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Público aplaude filme argentino que pressagia crise de dezembro

Terça, 12 de fevereiro de 2002, 10h52

O público do Festival de Berlim aplaudiu com entusiasmo nesta segunda-feira o filme argentino Um dia de sorte, de Sandra Gugliotta, que através de seus aspectos sociais pressagia a crise instaurada no país em dezembro.

O filme conta a história de Elsa (interpretada por Valentina Bassi), uma jovem que sobrevive com pequenos trabalhos e quer economizar para ir à Itália, apaixonada por um siciliano com nome de marca de lavadoras com quem passou uma noite em Buenos Aires.

Essa história, exibida na seção Fórum do Cinema Jovem, acontece nos vinte dias que duraram os cortes de luz no sul da cidade, habitado por uma classe média baixa, no verão de 1999, que geraram protestos populares organizados pelas assembléias de moradores.

Praticamente todo o público que lotava o enorme cinema Delphi da capital alemã permaneceu para presenciar e participar de uma palestra em que Gugliotta, acompanhada por Bassi e pelo ator Fernán Mirás, contou anedotas da filmagem e esclareceu aspectos do filme.

"Faz tempo que as pessoas querem sair, até poucos meses ainda perguntavam por que", explicou Gugliotta, em referência ao desejo de fuga de muitos jovens argentinos, aguçado depois das violentas revoltas de dezembro, em que morreram 36 pessoas.

A diretora vê nesses eventos "um embrião de associações, de pensar a política de base" representada no filme não tanto pelos jovens, que tentam escapar da miséria e da falta de oportunidades através das drogas ou da fuga, mas pelo personagem do avô de Elsa.

Gugliotta observou que se o filme tivesse sido rodado depois da recente quebra do país o resultado teria sido muito diferente já que agora, como disse, os jovens argentinos "recuperaram de alguma maneira as ideologias e a utopia".

Essa jovem produtora é muito crítica com a história de seu país no último quarto de século, já que a crise chegou "depois de anos de uma ditadura em que morreram mais de 30.000 pessoas, uma geração inteira de jovens, e depois de planos de privatização das empresas públicas e do esvaziamento econômico do país", disse.

"O filme mostra uma decisão individual em um mundo social convulsionado, e também uma idéia expressada através do avô da protagonista, que representa a predominância das ideologias", afirmou Gugliotta, que dedica o filme a seu próprio avô.

A atriz que encarna a protagonista, Valentina Bassi, disse que os que participaram da filmagem quiseram que o filme fosse "quase como um documentário, como se olhássemos através da fechadura de uma porta", o que é traduzido no ritmo nervoso das imagens de uma história rodada em grande parte na rua.

Fernán Mirás, que interpreta um amigo da protagonista que se apaixona por ela, concordou com essa idéia e indicou que "isso era um desafio, que parecia que as pessoas filmada eram totalmente reais".

Apesar da dura situação vivida na Argentina, Gugliotta se mostrou otimista co respeito ao futuro do cinema de seu país, porque "há um nível técnico de formação muito boa e tecnologia de ponta, mas falta dinheiro e o Governo não pode financiar o cinema agora", declarou.

Outro filme argentino, Todos juntos, de Fernando León, selecionado para ser apresentado na mesma seção da Berlinale, não pôde chegar à Alemanha porque seus responsáveis não conseguiram os recursos necessário para fazer uma cópia.

Sandra Gugliotta previu que a crise da Argentina "vai se repetir em outros países" através da "quebra do sistema" porque as pessoas "se levantarão contra o discurso dominante".

Efe

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