'Vou te matar': o chocante relato em que Salma Hayek acusa Harvey Weinstein de assédio e ameaça
Atriz mexicana narra episódios de assédio sexual, que teriam culminado com ameaça de morte, durante filmagens do filme 'Frida'; produtor nega as acusações.
"Meu monstro." É assim que a atriz Salma Hayek se refere ao produtor de cinema americano Harvey Weinstein.
A mexicana, de 51 anos, é mais uma atriz famosa que vem a público acusar o magnata da indústria do entretenimento de assédio sexual.
"As táticas de persuasão dele iam de falar coisas doces a fazer promessas, até uma vez que, em um ataque de raiva, ele disse as palavras mais assustadoras: 'Vou te matar, não ache que eu não sou capaz'", conta Hayek em artigo publicado na quarta-feira no jornal americano The New York Times.
No texto, a artista descreve em detalhes os episódios de agressão e coação que teria vivido ao trabalhar com Weinstein antes e durante as filmagens de Frida (2002), que rendeu a ela a indicação ao Oscar de Melhor Atriz.
As primeiras acusações contra Weinstein, de 65 anos, começaram a surgir em outubro deste ano. Atrizes, modelos e funcionárias que passaram pelas produtoras Miramax e The Weinstein Company vêm denunciando casos de assédio sexual, incluindo estupro, atribuídos ao empresário. Há relatos de atrizes como Angelina Jolie, Gwyneth Paltrow e Rose McGowan.
Weinstein, que se afastou de sua produtora após a eclosão do escândalo, nega as acusações da atriz.
Hayek admite que demorou muito para compartilhar sua história, dizendo que não queria dar detalhes à família do que havia acontecido. Ela diz que mudou de ideia "quando tantas mulheres tomaram a iniciativa de descrever o que Harvey fez com elas".
"Tive que enfrentar minha covardia e aceitar humildemente que minha história, embora importante para mim, é apenas uma gota em um oceano de confusão e dor", afirma.
Frida, um sonho
A ex-estrela de novelas mexicanas conta que, no início dos anos 2000, não era "ninguém" no mundo do cinema e tentava se aventurar em Hollywood.
E se aproximou de Weinstein e seu "império" cinematográfico para materializar um sonho: levar à telona uma produção sobre a artista mexicana Frida Kahlo.
"A única coisa que eu sabia sobre Harvey naquela época é que ele era muito inteligente, um amigo leal e um homem de família", diz Hayek.
Ela relata que ficou muito emocionada quando ele aceitou participar do filme que viria a se chamar Frida, produção que consolidou a careira da atriz em Hollywood.
"Na minha ingenuidade, achei que meu sonho tinha sido realizado", conta.
Mas, assim que começou o trabalho de pré-produção do filme, ela começou a conviver com o que chama de "a ira maquiavélica de Harvey".
O pesadelo de Frida
Em vários trechos do relato, Hayek descreve a provação que passou no dia a dia com Weinstein - e os inúmeros "nãos" que teve que dar diante do assédio constante.
As negativas incluem se recusar a abrir a porta do quarto do hotel à noite, a fazer massagem e a tomar banho com ele, além de situações mais graves: "não deixar ele fazer sexo oral em mim".
Segundo a atriz, a sequência de "nãos" despertou a "ira maquiavélica" de Weinstein, que culminou com ameaças de morte.
A pré-produção de Frida se tornou, então, um pesadelo, diz.
"Para ele, eu não era uma artista; nem sequer uma pessoa. Era um objeto: ninguém, apenas um corpo", diz a atriz em seu texto.
'Destruiu minha alma'
Após vários embates que colocaram o projeto em risco, Hayek finalmente começou a rodar o filme.
Segundo ela, neste momento "o assédio sexual terminou, mas a ira aumentou".
Ela conta que Weinstein passou então a agredi-la verbalmente. Dizia que a "sexualidade" era seu único valor e, em Frida, não poderia usar esse atributo, já que interpretaria a célebre artista mexicana que tem a história contada no filme.
"Destruiu minha alma, porque devo confessar que, naquele momento, dominada por uma espécie de Síndrome de Estocolmo, eu queria me ver como artista: não só uma atriz capaz, mas alguém que poderia identificar uma história que vale a pena ser contada e consegue contá-la de forma original ", diz Hayek.
Uma cena erótica de Frida, entre Hayek e outra mulher, teria sido uma das condições impostas por Weinstein para produzir o filme.
"Minha mente entendia que eu tinha que fazer isso, mas meu corpo continuava chorando e convulsionando. Na hora, comecei a vomitar, e todos me esperavam no set para gravar", lembra.
Hayek recorda que os colegas ficaram surpresos com sua reação.
"Não era porque eu ia ficar nua com outra mulher. Era porque eu ia ficar nua com outra mulher por causa de Harvey Weinstein. Mas não podia dizer isso a eles", esclarece.
Após as supostas ameaças do produtor, Frida finalmente estreou em 2002, com sucesso de bilheteria e seis indicações ao Oscar - vencedor nas categorias maquiagem e trilha sonora.
'Terreno fértil para predadores'
"Tenho que admitir que às vezes ele era amável, engraçado e espirituoso, e isso era parte do problema: você nunca sabia que Harvey você enfrentaria", diz.
Para a atriz mexicana, a experiência com Weinstein a ajudou a entender como alguns homens usam a posição de poder para assediar mulheres.
"Os homens assediam sexualmente porque podem. E as mulheres estão falando porque, nesta nova era, finalmente podemos fazer isso", diz.
Segundo ela, enquanto apenas homens tiverem o poder na indústria cinematográfica, ainda haverá um "terreno fértil para predadores".
Resposta de Weinstein
A equipe de Harvey Weinstein reagiu ao artigo de Hayek negando as acusações em comunicado à imprensa:
"Weinstein considera Salma Hayek uma atriz de primeira linha e a contratou para vários de seus filmes. Ficou muito orgulhoso com sua indicação ao Oscar de Melhor Atriz por sua atuação em Frida e continua a apoiar seu trabalho", diz trecho da nota.
"Jennifer López também estava interessada no papel de Frida e, na época, era uma estrela mais popular. Weinstein passou por cima de outros investidores para respaldar Salma como protagonista", continua o texto, que dá detalhes sobre os investimentos da Miramax, empresa dele à época, na produção e promoção do filme.
O comunicado admite que houve atritos, mas nega que Weinstein tenha imposto qualquer cena erótica.
"Como na maioria dos trabalhos conjuntos, houve atritos criativos em Frida, mas serviram para levar o projeto à perfeição. O filme estreou em vários cinemas e teve o apoio de uma grande campanha publicitária e um enorme orçamento de promoção para o Oscar."
"As acusações sexuais de Salma não são precisas e outras pessoas que testemunharam os eventos têm uma versão diferente do que aconteceu", acrescenta.