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Damares quer censurar Netflix por 'Lindinhas'

Premiado no Festival de Sundance e lançado sem provocar polêmicas na França em agosto, o filme da Netflix é acusado de sexualizar meninas

15 set 2020 - 14h50
(atualizado às 15h23)
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A ministra Damares Alves, da pasta da Mulher, Família e Direitos Humanos, resolveu emular a direita americana e fazer pressão pela censura do filme Lindinhas (Mignonnes) no Brasil. Premiado no Festival de Sundance e lançado sem provocar polêmicas na França em agosto, o filme da Netflix é acusado de sexualizar meninas.

Damares quer censurar Netflix por Lindinhas
Damares quer censurar Netflix por Lindinhas
Foto: Divulgação/Netflix / Pipoca Moderna

O ataque foi estimulado por um pôster equivocado da própria Netflix, que apresentava as meninas em trajes colantes, tentando fazer poses sensuais. A imagem, por sinal, é exatamente o que o filme critica. No momento em que ela aparece no contexto do filme, as meninas são vaiadas por mães que se horrorizam com a performance sexualizada delas num concurso de danças. Isto serve de despertar para a protagonista, uma pré-adolescente que até então confundia sexualização com rebelião diante da cultura de submissão feminina de sua família religiosa.

A campanha contra a obra, que inclui pedidos de boicote contra Netflix, é feita principalmente por quem não viu o filme e defende que ninguém veja.

"Estou brava, Brasil! Estou muito brava! É abominável uma produção como a deste filme. Meninas em posições eróticas e com roupas de dançarinas adultas", escreveu Damares nas redes sociais. "Quero deixar claro que não faremos concessões a nada que erotize ou normalize a pedofilia! Quero aproveitar e dar um recado aos pedófilos que por anos têm vindo ao Brasil abusar de nossas crianças: no Brasil existe um governo que se importa de verdade em proteger as crianças e as famílias."

Respondendo a um usuário que perguntou o que ela faria sobre o filme, a ministra afirmou: "Não vamos ficar de braços cruzados. Deixa comigo".

Trata-se, claro, de braveza seletiva. Na semana passada, o presidente Jair Bolsonaro levou uma youtuber mirim de 10 anos para sua live e se aproveitou da inocência da criança para fazer uma piada de cunho sexual, quando ela lhe contou que "começou cedo". "Começou cedo? Como é que é?", perguntou Bolsonaro para a menor, rindo. A ministra, pelo que sabe, não ficou brava.

Não há lembranças tampouco de protestos contra a apologia insistente de Bolsonaro da exploração do trabalho de menor, proibido pelo Estatuto da Criança e do Adolescente. Nem que Damares tenha descruzado os braços para "proteger as crianças e as famílias" de um vídeo verdadeiramente pornográfico disponibilizado na internet logo que assumiu seu cargo: o infame compartilhamento de golden shower por Bolsonaro.

Damares, na verdade, imita iniciativa dos senadores americanos Ted Cruz, do Texas, e Tom Cotton, de Arkansas, ambos do Partido Republicano (o mesmo do presidente Trump), que na semana passada pediram ao Departamento de Justiça dos Estados Unidos que investigasse a produção e distribuição do filme. Em carta ao procurador-geral William Barr, Cruz chegou a chamar Lindinhas de "pornografia infantil".

A Netflix, por sua vez, disse em um comunicado que o filme faz de um "comentário social contra a sexualização de crianças pequenas".

Em Lindinhas, as crianças usam tops curtos e saltos altos, falam sobre Kim Kardashian, indicam dietas, dançam "twerking" e buscam na internet vídeos e assuntos relacionados ao sexo que elas não entendem.

Segundo a cineasta Maïmouna Doucouré, que venceu o troféu de Melhor Direção no Festival de Sundance, esses detalhes retratam um pouco sua própria infância, como uma mulher negra de família senegalesa que cresceu na França, mas também a constatação de que crianças estão dançando "como costumamos ver em videoclipes" e imitando o comportamento adulto.

"Nossas meninas notam que, quanto mais uma mulher é excessivamente sexualizada nas redes sociais, mais ela tem sucesso. As crianças apenas imitam o que veem, tentando alcançar o mesmo resultado sem entender o significado", disse Doucouré em um vídeo disponibilizado pela Netflix. "É perigoso", ela acrescentou, dizendo que o filme era sua tentativa de chamar atenção para o problema.

Veja a íntegra da entrevista da cineasta abaixo.

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