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Diretor de "O Sexto Sentido" repete fórmula em "corpofechado"



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É uma questão de lógica. Quem viu O Sexto Sentido vai querer estar numa das 300 salas que exibem, em circuito nacional a partir de hoje, corpofechado, o segundo filme de M. Night Shyamalan. Talvez não o número recorde de espectadores responsável pela bilheteria de mais de meio bilhão de dólares. Vem daí o primeiro obstáculo da fita, não exatamente inesperado. Difícil aguardar a repetição de um fenômeno como o que aconteceu ao diretor indiano radicado nos Estados Unidos em sua estréia, digamos, no grande circuito.

Antes, Shyamalan realizou dois longas-metragens desconhecidos na rota internacional. O Sexto Sentido também poderia ter ido pelo mesmo caminho, não fosse a presença de Bruce Willis, o protagonista renovado. O projeto foi um trabalho de formiguinha - do boca-a-boca ganhou o mundo. Não é o caso agora. A posição é confortável na vertente comercial, mas delicada na aposta de carreira.

Parece ironia falar em lógica quando se trata justamente de um dos únicos nomes a enforcar o sobrenatural no cinema atual como assunto sério, sem carregar na ficção científica ou se basear no terror assumido. Shyamalan, ao que se confirma em seu novo filme, é antes de tudo um realizador esperto e malicioso. Em O Sexto Sentido, a combinação de suspense psicológico e minimalismo que anda fora de moda em Hollywood recobria sua preciosa fórmula. Toda a provável balela de enxergar mortos e com eles manter um diálogo era disfarçada pelos olhos de um menino, a criança que para o imaginário representa a inocência e o direito de sonhar. Quem esperava por sustos, encontrou a reviravolta final, mais uma vez a desafiar a lógica. Ficava a sugestão de uma 'força maior', mas de alguma forma justificada.

É sem dúvida um talento de Shyamalan, o criador de suas próprias histórias fantásticas. Ao se imaginar num terreno seguro e real, o espectador espera com ansiedade o momento do toque sobrenatural, num caminho paralelo aos thrillers convencionais. A regra se repete em corpofechado, com pontos dramáticos semelhantes ao filme anterior. O protagonista, de um certo modo, é a criança crescida que não se deu o direito à imaginação. Vai descobri-la tarde, quando adulto racional e insensível consigo mesmo. Em suma, um homem ordinário.

O diretor faz questão de frisar isso desde o início. David, o personagem de Willis, está viajando no trem quando se senta ao seu lado uma bela jovem. Ele tira sua aliança e engata um papo típico de paquera, logo frustrado. Mais tarde, se saberá que ele está numa crise conjugal. O diálogo também servirá para uma das coincidências que no entender de Shyamalan enriquecem a trama. Mas o que importa vem logo a seguir e dá partida à história. O trem descarrila e todos os passageiros, exceto David, morrem.


O fato inusitado chama a atenção de um colecionador de histórias em quadrinhos. Elijah (Samuel L. Jackson) tem seu drama contado em paralelo. Nasceu com uma deficiência nos ossos, fracos e que facilmente se quebram, o que lhe acontece com freqüência. Acredita que sua fraqueza tem um contrário, a imunidade a acidentes e por conseqüência à morte. Enxerga o dom em David. É o primeiro passo para mexer com a imaginação do ex-jogador de futebol que se tornou segurança. David reflete, descobre que nunca ficou doente na vida ou se machucou num acidente. A ilusão está plantada.

Se no filme anterior o universo infantil aceitava tudo, aqui o diretor aposta numa fronteira perigosa e desfavorável. Adepto e conhecedor do mundo fictício das HQs, o colecionador convoca o público a comungar com ele dessa obsessão que põe em igual posição as figuras dos heróis das revistas e o de carne e osso representado por David. É essa imagem que seu filho passa a fazer dele, ao saber da possível vocação do pai para duro-de-matar. Outra jogada esperta do realizador: todo filho busca tal qualidade no pai, e o adolescente do filme leva o seu à literalidade. Mas, também como em 'O Sexto Sentido', o vigor desta fórmula se desgasta e mostra sua fragilidade no brilho sobrenatural - as mensagens recebidas dos mortos antes, a possibilidade de reconhecer almas más agora.

Shyamalan repete assim os mesmos defeitos em seus dois maiores trabalhos - não tão evidentes como o bem arquitetado roteiro quando o pé está no chão, mas ainda sim passíveis de questionamento. Mais uma vez, não é lógica e sim uma espécie de credo que ele espera do espectador. Ou se bebe de sua fantasia, ou se fica fora do círculo de iniciados. Talvez por isso a mesma pressa em desvendar o mistério e atingir o clímax nas duas histórias, aproveitando um certo atordoamento benéfico ao impacto final. É bom se perguntar se os filmes de Shyamalan resistem a uma segunda chance. Quem responder sim está aceito em seu séquito. Por enquanto, ainda está duro de acreditar em Shyamalan.

Gazeta Mercantil


   
 


corpofechado

Título Original: Unbreakable
País de Origem: EUA
Ano: 2000
Duração: 106 min
Diretor: M. Night Shyamalan
Elenco: Bruce Willis, Samuel L. Jackson, Robin Wright Penn









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