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J-Pop: o escândalo de abusos sexuais que derrubou chefe de agência de talentos no Japão

Johnny Kitagawa era uma figura poderosa no pop japonês que usou sua imensa influência para abusar sexualmente de aspirantes a ídolos no país; agora empresa reconhece seus crimes

7 set 2023 - 21h10
(atualizado em 8/9/2023 às 10h12)
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Johnny Kitagawa (no centro) era um titã do J-pop que usou seu imenso poder para abusar sexualmente de aspirantes a ídolos no país
Johnny Kitagawa (no centro) era um titã do J-pop que usou seu imenso poder para abusar sexualmente de aspirantes a ídolos no país
Foto: Getty Images / BBC News Brasil

A chefe da maior agência de talentos da música pop do Japão pediu demissão depois de finalmente reconhecer os abusos sexuais cometidos pelo seu falecido fundador, Johnny Kitagawa.

Julie Fujishima renunciou da Johnny and Associates na quinta-feira (06/7), em meio a um pedido público de desculpas às vítimas de seu tio.

A saída acontece uma semana depois de uma investigação descobrir que Kitagawa abusou de centenas de meninos e homens jovens ao longo de seis décadas, como chefe da agência que gerencia boybands.

Um documentário da BBC sobre o abuso fez com que mais vítimas se apresentassem.

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Johnny Kitagawa morreu em 2019, sempre negando qualquer irregularidade. Ele nunca enfrentou acusações legais.

Na quinta-feira, sua sobrinha e então presidente-executiva, Fujishima, reconheceu os abusos pela primeira vez.

"Tanto a agência quanto eu, como pessoa, reconhecemos que ocorreram abusos sexuais por parte de Johnny Kitagawa", disse ela.

"Peço desculpas às suas vítimas do fundo do meu coração."

A imprensa local mostrou algumas das vítimas assistindo à entrevista coletiva, algumas parecendo visivelmente irritadas.

O escândalo tem paralelos, em escala e impacto na indústria, ao do magnata de Hollywood Harvey Weinstein, que foi condenado por violação e agressão sexual.

Kitagawa foi indiscutivelmente a figura mais influente e poderosa na indústria do entretenimento japonesa. Sua agência foi a porta de entrada para o estrelato para muitos jovens ao longo dos anos.

Várias vítimas disseram ao documentário da BBC Predator: The Secret Scandal of J-Pop ("Predador: O Escândalo Secreto do J-Pop") que achavam que suas carreiras seriam prejudicadas se não cumprissem as exigências sexuais de Kitagawa.

Nenhuma ação tomada

Julie Fujishima (à direita) renunciou, apontando Noriyuki Higashiyama (esquerda) como o novo chefe da agência de talentos
Julie Fujishima (à direita) renunciou, apontando Noriyuki Higashiyama (esquerda) como o novo chefe da agência de talentos
Foto: Reuters / BBC News Brasil

Rumores e algumas reportagens sobre os abusos circulavam há anos, mas nenhuma ação concreta foi tomada.

O magnata pop nunca enfrentou processos criminais e continuou recrutando e treinando adolescentes até sua morte, há quatro anos, aos 87 anos.

Sua morte foi um acontecimento nacional e até o premiê japonês na época enviou condolências.

Embora algumas das alegações tenham sido provadas num tribunal civil quando ele estava vivo, Kitagawa processou acusadores por difamação com sucesso em pelo menos uma ocasião.

A maior parte da grande imprensa japonesa também não noticiou as alegações durante décadas, o que gerou acusações de encobrimento da indústria.

Em março, a investigação da BBC detalhando os abusos de Kitagawa foi ao ar, gerando discussões em todo o Japão e dando início a uma investigação completa.

Milhares de fãs de J-pop também assinaram uma petição pressionando por uma investigação sobre a agência.

O documentário detalhou alegações de vítimas que trabalharam para a agência exclusivamente masculina quando eram adolescentes.

As falas mostram um padrão de exploração, com abusos ocorrerendo em casas luxuosas de Kitagawa e muitas vezes testemunhados por outros rapazes.

A cobertura da BBC levou mais vítimas a se manifestarem, incluindo o ex-astro nipo-brasileiro Kauan Okamoto, que disse ter sido abusado por Kitagawa durante quatro anos, desde os 15 anos de idade.

A pressão pública levou a agência a lançar a sua própria investigação independente.

O painel, composto pelo ex-procurador-geral do Japão, Makoto Hayashi, um psiquiatra e um psicólogo clínico, entrevistou 41 pessoas, incluindo 23 vítimas, bem como a ex-chefe Fujishima.

No relatório final divulgado na semana passada, descobriram que Kitagawa começou a abusar sexualmente de rapazes na década de 1950, passando pela década de 1960, quando a Johnny and Associates foi criada, até a década de 2010.

Descobriram também que a gestão familiar da agência permitiu que o abuso persistisse durante décadas. Os investigadores disseram que Fujishima — uma executiva de longa data na empresa — não tomou provdências sobre as acusações, apesar de saber que elas existiam.

Fujishima inicialmente foi contra uma investigação independente. Em maio, ela pediu desculpas às vítimas, mas não chegou a dizer que as alegações individuais eram verdadeiras e alegou não ter conhecimento das ações de seu tio na época.

Na quinta-feira, ela nomeou como seu sucessor Noriyuki Higashiyama, um nome familiar da televisão no Japão. O homem de 56 anos também foi um dos primeiros talentos recrutados pela Johnny and Associates.

Higashiyama disse que nunca foi vítima dos abusos de Kitagawa, mas estava ciente dos rumores.

"Eu não pude e não fiz nada a respeito", disse ele em entrevista coletiva.

Ele também reconheceu os apelos públicos para que o nome da agência fosse alterado — mas disse que nenhuma ação imediata seria tomada.

A empresa falou sobre mudanças estruturais durante a entrevista coletiva, mas não está claro como seriam essas mudanças e como os talentos da agência seriam geridos e protegidos.

Há também questões sobre o futuro da Johnny and Associates como uma marca sinônimo de fama e glamour, e que agora foi exposta de maneira negativa.

Com reportagem adicional de Kelly Ng e Frances Mao

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