Brasileiro percorre Japão fotografando festivais inusitados
Em janeiro deste ano, com temperaturas que não chegam na casa dos 10ºC, o fotógrafo e documentarista Roberto Maxwell, 40, encarou as águas congelantes do mar do Japão para garantir fotos e imagens em vídeo de um festival muito diferente na cidade de Fujisawa, província de Kanagawa, a cerca de meia hora da capital japonesa.
Nesta cerimônia, jovens seminus que completam 20 anos carregam o "mikoshi", uma espécie de templo portátil muito pesado, para dentro do mar.
"É um ritual antigo que marca a passagem para a vida adulta", conta Maxwell. Ele diz que passou tanto frio que não conseguia mais sentir as pernas.
Em outra ocasião, foi o calor extremo que o brasileiro enfrentou. No chamado Hiwatari Matsuri – algo como "festival de andar sobre o fogo", numa tradução livre –, Maxwell encarou o calor fumegante de uma grande fogueira e ainda caminhou sobre brasas.
Para obter boas imagens, o brasileiro faz questão de estar bem perto de toda a movimentação. "Fotos tiradas de fora ou de longe raramente transmitem o que o festival realmente significa", afirma.
Outro olhar
Há cerca de dois anos, Maxwell começou a percorrer o Japão em busca de festivais diferentes, inusitados e até bizarros. "Antes, fotografava apenas por lazer. Mas percebi que esses festivais mereciam um olhar mais detalhado", conta.
As andanças já renderam uma exposição na capital japonesa e, recentemente, o brasileiro foi foco de uma reportagem de uma tevê japonesa, que o rotulou de "otaku" (pessoas com interesse obsessivo por algo) de festivais.
O primeiro evento que Maxwell registrou foi o Sanja Matsuri, um festival milenar que é realizado todos os anos em Asakusa, na capital japonesa. "Quando vi pela primeira vez fiquei extasiado, pois o Japão é um país ordenado, mas os festivais são o oposto", analisa.
O Sanja Matsuri é um dos mais famosos eventos do Japão. Atrai uma multidão de cerca de 2 milhões de pessoas em três dias de evento, no final de maio. É também conhecido por ser uma rara oportunidade de ver os famosos mafiosos da Yakuza desfilando seminus, com suas tatuagens que encobrem o corpo todo.
Outro festival que impressionou o brasileiro foi o Nebuta Matsuri, na província de Aomori. "Lanternas gigantes com desenhos de personagens de lendas chinesas desfilam pelas ruas à noite", detalha.
História
Os festivais, conta Maxwell, são realizados antes de mais nada para reunir a comunidade. "Hoje, as pessoas só veem a parte dos desfiles dos templos portáteis (mikoshi) no ponto alto do evento, mas a festa começa bem antes, quando os vizinhos se reúnem para carregá-los pelo bairro", fala.
Cada "mikoshi" sai de seu bairro e vai até os templos principais. Neste trajeto, eles são agitados freneticamente por aqueles que o carregam. "O mikoshi seria, na verdade, uma liteira dos deuses e entidades, que são levados para passear e abençoar o bairro. Por isso o ritmo e agitação, para que esses deuses fiquem acordados", explica.
"Os festivais japoneses de fundo religioso são uma demonstração da fé e da coesão comunitária", completa.
A maioria das fotos de Maxwell são em preto e branco. "As festas são muito coloridas e eu quis destacar a dramaticidade dos festivais e expressões faciais dos japoneses", justifica.
Corpo masculino
Um dos pontos que chama a atenção dos estrangeiros que assistem a estes festivais japoneses é a exposição do corpo masculino. Os homens ficam praticamente nus. Usam apenas o fundoshi, que era uma espécie de roupa íntima de antigamente.
"Mas a relação dos japoneses com o corpo é muito diferente da nossa cultura. Eles sabem separar o corpo do momento sexual e do social", diz Maxwell.
"No Brasil, a gente lida bem com a nudez feminina, mas não muito com a masculina."
E, segundo ele, é justamente isso que acaba chocando e rotulando os festivais japoneses de bizarros ou esquisitos.
Um exemplo é o Kanamara Matsuri, popularmente conhecido como Festival da Fertilidade, no qual o símbolo é um enorme pênis, que é carregado pelas ruas.
Neste festival, a forma do órgão sexual masculino está por todos os lados, em lembrancinhas, doces, esculturas etc. "Nós, ocidentais, não temos condições de entender o significado daquilo, a forma lúdica como uma pessoa chupa um pirulito em forma de pênis", diz.
Por isto, o brasileiro evita expor detalhes como este em seus trabalhos. "Os festivais são públicos, mas é também um momento privado e, às vezes, sinto que estou invadindo a privacidade dos japoneses", conta.