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Mostra SP: Tom Tykwer recria o paraíso amoroso de Kieslowski

Sexta, 18 de outubro de 2002, 09h54

Aos 37 anos, Tom Tykwer é a prova viva de que há um novíssimo cinema alemão, com personalidade para encarar um passado em que despontaram nomes como Wim Wenders, Werner Herzog, Volker Schlondorff e Rainer Fassbinder - os quatro primeiros, aliás, ainda na ativa.

Com apenas cinco filmes a seu crédito, três deles já vistos no Brasil - Inverno Quente, Corra Lola Corra e A Princesa e o Guerreiro - o jovem Tykwer arriscou-se na tarefa de filmar pela primeira vez uma história que não havia escrito e, numa ousadia maior ainda, de um roteiro inédito deixado por um dos monstros sagrados do cinema moderno, o polonês Krzystof Kieslowski, morto em 1996.

O resultado está em Paraíso, que estréia nesta sexta-feira na 26a Mostra BR de Cinema, em São Paulo, depois de ter sido destaque também no Festival Rio BR no início do mês.

O franco e jovial cineasta não hesita em confessar que quase recusou o convite da Miramax para filmar Paraíso.

"Era muito perigoso. Se eu errasse a mão, teria arruinado um roteiro de Kieslowski, todos me odiariam para sempre. Depois, senti que não poderia de fato arruiná-lo, seguindo meus próprios termos. No final, sempre haverá pessoas que odiarão o que você faz, não importa o que seja", justificou ele em entrevista exclusiva à Reuters durante sua visita ao Rio BR.

O filme trata de uma insólita e delicada história de amor entre a professora de inglês Philippa (Cate Blanchett), assassina acidental de quatro pessoas num atentado equivocado, e o policial Filippo (Giovanni Ribisi), que se obstina por deixá-la escapar da justiça.

A boa receptividade do filme no Rio BR e a reação positiva do público em geral são fatores que alimentam a vontade de Tykwer de filmar.

E ele não é o tipo de cineasta que se coloca num pedestal acima do público. "Sou espectador também. Não me coloco separado da platéia, como diretor. Só continuo fazendo filmes porque, como espectador, ainda estou à procura de algo que ainda não vi", afirmou.

"Acho que a minha inspiração vem das deficiências que sinto como espectador. Como público, ainda sinto falta de filmes específicos, que ainda não foram produzidos. Então, tenho que produzi-los. Assim é que consigo fazê-los."

SIM A "PARAÍSO", NÃO X TRILOGIA

Essa aprovação dos espectadores, porém, não o leva a entusiasmar-se para assumir uma possível direção das duas outras partes desta trilogia, da qual fazem parte ainda Inferno e Purgatório.

Tykwer relata que existem uma primeira versão do script de Inferno e um esboço de Purgatório, mas que ele não pretende envolver-se em nenhum dos dois projetos caso sejam levados adiante pela Miramax.

"Não existe a menor possibilidade de isso acontecer", assegurou. O motivo reside nas enormes dificuldades que encontrou para produzir Paraíso.

"Equilibrar o filme, fazer a ambig idade e a ambivalência da história funcionarem e manter a fluidez, o rigor e a clareza que eu experimentei quando li o roteiro da primeira vez (foi complicado)", disse Tykwer. "Queria que o filme fosse tão fluido, tão rigoroso e tão claro quanto o roteiro e, ao mesmo tempo, complexo como quando eu li a história. E chegar aí foi realmente solitário."

Por isso, ele não pensa voltar a essa seara, mas insiste que, a seu ver, Inferno, já foi feito. Lembrando que esse capítulo da trilogia deveria, originalmente, ser filmado em Los Angeles, ele afirma: "'Cidade dos Sonhos', de David Lynch, é o filme que mostra Los Angeles como o inferno."

PASSAPORTE PARA HOLLYWOOD RECUSADO

Fazer Paraíso, seu primeiro filme em inglês, marcou também a abertura das portas de Hollywood ao diretor alemão. Ele admite estar recebendo diversos convites dos EUA para dirigir todo tipo de filmes, inclusive projetos que nada têm a ver com seu perfil profissional, como o gênero de ação.

"Os produtores norte-americanos identificam você como um talento em potencial e tentam engajá-lo em qualquer coisa, apenas para tê-lo a serviço deles", criticou.

Mas a meca do cinema não seduz este diretor, que pretende manter sua independência. "Não me sinto tentado a ir para lá e a filmar o que têm me oferecido. Seria apenas dinheiro. Não compreendo porque as pessoas precisam de milhões de dólares para viver. Não terão tempo de vida para gastar tudo isso!", alfinetou Tykwer.

Longe de Kieslowski e de Hollywood, tudo o que o diretor quer agora é descansar dos dois anos de árduo trabalho dedicado a Paraíso e pesquisar novos projetos, voltando a dedicar-se à sua produtora X Films, uma das mais ativas formadoras de novos talentos atualmente na Alemanha.

Em sete anos de existência, a empresa produziu 16 filmes - inclusive os quatro anteriores de Tykwer -, empregando hoje 50 pessoas e fazendo sua própria distribuição.

O segredo deste sucesso, para Tykwer, é simples. "Tudo se resume a produzir bons filmes, que sejam tão pessoais, ousados e complexos quanto possível sem perderem sua conexão com o público."

Para ver os outros horários de exibição deste filme, vá ao site da Mostra: https://www.mostra.org

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Reuters

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