Do balé à novela de Manoel Carlos: conheça Ana Botafogo
A bailarina mais famosa do País relembra sua história e momentos de destaque em 38 anos de atuação profissional
Aos 57 anos, dos quais 38 anos são dedicados integralmente a sua carreira, Ana Botafogo expande cada vez mais sua atuação no mundo da dança além dos palcos.
Madrinha do programa de patrocínios de O Boticário, ela acompanhou na semana passada a programação em São Paulo e no Rio do Festival O Boticário na Dança. E prepara-se para estrear um novo espetáculo na companhia da cantora maranhense Flávia Bittencourt.
Carioca da gema, ela começou a dançar aos seis anos. Mas, sua vida profissional foi iniciada na Europa, especialmente a partir da contratação pelo Balé de Marselha, à época, comandado pelo memorável Roland Petit. Ana também frequentou a Academia Goubé, na Sala Pleyel, em Paris, e a Academia Internacional de Dança Rosella Hightower, em Cannes, ambas na França. E também o Dance Center-Covent Garden, em Londres.
Depois da temporada europeia, Ana Botafogo regressou a sua terra natal para viver uma saga até tornar-se a Bailarina (com b maiúsculo mesmo) mais conhecida do Brasil, tendo ainda ocupado a posição de primeira bailarina do Theatro Municipal do Rio de Janeiro (TMRJ). Ela contou tudo em entrevista exclusiva ao Terra.
Terra – Como tudo começou?
Ana Botafogo - Aos seis anos, o balé era uma brincadeirinha perto da minha casa. Aos onze, entrei na Academia de Ballet Leda Iuqui, que era bailarina do TMRJ, na qual permaneci por toda minha adolescência.
Terra – E depois?
Ana Botafogo – Viajei para fazer um curso na França. Lá consegui meu primeiro contrato pelo Balé de Marselha e trabalhei com Roland Petit. Portanto, comecei minha vida profissional na Europa.
Terra – Já em solo brasileiro, como deu continuidade a sua carreira?
Ana Botafogo – Quando voltei, no final da década de 1970, o TMRJ estava fechado. Então, consegui um emprego no Balé do Teatro Guaíra, em Curitiba. Dancei pela Associação de Ballet do Rio de Janeiro. Só depois dos 20 anos, em 1981, entrei para o corpo de baile do TMRJ.
Terra – Qual a diferença entre dançar naqueles tempos e hoje?
Ana Botafogo – A diferença era a quantidade de espetáculos que se dançava. Na companhia da Europa, me apresentei muito e viajei muito. Nossa agenda era muito grande. O balé do TMRJ dançava pouco, porque o teatro sempre fechava para reformas.
Terra – Como foi participar da novela “Páginas da Vida”, que foi ao ar pela Rede Globo em 2006?
Ana Botafogo – Um convite inusitado e inesperado. Adorei. Pude mostrar o que era uma aula, já que minha personagem era uma professora de dança. A televisão exige coisas diferentes do que eu estava acostumada nos palcos. Falar sobre dança durante dez meses para este País todo foi um grande presente que recebi do autor Manoel Carlos.
Terra – Então, você tinha – e tem – muito o que falar.
Ana Botafogo – Sim. Já são 50 anos mergulhada na dança. E digo que é possível viver de dança no Brasil. Não é fácil. É preciso ter dedicação total. Jamais imaginei ter uma carreira tão longa. Aos muito jovens, gostaria de dizer para terem foco e disciplina.
Terra – Quais os pontos altos de sua carreira?
Ana Botafogo – Minha estreia no TMRJ, com a peça Copélia, que foi importante para mim, pois dancei muitas vezes e recebi muitos convites pela elogiada montagem assinada pelo coreógrafo Henrique Martínez e que contava com a atuação do bailarino Fernando Burroni. Das minhas produções, têm vários destaques, mas escolho “Os 3 Momentos do Amor”, com elenco de seis músicos e dois bailarinos. Viajamos muito com este espetáculo que tinha a minha cara.
Terra – Você já dançou cerca de 130 espetáculos em 38 anos de carreira. Tem algo que queria ter dançado e não dançou?
Ana Botafogo – Não. Teve um período em que fui fazendo todos os espetáculo que eu queria muito. Na comemoração dos meus 35 anos, dancei “Eugene Onegin”, para a minha realização.
Terra – Nenhum clássico famosão preferido?
Ana Botafogo – Destacaria todos. Gosto dos balés com história de começo, meio e fim. É quando a bailarina pode desempenhar sua real finalidade, que é criar personagens. Balé não é só técnica.
Terra – Você não para. Continua dançando?
Ana Botafogo – Sim. E, mesmo quando não estiver nos palcos, quero continuar trabalhando pela dança. Em julho, estreio o espetáculo “Mulher”, ao lado da cantora Flávia Bittencourt, de São Luís. Fazemos uma homenagem a importantes mulheres do nosso cenário cultural. Já nos apresentamos apenas uma vez, mas aí paramos porque ela teve bebê. Estamos fechando as datas em São Paulo e no Rio.
Terra – Você é madrinha do programa de patrocínios O Boticário na Dança. Como encara essa função?
Ana Botafogo – O programa OBND dá visibilidade a muitos projetos e, agora, esperamos que isto atraia outras empresas para que, juntas ao Grupo Boticário, façam nossa cena da dança crescer. Assim, evitamos perder tantos jovens talentos para outros mercados no exterior.
Terra – Que avaliação você faz do atual panorama da dança no País?
Ana Botafogo – Nossos profissionais são o que temos de melhor. Há excelentes professores e preparadores de bailarinos. Mas, o campo de trabalho é muito pequeno, sobretudo para os bailarinos clássicos. Os contemporâneos encontram mais espaço. Perdemos muitos profissionais para o exterior, às vezes até para companhias pequenas. Mas, compreendo porque no começo de carreira o bailarino precisa ‘se fazer’ logo.
Terra – O que a Bailarina do Brasil pensa sobre dança?
Ana Botafogo – Dança é transmitir as emoções através de personagens. Para mim, seu significado total é vida. A dança me deu força, alegria e também meu deu ‘muito trabalho’ [risos]. Sempre tive muitos desafios. E são os desafios que fazem a vida ser mais emocionante.