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MAIS QUE O ACASO
De Don Ross
 
RAPIDINHO
Dois atores bem dirigidos, diálogos de boa qualidade, história romântica e nada eterna, mas convincente enquanto dura. Quem assiste a Mais que o acaso buscando apenas alguns momentos de diversão não sai decepcionado. Claro que poderia ser melhor ainda, se houvesse menos glamour e mais verossimilhança nas interpretações de Gwyneth Paltrow e Ben Affleck (ambos bonitos demais para encarnar seres solitários), mas aí já é pedir demais, mesmo para um estúdio "alternativo" como a Miramax. A partir de um argumento simples, mas sólido, Don Roos (do interessante O Oposto do Sexo) fez um filme que emociona sem insultar a inteligência de ninguém.

AGORA COM MAIS CALMA
Hollywood tem uma fórmula para retratar publicitários: são seres bem sucedidos, talentosos, mulherengos e afogados no próprio ego. A apresentação do personagem de Ben Affleck segue a fórmula religiosamente. Ele não pega o avião que cai porque acaba de conquistar uma linda loira no bar do aeroporto, depois de desfilar uma sucessão interminável (e insuportável, menos para lindas loiras) de frases espirituosas. A partir daí, assistimos à transformação – que não deixa de ser outra fórmula – de um publicitário idiota em um publicitário com crise de consciência. É difícil dizer qual destes tipos de publicitário é mais comum nos Estados Unidos. No Brasil, é claro, o tipo mais comum é o desempregado, mas estes não tem chance alguma com lindas loiras. Em compensação, não têm crises de consciência.

Na queda de Affleck, que dura um ano, ele abandona seu poço particular de vaidade e mergulha de cabeça num copo de uísque, com direito a escândalo numa festa de publicitários bem sucedidos. Neste momento, Affleck se esforça para parecer desesperado, mas suas limitações dramáticas são evidentes. O personagem, contudo, volta mais forte na aproximação a Gwyneth Paltrow. Mentir, fazer frases espirituosas e jogar charme são atividades que combinam mais com Affleck que cair bêbado no chão. No resto do filme, já um bom moço apaixonado, só nos resta esperar que o destino se cumpra e que ele, depois de purgar suas culpas, encontre a felicidade que todo publicitário arrependido merece.

Gwyneth Paltrow (obviamente, a razão de minha ida ao cinema, e podem me xingar à vontade) recupera-se do mico monumental que pagou em Vem cantar comigo. Em Mais que o acaso, Paltrow não alcança o brilho que já mostrou um outros filmes, mas tem bons momentos, principalmente na fase pobre viúva desamparada, quase sem maquiagem e com figurino nada sensual. Também é interessante o modo como ela aproveita as cenas em que dá em cima de Affleck, com nuances de uma mulher que deseja reconstruir sua vida sentimental, mas ainda carrega, muito intensamente, a lembrança do marido morto. O roteiro ajuda, ao determinar que ela também seja uma mentirosa, dizendo-se divorciada, em vez de viúva. Resta a Paltrow, no futuro, o desafio de encarar um papel mais exigente, que a separe, de uma vez por todas, da vala comum das estrelinhas açucaradas do bolo hollywoodiano.

A maior dificuldade de Mais que o acaso está em convencer o público de que a mentira de Affleck (não ter contado que procurou Paltrow por misericórdia, e não por obra do caso) será capaz de interromper MESMO aquele lindo romance. Don Ross se esforça. Prepara o terreno, na cena do primeiro encontro (a confusão com o cachorro), em que Affleck já é obrigado a mentir. Depois usa um artifício bacana, a fita de vídeo gravada no início da trama, para detonar o conflito. E, finalmente, constrói um diálogo entre Affleck e o filho mais velho de Paltrow, aquele sobre a árvore de Natal, que procura apresentar a tese da "mentira piedosa". Mais ou menos o que ACM está dizendo para se justificar: calei para impedir um mal maior. Como sempre, a qualidade de uma boa tese não depende somente do seu conteúdo, mas também das razões (quase sempre obscuras, mas de ordem prática) que justificaram sua existência teórica. ACM, pelo menos, tem carga dramática. Arruda não seria personagem nem de minissérie da Record.

O final de Mais que o acaso beira a infantilidade e quase bota tudo a perder. A cena do tribunal é lamentável, pelo seu esquematismo e previsibilidade. Os diálogos Affleck com seu ex-ajudante homossexual, contudo, ajudam a esquecer a bobagem anterior. E, quando Paltrow chega, mais linda que nunca, com aquela carinha de "eu te perdôo, neguinho", não tem neguinho no cinema que não se derreta e torça para que tudo dê certo. Eu, pelo menos, torci. Se fosse a Sandra Bullock (com todo o respeito pelos seus fãs), provavelmente eu estaria torcendo que ela quebrasse a perna. Romantismo tem limite.

Mais que o Acaso (EUA, 2000). De Don Roos

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