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Há 50 anos, 'black power' tomava pódio olímpico no México

Iniciativa de dois atletas afro-americanos, de levantar o punho no pódio, redefiniu conceito de ativismo no esporte

16 out 2018 - 05h11
(atualizado às 09h42)
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Cinquenta anos depois de levantar o punho em sinal de protesto na Olimpíada do México-1968, os ecos desencadeados por John Carlos e Tommie Smith seguem ressoando com força no mundo do esporte atual. A imagem dos atletas afro-americanos no pódio, dia 16 de outubro de 1968, com a cabeça abaixada e o punho cerrado e erguido se tornou uma das imagens mais icônicas do século 20.

O protesto redefiniu o conceito de ativismo no esporte, misturando-se com um antiquado movimento olímpico liderado pelo presidente Avery Brundage e os movimentos políticos e culturais ao redor do mundo naquele ano.

Os Estados Unidos já tinham vivido uma comoção por conta dos assassinatos de Martin Luther King e do candidato à presidência Robert F. Kennedy. Entre os dois casos, sangrentas manifestações foram realizadas em Chicago. Grandes protestos contra a Guerra do Vietnã ganharam protagonismo no mesmo ano em que a França, liderada por estudantes, via iniciar uma grande defesa dos direitos civis.

Durante a Olimpíada, o clima político ao redor do mundo chegou à Cidade do México. Dias antes do início das competições, forças governamentais do país encararam as manifestações deixando entre 300 e 500 mortos, milhares de feridos e 2 mil presos, segundo informações independentes.

O ex-corredor Tommie Smith, em 2018
O ex-corredor Tommie Smith, em 2018
Foto: Emma Thomasson / Reuters

Sob essa sangrenta repressão, os atletas iniciaram a disputa por medalhas em uma Olimpíada que entraria para a história pelo "Black Power'', ilustrado pelo gesto de Smith e Carlos.

Durante a manhã de 16 de outubro, Smith venceu os 200 metros livres estabelecendo então um novo recorde mundial (19,83 segundos), com Carlos conquistando o bronze atrás do australiano Peter Norman.

Na parte da tarde, na entrega das medalhas, Smith e Carlos fizeram o protesto no pódio, uma ação preparada antes do início dos Jogos Olímpicos. Os dois atletas eram ativistas desde a etapa na Universidade Estatal de San José, na Califórnia, onde faziam parte do Projeto Olímpico pelos Direitos Humanos (OPHR), criado pelo sociólogo Harry Edwards. Ambos receberam suas medalhas descalços, simbolizando a pobreza dos negros nos Estados Unidos.

Smith vestiu um cachecol preto para refletir o orgulho negro, enquanto Carlos levava consigo um colar de contas para representar "as pessoas que foram linchadas ou assassinadas e que ninguém fez uma oração por elas".

A princípio, ambos tinham planejado levar um par de luvas pretas cada um, mas Carlos esqueceu as suas e os dois acabaram compartilhando as de Smith, por sugestão de Norman. Os três, Carlos, Smith e Norman, também usaram insígnias da OPHR. 'As pessoas começaram a aplaudir com entusiasmo. De repente, imagino que decidiram que não gostavam do que estavam vendo e (os aplausos) se tornaram veneno e ira", explicou Carlos em um encontro na Cidade do México no mês passado.

"Isso me levou a uma espécie de estado de choque. Deixei o pódio no final com essa sensação de ter nascido no dia 5 de junho de 1945 para estar ali naquele 16 de outubro de 1968. Esse era meu propósito na vida". acrescentou.

As repercussões contra Smith e Carlos foram duras. Brundage, presidente do Comitê Olímpico Internacional (COI) na época, pediu enfurecido que ambos deixassem a Olimpíada. Um porta-voz da entidade descreveu o ato como "uma violenta brecha do espírito olímpico".

Em dois dias, o Comitê Olímpico dos Estados Unidos aceitou o pedido do COI, mandando Carlos e Smith para casa. Foram recebidos como traidores, inclusive sendo ameaçados de morte. Carlos atribuiu o suicídio de sua esposa Kim, em 1977, às turbulentas consequências da controvérsia. O velocista qualificou a perda da mulher como "maior tristeza" de sua vida.

Enquanto os dois atletas viviam com as consequências de seus protestos, o mundo do esporte já tinha sofrido mudanças. Dave Zirin, editor de esportes da revista The Nation e autor do livro The John Carlos Story: The Sports Moment that Changed the World (A história de John Carlos: o momento esportivo que mudou o mundo), acredita que o protesto de 1968 deu maior poder aos atletas no mundo do esporte.

"Estes punhos para o alto e as revoltas dos atletas negros assustaram muito o mundo do esporte", disse Zirin à AFP. "Tudo o que você vê na década de 1970, com a agência livre e salários mais altos, pode ser conectado àquele momento de 1968. E isso levou a grandes fortunas de várias gerações de atletas negros", acrescentou.

"O fator do medo que criou, e a maneira em que os atletas disseram 'espera um momento, estes Jogos são sobre nós e vamos impor nossa vontade política", analisou.

Para Zirin, o recente ativismo de atletas como o ex-quarterback do San Francisco 49ers, Colin Kaepernick, está diretamente relacionado a Carlos e Smith. "Muito atletas citam 1968 como uma lembrança para dizer 'olha, isso aconteceu antes, esse é nosso legado como atletas que protestam e não vamos renunciar a isso'", apontou. "Quando você vê atletas agachados, apoiando o joelho e com o pulso para o alto, estão fazendo isso pela conexão com Tommie Smith e John Carlos."

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