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RAPIDINHO: O título original de A razão do meu afeto é The object of my Affection. Há uma diferença importante entre fazer um filme sobre a "razão" de um sentimento e sobre o "objeto" desse sentimento. Principalmente se o sentimento é de uma garota tipicamente heterossexual que se apaixona por um garoto claramente homossexual. A obra do inglês Nicholas Hytner (que estreou com o divertido A locura do Rei George) é leve, descompromissada e de apelo popular, justamente porque não se propõe a analisar razão alguma, e sim a documentar "objetos", ou padrões de comportamento, da sociedade nova-iorquina. AGORA COM MAIS CALMA Você conhece alguma garota heterossexual que tenha se apaixonado DE VERDADE por um garoto homossexual? Eu não. Você conhece alguma garota heterossexual grávida que tenha convidado um garoto homossexual para atuar como PAI da criança? Eu não. E você conhece algum garoto homossexual que cogitaria em ACEITAR o convite? Eu não. Esse é o principal problema de A razão do meu afeto: convencer aos espectadores que aqueles personagens são de verdade. E aqui, mais uma vez, as limitações do cinema aparecem claramente. Não li o romance de Stephen McCauley, que serviu de base para o roteiro de Wendy Wasserstein, mas tenho certeza que, através da literatura, foi bem mais fácil explicar algumas coisas sobre o universo interior da garota heterossexual, quem sabe jogando algumas luzes sobre a sua infância, sobre os antigos namorados, sua relação com os pais, etc. Não estou dizendo que a garota é louca ou desajustada. Estou simplesmente procurando razões para o seu afeto (o que talvez seja pedir muito ao filme). Fico imaginando o que o diretor francês Eric Rohmer faria com uma história dessas. Seria, é claro, um outro filme. Mais lento, mais reflexivo, com menos personagens "engraçadinhos", com muito mais verdade. E, é claro, com muito menos público. Hollywood nem sabe quem é Rohmer. Portanto, o melhor é aceitar A razão do meu afeto de acordo com seu título original e procurar objetos bem iluminados, em vez de seres humanos conflituados. E aí Nicholas Hytner demonstra grande competência. O retrato da comunidade intelectual gay de NY é, ao mesmo tempo, realista, respeitoso, divertido e verossímil. O retrato da garota heterossexual está em foco e corretamente exposto. Só não tentem "ler" significados ocultos nesses retratos, porque nem Roland Barthes encontraria alguma coisa. A Razão do Meu Afeto (The Object of my Affection, EUA, 1998). De Nicholas Hytner. Com Jennifer Aniston, Paul Rudd e outros.
Carlos Gerbase é jornalista e trabalha na área audiovisual, como roteirista e diretor. Já escreveu duas novelas para o ZAZ (A gente ainda nem começou e Fausto) e atualmente prepara o seu terceiro longa-metragem para cinema, chamado "Tolerância".
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