A dor e a raiva pelos atentados nos Estados Unidos em setembro do ano passado foram lembradas pelo Festival de Cinema de Veneza com a estréia da obra coletiva 11'09''01 - September 11, realizada por 11 cineastas de diversos países e continentes, tendo cada curta 11 minutos, nove segundos e uma imagem de duração. » Confira cobertura completa do Festival de Veneza
O filme, realizado entre outros pelo mexicano Alejandro González Iñárritu, pelo francês Claude Lelouch, pelo inglês Ken Loach, pelo americano Sean Penn, foi exibido esta quinta-feira para a imprensa especializada, enquanto amanhã sexta-feira será alvo de uma cerimônia especial.
Trata-se de "um convite para se refletir sobre o que ocorreu", dizem os autores, entre eles importantes cineastas asiáticos e europeus, convocados pelos produtores franceses Galatee Films e Studiocanal para fazer os curtas.
Os 11 diretores, incluídos o japonês Shohei Imamura, a iraniana Samira Makhmalbaf, o burquinense Idrissa Ouedraogo, o bósnio Danis Tanovic, o israelense e a indiana Mira Nair, representando "países e culturas diferentes", trabalharam com total liberdade para expressar o próprio ponto de vista sobre uma das tragédias que marcaram o início do século XXI.
"Para mim o 11 de setembro é um evento a mais numa luta permanente que todos conhecemos. Foi o ataque simbólico ao poder que representam o World Trade Centre e o Pentágono", afirmou numa entrevista Loach, que se inspira em seu curta numa comovente conversa com um amigo exilado chileno.
O curta de Loach, um dos mais emocionantes e fortes, evoca outro 11 de setembro, o golpe de Estado de 1973 no Chile contra o primeiro governo socialista democraticamente eleito na América Latina, o de Salvador Allende, e acusa diretamente os Estados Unidos, com imagens e declarações em preto e branco desses anos, de terem derrubado as ilusões de toda uma geração de latino-americanos.
"Senti como um dever realizar este curta, para não esquecer", disse o cineasta bósnio Danis Tanovic, Oscar em 2001 por No mans's land.
Para o mexicano González Iñárritu, autor de Amores perros, que estava passando a viver em Los Angeles, "mais do que expressar posições políticas e filosóficas, a idéia de realizar o filme oferecia a possibilidade aos cineastas de exorcizarem o medo, a escuridão e a dor".
Para o cineasta, "renasceu um estranho nacionalismo" nos Estados Unidos e seu curta, que por intermináveis segundos mostra apenas a escuridão, que de alguma maneira é uma advertência: "o sol pode te iluminar, mas se o fixares por muito tempo, te queima os olhos, te torna cego", escreve no final dos onze minutos.
"Sinto este dia como a perda de algo, que depois te produz dor", admitiu o cineasta Sean Penn, o único americano convidado a participar da obra coletiva, cujo desesperado ancião é um símbolo de seu país.
Cada espectador reagirá à sua maneira diante de imagens tão inquietantes, emocionantes, chocantes e em alguns casos divertidas.
Os comentários das crianças pobres de um campo de refugiados afegãos no Irã sobre os atentados, a triste carta escrita por um exilado chileno e as angustiantes imagens, acompanhadas de rezas e silêncios, de alguns dos que se lançaram das Torres Gêmeas nesse dia, como as escolhidas por González, constituem um documento sobre as várias interpretações que podem ser dadas a um evento que sacudiu o mundo.
O grupo de crianças africanas, com sua visão realista e ingênua, que tenta sequestrar um muçulmano parecido com Osama Bin Laden para obter o resgate e comprar cadernos e remédios para os doentes, demonstra o frescor de un continente diante de certos fatos.
11'09"01, que vai estrear a 11 de setembro em vários países da Europa e será apresentado também no festival de cinema de Torontó (Canadá), até o momento não será distribuído nos Estados Unidos, onde três curtas foram considerados "profundamente antiamericanos" pelo jornal New York Post.
A renda do filme, segundo os produtores, será doada à associação de ajuda às vítimas das guerras e das minas antipessoas, Handicap International, prêmio Nobel da Paz em 1997.
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