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Meirelles atribui a elenco amador a veracidade de Cidade

Sábado, 18 de maio de 2002, 21h13

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Para quem viu Domésticas -- O Filme, o novo trabalho do diretor paulista Fernando Meirelles, Cidade de Deus, chega a chocar. Baseado no livro homônimo de Paulo Lins sobre o tristemente famoso subúrbio carioca, Cidade de Deus contém uma dose de violência e encurralamento social sem concessões que, por muitas vezes, pode suspender a respiração de quem assiste.

Isto aconteceu mesmo no Festival de Cannes, onde estreou, fora de competição. Com as platéias brasileiras, que deverão esperar até agosto para ver o filme, o sentimento deverá ser ainda mais forte, já que a realidade mostrada ali deve tocá-la bem mais de perto do que a européia.

Os europeus se impressionaram tanto com a gravidade do problema social retratado quanto com a qualidade do elenco, praticamente todo amador. O diretor Fernando Meirelles não tem nenhuma dúvida de que o fato de seus atores serem amadores é a razão da veracidade do filme. "Com um elenco profissional, este filme não teria funcionado", disse ele à Reuters.

Os atores foram recrutados em mais de 2.000 entrevistas conduzidas pela produção em comunidades e favelas do Rio de Janeiro. Depois da seleção, os jovens atores foram treinados num workshop de seis meses, conduzido por Kátia Lund, que tinha experiência no ramo e que, por seu envolvimento no projeto, acabou conquistando o posto de co-diretora.

Kátia, aliás, também dividiu com Meirelles a direção do curta Palace II, premiado no Festival de Brasília 2001, que nasceu do mesmo embrião que gerou Cidade de Deus e que tem no elenco alguns dos mesmos atores.

A naturalidade que se sente nos diálogos nasceu também do processo que começou na pré-produção. Como explica Fernando Meirelles, "os meninos não seguiam um roteiro escrito, com falas a decorar. Explicávamos a eles qual era a situação e eles criavam as cenas. Por isso, a linguagem deles parece tão real".

Parque de diversões

Outra explicação vem do fato de que vários deles têm experiência em teatro amador, caso de Alexandre Rodrigues (o fotógrafo Buscapé, herói e narrador do filme) e de Roberta Rodrigues Sílvia (Berenice), que fez parte do grupo Nós do Morro.

Entre deslumbrados e intimidados pelo tamanho e a badalação do Festival de Cannes, alguns desses atores, que deixaram o Brasil pela primeira vez na vida, emitiram análises bastante lúcidas sobre a experiência do filme e de estar na França.

O mais eloquente deles foi Jonathan Haagensen, mulato descendente de dinamarqueses que interpreta o malandro Cabeleira. "Cannes para mim é um parque de diversões, é um sonho. Quando acordar, na minha casa, vou agradecer pela oportunidade de ter estado aqui."

Comentando o fato de morar numa comunidade parecida com a retratada no filme, Jonathan afirmou que "o que acontece por lá, acontece em qualquer lugar do mundo. Estou lisonjeado por ser parte de um filme que retrata tão bem essa realidade".

Cidade de Deus já tem distribuição internacional adquirida pela Miramax. A representante do estúdio em Cannes, Agnes Mentre, informou que ainda não está definida a agenda internacional de lançamento do filme, nem se ele será ou não colocado para a disputa de uma indicação ao Oscar de filme estrangeiro.

O filme foi co-produzido pela Videofilmes de Walter Salles, que está em Cannes este ano como jurado da competição principal.

Reuters

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