Carregados de emoção, componentes da Portela iniciam ano cantando bastante em ensaio de rua
Nem a fina chuva que teimou a voltar a cair em Madureira tirou a alegria do portelense que retomou a sua preparação para o próximo carnaval e realizou o primeiro ensaio de rua do ano em que vai comemorar o centenário da escola. O treino que teve duração de 1 hora e 8 minutos, aconteceu na Estrada do Portela, contemplando o trecho entre a Rua Clara Nunes e a Praça Paulo da Portela. O destaque ficou para o canto forte da comunidade que se mostrou bastante intenso durante todo o desfile, além da bateria de mestre Nilo Sérgio e o primeiro casal de mestre-sala e porta-bandeira, Marlon Lamar e Lucinha Nobre. Em 2023, a Majestade do Samba será a segunda escola a pisar na Sapucaí na segunda noite de desfiles do Grupo Especial com o enredo “O Azul que vem do infinito”, que está sendo produzido pela dupla de carnavalescos Renato Lage e Márcia Lage.
O ensaio começou por volta das 19h30 e a chuva fina que começava a cair no bairro da Zona Norte permaneceu por todo o treino, em alguns momentos mais forte e em outros mais fraca. O trecho compreendido entre a rua Clara Nunes, via da quadra da Portela e a Praça Paulo da Portela, é uma subida, mas isso não impediu a alegria dos foliões e o canto do samba pela comunidade, que se manteve forte até o fim. Marlon Lamar e Lucinha Nobre brindaram o público apresentando já trechos da coreografia que vão levar para a Sapucaí e a bateria do mestre Nilo Sérgio trouxe um andamento bastante agradável para o samba que ajudou na boa evolução da escola.
O vice-presidente Júnior Escafura avaliou positivamente o ensaio deste domingo e a preparação que a Portela vem realizando para o próximo carnaval.
“Acho que a avaliação é muito positiva, a gente tem uma escola feliz que canta muito o samba, evoluí, brinca, acho que esse é o espírito da Portela. A gente vai fazer um desfile pautado na emoção que é a cara do portelense, ainda mais com todo o simbolismo dos 100 anos da escola. Todo mundo está vendo nos ensaios, os componentes se entregam de verdade, cantam, brincam, se divertem, porque isso é ser Portela, é ser Portela e tanto mais”, avaliou o dirigente.
Júnior revelou que a escola levará cerca de 2800 componentes para a Sapucaí e que as alas comerciais serão apenas seis, todo o restante será formado pela comunidade. Escafura também comentou a importância do ensaio de rua para a agremiação.
“A gente tenta fazer da melhor maneira possível, a gente tem as nuances do ensaio de rua, um monte de vendedores ambulantes, mas a gente também tem a parte muito positiva que é essa energia de estar aqui fazendo ensaio na Estrada do Portela, a raiz da escola está aqui. É muito importante a gente fazer esse ensaio porque a gente pega essa energia. São centenas, milhares de pessoas as vezes que vem para as ruas ou ficam em suas casas, nos prédios, nas varandas passando essa energia, soltam fogos, agitam bandeiras, isso para nós é muito importante, contagia a escola de uma certa maneira, a gente dribla as dificuldades que existem. Acho que de uma maneira geral a escola está cantando muito e evoluindo bastante, a ideia é a gente chegar no nosso ensaio técnico com a melhor preparação possível para que no dia do desfile a gente faça um grande carnaval”, finalizou o vice-presidente.
Harmonia e samba-enredo
Gilsinho iniciou o samba da Portela 2023 fazendo a primeira passada, antes mesmo do grito de guerra, bem melódica e tranquila deixando a comunidade mostrar que estava com o samba na ponta da língua e já criando um clima de emoção que chegou a todos os componentes. Depois, já com a bateria, e com mais energia, a escola seguiu cantando o samba e desviando das adversidades como a chuva e a subida que compreendia boa parte do percurso escolhido para o treino.
Em cima do carro de som, por conta da chuva, a equipe de voz da Portela em nenhum momento deixou o samba cair e Gilsinho chamava os desfilantes a entoar o samba com emoção, sem esquecer de imprimir a sua já conhecida potência vocal na obra. Nas laterais da rua, o público que acompanhava o ensaio também respondeu bem ao samba com muitos dos espectadores cantando junto com a escola. O trecho cantado com mais emoção era o refrão principal “Cavaco e viola…” em que a maioria da comunidade levantava as mãos para o céu, como que pedindo bênçãos aos seus ancestrais e aos fundadores da Majestade do Samba. O canto foi o ponto alto da noite portelense.
Ao CARNAVALESCO, o intérprete Gilsinho disse o que espera do samba de 2023 e explicou a diferença do ensaio de rua para quadra. “Espero que ele (samba) funcione muito bem, assim como tem acontecido nos ensaios. Samba bom, bem construído, com todas as partes muito boas de cantar. Sobre os ensaios, na quadra tem muita reverberação, ao ar livre é bem melhor. E a expectativa para o centenário, é minha sorte, meu nome vai ficar para sempre na história da Portela”.
Bateria
A “Tabajara do Samba”, comandada por mestre Nilo Sérgio, apresentou o samba em de cerca de 144 variando apra 145 BPM (batidas por minuto), segundo o próprio mestre, um andamento confortável, dentro das característica da bateria da Portela que possibilitou que os componentes evoluíssem e cantassem a obra de forma bastante agradável. Destaque para os desenhos de tamborim e agogô bastante encaixados a métrica do hino da Portela para o desfile em seu centenário. Nilo Sérgio trouxe duas bossas que irão para a Sapucaí para serem trabalhadas no ensaio, uma delas no refrão do meio, como o agogô chamando no último verso “Deixa a Portela passar” e a outra no trecho “Nas mãos de quem sabe o valor do passado” na segunda do samba indo em preparação para o refrão principal. Mestre Nilo, em entrevista ao site CARNAVALESCO após o ensaio, avaliou o rendimento da “Tabajara do Samba” em mais um treino ao ar livre.
“O andamento do samba está confortável para o portelense cantar, desfilar. Estamos trabalhando com duas bossas, porque eu tinha até outra bossa para colocar, mas a cabeça do samba não pede. É o Paulo falando com a Portela. Eu não posso botar na cabeça do samba uma bossa porque é o Paulo vindo e falando com a Portela nos 100 anos. Se eu botar uma bossa ali eu estou agredindo a palavra do Paulo, nosso professor. Essa é a parte mais gostosa do samba. Nós pegamos uma parte da bossa de 2012, estamos pegando os desenhos sem agredir o samba, nos desenhos de Tamborim , uma parte é do ‘Lendas e mistérios da Amazônia’, nós fizemos uma colcha de retalhos para poder fazer o samba, e onde pede samba estaremos fazendo a parte de samba, estamos valorizando a história, é o centenário da escola. Algum ajuste sempre vai ter que ter, porque o ensaio é para isso. Eu gosto de ensaiar segunda, quarta e sexta, e agora domingo na rua. Cada momento a gente vai limpando uma coisa para poder chegar no dia do desfile bem. E o ensaio de rua ajuda na nossa avaliação, porque a quadra é muito fechada. Eu prefiro mais na rua que na quadra”, entende o comandante da Tabajara do Samba.
Nilo Sérgio também revelou que a bateria da Portela vai levar para a Sapucaí 280 ritmistas e comentou sobre o nível de excelência que as baterias chegaram, que impressiona inclusive pelo número de notas 10 que o quesito tem recebido nos últimos anos.
“Eu acho que a tendência é continuar essa excelência porque hoje as baterias tem vários mestres de qualidade, os antigos, os novos que estão chegando aí, e estão dando atenção ao andamento, e estão colocando em prática. E a gente da antiga, se a gente der mole, os novos estão vindo. E cada um vem com a sua característica, com a sua afinação, com as suas bossas. Cada um tem o seu modo de ver do carnaval. A rapaziada nova está vindo bem”, avalia o mestre de bateria.
Mestre-sala e Porta-bandeira
Desde 2018 juntos na Águia de Madureira, Marlon Lamar e Lucinha Nobre, que fizeram uma grande apresentação em 2022, parecem querer repetir a dose e conquistar mais premiações em 2023. Mesmo com os cuidados e dificuldades imprimidas pela chuva, a dupla mostrou bastante intensidade e trouxe um pouco da coreografia que vai levar para a Sapucaí, além de brindar o público com muita simpatia e atenção durante os deslocamentos entre um módulo e outro.
O casal mostrou o entrosamento e a intensidade de sempre. Lucinha impressionava com seus giros e força ao empunhar a bandeira, sempre com precisão nos movimentos. Marlon carregava um leque na mão que ajudava a cortejar a bandeira, em determinado momento por alguns segundos na coreografia apresentada ele passava para a mão de Lucinha. Outro momento de bastante beleza aconteceu no trecho “Deixa a Portela passar” em que o casal jogava beijos para o público. A dupla também fez um movimento de roda em um trecho da coreografia.
O casal explicou a diferença de ensaiar na rua. “Na rua tem a energia das pessoas passando, as coisas vão acontecendo e hoje teve chuva, atrapalha um pouco, mas como a prioridade é o desfile, precisa ser tudo com cuidado”, disse Lucinha. “Como a Lucinha bem falou, na rua tem suas dificuldades, como buraco, por exemplo, aí vai com muito cuidado, mas é uma energia como na Sapucaí, muito gratificante”, completou Marlon.
Lucinha e Marlon também responderam sobre o perfil do julgamento para 2023, se será mais focado na dança ou na coreografia. “A Portela tem uma responsabilidade a mais por seu centenário, o jurado tem um olhar clínico, vai ficar de olho em tudo só pra tirar ponto, mas não será diferente dos outros anos, vão avaliar tudo”, afirmou a porta-bandeira, que também falou da fantasia: “Está em fase de finalização. Plena confiança no trabalho do Fernando Magalhães, com quem nós trabalhamos há anos. Com certeza será bonita e diferente de tudo usado até aqui”.
Evolução
A Portela evoluiu de uma forma satisfatória. Levando-se em conta as dificuldades de uma subida e de uma rua que é bastante apertada, ainda mais pelo número expressivo de pessoas acompanhando o ensaio nas calçadas, a escola conseguiu superar algumas invadidas de pista e o aperto em alguns trechos, até por conta das barraquinhas de vendedores ambulantes, para passar bem. Alguma atenção deve ser dada para se evitar buracos, principalmente, após a apresentação do primeiro casal, que em determinado momento a ala que vinha na frente deixou um pequeno espaço que não chegou a se configurar um buraco, mas gerou uma atenção maior e comentários da própria equipe de harmonia.
No mais a escola fez muito bem os movimentos, de forma organizada. Outro fator a se atentar é o ritmo, no início, a evolução dos componentes se deu de uma forma mais rápida, talvez pelo fato de o ensaio não ter contado com a participação da comissão de frente que ajudaria na percepção de deslocamento. Depois, ao longo do treino, a evolução se deu de forma mais espontânea e cadenciada. Pode-se observar também algumas alas coreografadas que geravam bastante curiosidade do público. A ala “os impossíveis” traziam bastões e faziam uma bonita dança, cada componente bailando de mão dadas com um par.
Outros destaques
Antes do ensaio, a agremiação lembrou a morte do ex-jogador Roberto Dinamite que faleceu neste domingo, através de um minuto de salva de palmas. O jogador era amante do carnaval e chegou a desfilar pela Azul e Branca de Madureira algumas vezes, entre outras agremiações. As calçadas da Estrada do Portela traduziam a participação expressiva do público mesmo em uma noite chuvosa. Era bastante difícil transitar pelos espaços, tamanho o contingente de espectadores que cantavam e dançavam enquanto a Portela passava. A rainha Bianca Monteiro, mais uma vez, mostrou muito samba no pé e interagiu bastante com a comunidade. No esquenta, Gilsinho cantou duas passadas de “Portela na Avenida” deixando em diversos momentos a condução do samba apenas com os componentes sendo correspondido na força do canto da comunidade.