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Fernanda Torres e Andrucha Wadington falam sobre o filme "Gêmeas"
A atriz Fernanda Torres e o diretor Andrucha Waddington, que também é seu marido, participaram de coletiva para divulgar o lançamento de "Gêmeas" em São Paulo.
Baseado num conto de Nelson Rodrigues, o filme narra a trajetória de Marilena e Iara (Fernanda Torres), irmãs gêmeas que vivem um conturbado e doentio relacionamento com apenas um homem: Osmar, interpretado por Evandro Mesquita.
Entre os diversos assuntos abordados, o casal falou sobre a dificuldade dos lançamentos de filmes nacionais, da atual polêmica sobre os casos (Guilherme Fontes e Norma Bengell) ligados ao Ministério da Cultura e, principalmente, sobre o universo do dramaturgo Nelson Rodrigues.
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Leia trechos da entrevista coletiva:
Por que Nelson Rodrigues?
Andrucha: A obra do Nelson é um grande canal para aprender a filmar. Ele é um autor que tem tudo, e praticamente empresta sua obra ao diretor. É bom poder se apoiar num dramaturgo tão fabuloso. Meu contato com o autor surgiu quando comecei a ler suas obras. No Nelson, você identifica sua cultura, seu universo de loucura dentro de casa, e não fora dele.
Que mudanças básicas ocorreram para levar o conto à tela?
Andrucha: O conto era bem curto. O que tentamos foi não alterar o universo do Nelson. Elena Soárez, a roteirista, foi absolutamente fiél. Quando se assiste, é visível a presença do Nelson.
Para Andrucha, um dos grandes personagens da trama é Dr. Jorge, o pai das gêmeas, interpretado por Francisco Cuoco. Segundo o diretor, ele é o único personagem sadio, o único que sabe exatamente o que se passa, tendo grande lucidez sobre a história.
Fernanda, você já alguma fantasia em ser gêmea?
Fernanda: Nunca tive. Já sou um clone da minha mãe! (risos)
Como é o trabalho
de criação das duas personagens?
Fernanda: Para fazer as duas, você tem que raciocinar diferente. Quando você pensa diferente e se põe na pele de outra pessoa, você muda sua voz, seu corpo, seu jeito, até sua personalidade.
No filme, no início, o público ainda fica tentando ditinguir quem é quem. A Iara é uma vadia, já a Marilena, é uma vadia mais séria... (risos). No meio da história, as coisas se fundem, você perde a noção de quem é boa e quem é má. As duas passam a ser capazes de tudo...
Quais foram os problemas enfretados ao filmar duas personagens com apenas uma atriz?
Fernanda: "Gêmeas" tinha um complicador de como ser coerente. Nós realizamos dois meses de ensaio para filmar em três semanas. A maior parte das cenas com as duas irmãs foram realmente marcadas durante o Mise-en-Scène. Foi durante os ensaios que realmente descobrimos a forma de filmar. As cenas saíam da própria mecânica do filme.
Andrucha: Cinema é isso, cinema é garimpo, tem que ser feito take a take.
Houve muitas trucagens (efeitos especiais)?
Andrucha: O filme era um filme de baixo orçamento (950 mil reais). Não havia dinheiro para "truca". Foi usado muito plano e contra-plano
Fernanda: Em uma cena usamos montagem e, as duas personagens juntas, soava falso. Às vezes, no cinema, o mais simples é mais fiél, mais ilusionista.
Como foi a busca deste ar
de suspense do filme?
Andrucha: Esse ambiente sombrio faz parte de uma tentativa de busca da própria gramática de suspense existente no universo do Nelson Rodrigues. O Nelson tem esse universo sombrio e sexual, mas no filme, ele está em sua forma mais imaginária. A sexualidade está dentro da cabeça dos personagens, e não explícita.
Como foi trabalhar com Francisco Cuoco?
Andrucha: Cuoco está no imaginário brasileiro como um galã. Foi ótimo vê-lo transformado num decadente lúcido.
Houve muita improvisação?
Fernanda: Não houve muito improviso. Nos ensaios havia vários, principalmente do Evandro, mas eles foram sendo inseridos diretamente no roteiro.
Por que você optou por um tempo curto (1h e 15min)?
Andrucha: O tempo tem que ser fiél à necessidade da história. O conto era bem curto. Quando fizemos a primeira montagem, ela tinha 1h e 25 min. Depois fomos enxugando.
Fernanda: Várias cenas foram criadas depois. Inicialmnte, filmamos duas semanas. Depois de oito meses fizemos as cenas adicionais, aproximando o filme ao conto.
Andrucha: Foi aí que entrou a presença da Fernanda Torres. Antes ela aparecia apenas na fotografia. Na segunda filmagem colocamos ela atuando.
Sobre o projeto do filme.
Andrucha: O conto "Gêmeas"
seria mais um dos curtas realizados para o "Traição" (primeiro longa da Conspiração Filmes). Inicialmente, os contos fariam parte de uma série para a TV. Mas o "Traição" virou filme. O projeto de "Gêmeas" foi modificado e veio minha primeira oportunidade de fazer um longa.
Sobre os lançamentos de filmes nacionais.
Para Andrucha,
quando um filme não tem estréia nacional é preferível controlar o lançamento e esperar mais possibilidade de salas. "É melhor lançar praça a praça para cativar o público."
Fernanda acha que atualmente o cinema deu uma galgada, mas o lançamento é o que menos se tem domínio, não se vê fórmulas de sucesso.
Para os dois, a meta é ultrapassar os 300 mil (bilheteria de filmes como "Tudo Sobre Minha Mãe" e outros europeus).
Sobre a polêmica envolvendo cineastas e o Ministério da Cultura.
O diretor prefere não se envolver nestas polêmicas. Segundo Andrucha, especular, analisar e apurar é função do Ministério, não dos cineastas. "Eu quero que "Chatô" fique pronto, que ele se saia muito bem e acabe com esta discussão."
Já Fernanda, arrisca opiniões. Para ela, o Ministério não deveria ter liberado uma
captação tão alta, para um cineasta iniciante. Quando o Ministério fez a liberação, era previsível que algum problema como este pudesse acontecer.
Segundo a atriz, esta lei deve ser ajustada, mas não anulada. Pois toda lei nova, no início, é permeada de problemas.
Redação Terra
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