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GHOST DOG
O que você acha que aconteceria se você misturasse, num mesmo filme, a máfia
italiana
em Nova York, um afro-americano que mora no telhado de seu prédio com os
pombos e
trabalha para a máfia, se comunica com o seu chefe através de um pombo-correio e segue
a filosofia dos samurais, ouve hip-hop e rap, só se comunica com uma criança
e seu
melhor amigo é um vendedor de sorvetes que só fala francês.
Mesmo falando
línguas
diferentes eles se comunicam perfeitamente bem, e tem uma cena engracadíssima
quando
os dois se encontram com um cara que só fala espanhol, e o mais
impressionante é que os
três se entendem. O cara que fala espanhol está construindo um barco no
telhado do seu
prédio.
É quase como se fosse uma mistura de Fitzcarraldo com o realismo
fantástico de
Julio Cortázar, onde as coisas mais absurdas co-existem de uma maneira tão
natural que
nós nos esquecemos de que elas são absurdas.
Pois este é mais um filme de Jim Jarmush, o diretor americano que nos
presenteou com
filmes inesquecíveis como, entre outros, Strangers than Paradise, Mystery
Train, Down
by Law, Dead Man.
Jarmush sempre buscou uma estética que une universos
completamente a parte em uma obra coesa. Em Strangers Than Paradise uma
húngara vem
para os Estados Unidos visitar o seu primo americano e ele e um amigo acabam
se
apaixonando por ela.
No final cada um vai para um lado. O mesmo se passa em
Down by
Law. Jarmush sabia do talento de Roberto Benigni antes dele despontar em
Holywood.
Mais uma vez um estrangeiro se encontra com dois Americanos, tem uma barreira
cultural
e linguística que deveria separá-los, mas o contrário acaba acontecendo.
Eles
fogem da
prisão juntos, e depois, como em Strangers than Paradise, cada um vai para o
seu lado.
Jarmush vê a cultura americana através do olhar do estrangeiro. E por assim
fazê-lo, acaba
revelando muito mais do que se simplesmente mostrasse um lado da moeda.
A
realidade se
revela através do contraste.
Eu não quero contar muito sobre a história de Ghost Dog, que é extremamente
criativa e
inteligente. Forest Whitaker segue a filosofia japonesa do Samurai que data
do século 18.
Segundo o código dos samurais cada ser humano deve seguir o seu mestre. Neste
caso e
Louie, um mafioso que salvou a vida de Ghost Dog no passado. Jarmush diz que
queria
criar um personagem que fosse contraditório, que matasse pessoas mas não fosse
necessariamente um assassino.
Ghost Dog é um personagem lírico, mas que mata;
que
segue a filosofia secular dos Samurais, mas que usa tecnologia de última
geração para
roubar carros e interceptar ligações telefônicas.
O filme é mais um testemunho da mente brilhante de Jarmush, onde as barreiras
culturais
são demolidas e co-existem pacificamente.
Ghost Dog, EUA/França (1999). De Jim Jarmusch. Com Forest Whitaker, John Tormey, Cliff
Gorman, Henry Silva, Isaach de Bankole,
Tricia Vessey, Victor Argo
Bárbara
Kruchin
é artista
plástica e aficcionada por cinema. Ela é brasileira, mas mora em
Nova York desde 1991, onde cursou a School of Visual Arts.
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