Bloqueios de rodovias causam falta de produtos e trânsito em SP
Moradores reclamam problemas com ação de bolsonaristas nas estradas; governador anunciou multa e uso de força para desbloquear as vias
Os bloqueios de manifestantes bolsonaristas em estradas e ruas da Grande São Paulo têm causado trânsito, aumento de preços em aplicativos de transporte e falta de produtos em supermercados, segundo moradores de bairros periféricos.
Na zona sul de São Paulo, a aposentada Maria Silva, 67, não conseguiu comprar os legumes no mercado do bairro na manhã desta terça-feira (01). "Não tinha nada, não chegou mercadoria. O gerente do mercado falou que é porque os caminhões não conseguiram chegar com mercadoria por causa do bloqueio", contou ela, que mora no Jardim Ângela.
"De sacolão não tinha nada", completa a aposentada. Entre os alimentos em falta, segundo ela, estão alface, brócolis, repolho e couve. Desde esta segunda-feira (31), manifestantes que não aceitaram a vitória de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) bloqueiam a Marginal Tietê, uma das principais vias da capital paulista.
A APAS (Associação Paulista dos Supermercados) afirmou que "pontualmente, alguns supermercados de algumas regiões do Estado passaram a relatar a falta de alguns itens dos setores das frutas, legumes, verduras e açougue."
Na segunda-feira (31), a associação indicou que os mercados antecipassem a logística de suas lojas e centros de distribuição. A entidade afirmou ainda que não é necessária a mudança do comportamento de compra dos consumidores e que segue trabalhando em apoio ao Governo do Estado de São Paulo.
Em Osasco, o reflexo da paralisação na Rodovia Castello Branco atingiu o bairro Munhoz Júnior, na zona norte da cidade, que passou toda a manhã com filas de carros nas ruas.
O motorista de aplicativo Cristiano Silva, 43, conta que uma passageira chegou a descer do carro depois que eles ficaram travados em uma rua do município. Ele explica que as corridas estão com preço dinâmico na região por causa dos bloqueios. "Corrida de um quilômetro as pessoas estão pagando R$ 16, R$ 17", afirma.
O bloqueio na Castello Branco também atrapalha a chegada de trabalhadores que vêm de São Paulo e Osasco para Barueri.
Ao meio-dia, a tropa de choque da Polícia Militar chegou à Castello Branco para liberar a via. Parte dos manifestantes que interditaram o local saíram com a chegada dos policiais, que usaram bombas de efeito moral contra o grupo.
A reportagem da Agência Mural encontrou filas em postos de gasolina de Barueri, um possível reflexo do medo de desabastecimento de combustível na cidade.
Em Mogi das Cruzes, o coordenador de um restaurante Lucas Duarte, 22, conta que ficou duas horas preso no trânsito para chegar ao trabalho. Ele mora em Suzano, cidade vizinha, e costuma levar meia hora no trajeto durante a semana.
"Nunca tinha visto isso", comenta o coordenador, citando que os manifestantes colocaram fogo em galhos e que a polícia não interveio na manifestação.
Entre segunda-feira (31) e esta terça-feira (1º) também foram registradas interdições em Embu das Artes, Poá, Cotia e Guarulhos.
Em Cotia, a cuidadora de idosos Jessica Eduarda de Souza Gomes, 32, disse que o filho perdeu uma consulta importante no Hospital de Campinas por causa dos atos. O adolescente, de 16 anos, tem a fenda palatina aberta, quando o céu da boca não fecha corretamente.
"Se eu perco um dia da consulta, ele volta pro final da fila. Só vou conseguir marcar consulta pra ele agora no ano que vem porque lá é muito difícil de conseguir vaga"
Jessica Eduarda, moradora de Cotia
Por causa dos bloqueios, o Aeroporto Internacional de Guarulhos teve voos cancelados e atrasados. A GRU Airport, que administra o espaço, orientou que os passageiros verifiquem a situação de seus voos com as companhias aéreas.
No caso de Embu das Artes, o bloqueio na Rodovia Régis Bittencourt chega a atrapalhar inclusive quem precisa transitar dentro da própria cidade. O técnico em eletrônica Francisco Lara Campos, 62, gasta normalmente entre 15 e 20 minutos para chegar ao trabalho. Ontem, de carro, foi necessário mais de uma hora, mesmo tentando evitar a rodovia.
"Isso porque eu conheço muito bem a região e desviei dos pontos mais congestionados", conta o morador. Para a manhã de hoje, ele optou por ir ao trabalho de moto, mas sem muito ganho de tempo.
"Levei 40 minutos para fazer um caminho de 10 km. Já já começa a faltar alimentos, combustível e as coisas vão ficar mais caras, afinal quem paga a conta sempre somos nós", conta Francisco, criticando a manifestação.
Respeito ao resultado
Na manhã de hoje, o governador Rodrigo Garcia (PSDB) anunciou que instaurou um gabinete de crise para negociar a liberação das vias. Garcia disse que se for necessário as forças policiais do estado vão usar a força para desbloquear as estradas. Em coletiva de imprensa, o governador disse que o resultado das urnas deve ser respeitado.
"São Paulo respeita a democracia, o estado democrático de direito, e não vai ser manifestação ou baderna que vai fazer com que a sociedade não reconheça os resultados da urna. Aos vencedores, o mandato, e aos perdedores, o reconhecimento da derrota. É isso que determina a nossa Constituição e é isso que São Paulo vai preservar", destacou.
O governador anunciou que carros que não saírem das vias vão ser multados em R$ 100 mil por hora. A fala segue a determinação do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), que indicou que as polícias militares dos estados atuem para desobstruir as rodovias - inclusive vias federais
Na decisão, o ministro afirmou que a medida tem o objetivo de garantir o "resguardo da ordem no entorno e, principalmente, à segurança dos pedestres, motoristas, passageiros e dos próprios participantes do movimento ilegal que porventura venham a se posicionar em locais inapropriados nas rodovias do país".