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Instituto de Beleza Vênus

De
Tonie Marshall






RAPIDINHO

Instituto de beleza Vênus seria uma obra-prima se, além de funcionar maravilhosamente como um espelho da solidão feminina, tentasse compreender com mais profundidade o discurso que coloca na tela. O filme cresce – e muito – quanto se afasta do cotidiano artificial do salão (sempre igual) e penetra em outros cenários, como o corredor da casa da protagonista (onde ela se lava, lembrando da infância), a casa do velhote sedutor (uma cena de poderoso e delicado erotismo), a estação de trens, os restaurantes, etc. Mas a diretora Tonie Marshall fez uma opção consciente, radical: mostrar, quase sempre, não a vida, mas o que a substitui artificialmente, a partir do instituto, e sempre voltando para o instituto.

AGORA COM MAIS CALMA
Temos, antes de mais nada, uma atriz extraordinária. Nathalie Baye dá uma aula de interpretação como uma mulher de 40 anos, solitária e com medo de amar, que não acredita mais em felicidade. E, de certa forma, ela tem toda razão. Ao ver no seu trabalho, todo o dia, tanta babaquice e tanta futilidade, geradas por mulheres de todas as idades, a impressão do mundo só pode ser a pior possível. Os diálogos de Instituto de beleza Vênus certamente devem muito à pesquisa "in loco" feita pela diretora Tonie Marshall. Mas, mesmo diálogos deliciosamente realistas podem ter um gosto de mentira na boca de más atrizes. Nathalie Baye transpira verdade, assim como todo o elenco, e isso é o motor do filme, sua alma, sua força dramática incontestável.

É interessante notar que não se trata de um salão tradicional de cabeleireiros, em que as fofocas são muito mais socializadas, em que as mulheres sabem das vidas umas das outras e podem se apoiar (ou se envenenar) mutuamente, como é a tradição brasileira. No Instituto de beleza Vênus, as ações acontecem em pequenas cabines sem janelas, e são relações quase sempre impessoais, inorgânicas, "à francesa". A juventude artificial almejada para a pele já está institucionalizada nas relações humanas. As discussões entre a patroa e as empregadas (inclusive quando uma delas pede demissão) são sempre civilizadas demais, educadas demais, artificiais demais.

Angèle, a personagem de Nathalie Baye, descobriu, há muito tempo, que o amor artificial é fácil de obter: basta parar por um tempo na estação de trens, ou sentar na mesa de um homem num restaurante. É como se, a cada amante, ela passasse uma camada de base sobre a pele de seu espírito, escondendo fugazmente suas rugas, suas dores, suas cicatrizes. Mas a base logo se deteriora, e a solidão volta com toda a força. Por isso, quando descobre que há um homem apaixonado por ela, Angèle tem medo. Não sabe como agir. A paixão não faz parte de seu mundo.

A bela cena em que Angèle e Antoine (o excelente Samuel Le Bihan) assistem à sedução de Marie pelo velho rico é um resumo de todo o filme. Escondida no jardim, Angèle assiste à derrocada final da inocência de sua jovem colega de trabalho, atraída por jóias e pelo dinheiro (ou seja, pela artificialidade material do mundo). E, em vez de indignação ou fúria, ela sente – finalmente - desejo pelo homem que a ama de verdade. Angèle, 40 anos, de repente percebe que Marie está cumprindo o seu destino, que provavelmente sofrerá por causa disso, mas que cabe a cada mulher e a cada homem sofrer ou gozar solitariamente do seu presente, do seu instante, aqui e agora. E, por isso, decide entregar-se novamente ao amor.

Não gosto do final. O suspense criado com a aparição da mulher de Antoine no instituto e na loja promete uma conclusão forte, à altura do realismo de todo o filme, mas é desperdiçado. Se a idéia era confrontar a esperança de felicidade de Angèle com a destruição da felicidade da esposa, então a cena deveria ter conseqüências mais pesadas, como a morte de Antoine. Em vez disso, Tonie Marshall optou por um "happy-end" tradicional, bastante insosso, talvez numa tentativa – frustrada - de transferir a artificialidade da beleza criada pelo instituto para o destino de Angèle (as faíscas que caem do luminoso são os signos dessa tentativa). É uma pena. Durante todo o tempo, Tonie flertou com a feminilidade madura e honesta de Anaïs Nin, para terminar seu filme com uma cena que lembra Madame Delly.

Instituto de Beleza Vênus (França, 1998). De Tonie Marshall

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Carlos Gerbase
é jornalista e trabalha na área audiovisual, como roteirista e diretor. Já escreveu duas novelas para a Terra Networks (A gente ainda nem começou e "Fausto"). Atualmente finaliza seu terceiro longa-metragem, Tolerância, com Maitê Proença e Roberto Bomtempo.

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