormentada, que vive isolada numa grande mansão na remota ilha de Jersey, em 1945.

Suas únicas companhias são dois filhos pequenos que não podem ser expostos à luz do sol devido a uma rara doença. A chegada de uma nova governanta (Fionnula Flanagan), seu marido e filha, desencadeia uma apavorante sequência de acontecimentos.

Brasil na Mostra
O cinema brasileiro tem uma seção pequena, mas de qualidade. Abre alas o novíssimo curta-metragem Compadre Zé Ketti, de Nelson Pereira dos Santos, com imagens raras da convivência entre o veterano diretor e o sambista, que atuou em alguns de seus filmes.

O curta deve ser exibido juntamente com uma cópia restaurada de Vidas Secas, clássico de 1963 baseado no romance de Graciliano Ramos, onde o compositor também atua.

Outros títulos brasileiros que devem atrair muita atenção são Lavoura Arcaica, adaptação do livro de Raduan Nassar assinada por Luiz Fernando Carvalho, e o elogiado documentário Onde a Terra Acaba, de Sérgio Machado, que recupera a figura do lendário diretor Mário Peixoto, autor de Limite (1931).

Também com raízes documentais, Janela da Alma, de João Jardim e Walter Carvalho (diretor de fotografia de Central do Brasil), coloca em evidência pessoas com algum grau de deficiência visual, do músico brasileiro Hermeto Pascoal ao escritor português José Saramago.

Neusa Barbosa
Reuters

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