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Escolas de samba devem demorar para incorporar inteligência artificial no Carnaval

Carnavalescos se dividem entre uso moderado e rejeição à tecnologia queridinha de outros megaeventos

1 fev 2024 - 05h00
(atualizado em 5/2/2024 às 18h21)
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Carnavalesco da Imperatriz Leopoldinense, campeã do carnaval carioca, conversou com o Byte sobre o uso de inteligência artificial (IA)
Carnavalesco da Imperatriz Leopoldinense, campeã do carnaval carioca, conversou com o Byte sobre o uso de inteligência artificial (IA)
Foto: Divulgação/Riotur/Léo Queiroz

Pouco explorada em 2023, a inteligência artificial (IA) foi cotada para integrar em 2024 o rol de inovações nos desfiles das escolas de samba, como LEDs, lasersdrones e materiais especiais.

Mas carnavalescos estão alongando todos os músculos com calma antes de entrar na pista da chamada “corrida da inteligência artificial”.

A importância dada à tradição e à participação popular, além do conservadorismo para adotar novas técnicas, faz com que as agremiações tomem caminhos mais cautelosos do que o resto do setor de megaeventos para abraçar a IA, segundo fontes consultadas pelo Byte. 

“A inteligência artificial não dá conta da diversidade dos artistas. Criações com ela ficam com uma visão meio pasteurizada, representando um mesmo modo de fazer, um estereótipo do que seria o carnaval”, descreve Leandro Vieira, carnavalesco da Imperatriz Leopoldinense, atual campeã do Grupo Especial do Rio de Janeiro.

Político e progressista na maioria de seus temas, o carnaval é fechado para inovações de técnica e procedimento. É o que defende Aydano André Motta, jornalista e autor do livro “Maravilhosa e Soberana - Histórias Da Beija-Flor”, biografia na escola nilopolitana.

“O carnaval é inovador nas ideias, mas conservador nos processos. Porque, na avenida, nada pode dar errado nenhuma vez. Não dá pra ficar testando. Então, apostar no desconhecido é muito difícil”, comenta.

Portela trouxe show de drones para a avenida em desfile que celebrou centenário da escola
Portela trouxe show de drones para a avenida em desfile que celebrou centenário da escola
Foto: Divulgação/Riotur/Ismar Ingber

Megaeventos esbanjam tecnologia. E o carnaval com isso?

Eventos de grande porte no Brasil não medem esforços para integrar inovações tecnológicas. A edição de 2023 do The Town, festival de música realizado em São Paulo, fez o uso intensivo de painéis de LED e até artes criadas com IA nos palcos, por exemplo.

Além disso, assim como o Rock in Rio, o The Town também usou "cães-robô", equipados com IA e sensores, na segurança dos shows.

Com um palco em forma de pirâmide equivalente a um prédio de oito andares, o show do DJ Alok na comemoração dos cem anos do Copacabana Palace também entra para o time dos recentes eventos tecnológicos, com luzes, lasers e drones.

A tensão entre inovação e tradição nas escolas de samba, por outro lado, é muito mais velha do que a própria era digital. Já em 1982, o Império Serrano criticava as "Super-escolas SA" em seu samba-enredo:

"Super Escolas de Samba S/A

Super-alegorias

Escondendo gente bamba

Que covardia!"

 

Porém nunca foi uma questão de escolha. Com o passar do tempo, inovar — mesmo que à sua maneira — se tornou questão de sobrevivência para as agremiações.

"A tecnologia que tira o sono dos carnavalescos é a de Parintins. É a que mais se renova", comenta Aydano André Motta.

Ele se refere a um grupo de profissionais que, desde a década de 90, se tornou caríssimo às escolas cariocas e paulistas.

Todos os anos, eles saem do Amazonas e levam a expertise do tradicional Festival Folclórico de Parintins, festa popular que acontece todos os anos no município de Parintins, no interior do estado, ao Sudeste.

O espetáculo ocorre em uma espécie de arena, o Bumbódromo. Nela, as agremiações do Boi Caprichoso e do Boi Garantido se apresentam e disputam o título com fantasias, músicas, enredo e alegorias.

Grande parte da robótica e hidráulica, o que mexe nos carros alegóricos e tripés das escolas de samba, é atribuída a esses artesãos do Norte.

Artesão Eli Pereira Natividade dentro de carro alegórico da Império de Casa Verde
Artesão Eli Pereira Natividade dentro de carro alegórico da Império de Casa Verde
Foto: Terra Byte

"Não é que o pessoal de Parintins não compartilhe as técnicas. É que ninguém consegue fazer igual, mesmo vendo como se faz", continua o pesquisador.

O carnavalesco Paulo Barros, conhecido por supreender na avenida, assina um dos carros mais marcantes dos desfiles de 2023: um São Jorge todo de espelhos que batalha contra um dragão que soltava fumaça, pela Vila Isabel.

A obra, que conta com mão-de-obra parintinense, está em exibição na Cidade do Samba, no Rio de Janeiro.

"Eu gosto de pensar que tecnologia é inteligência ancestral, aplicada com centenas de mãos. Acho muito pouco inteligente apertar um botão em uma máquina e algo acontecer", comenta Leandro Vieira, da Imperatriz Leopoldinense.

"Não é porque o carnaval é folclórico que não pode ser tecnológico. Acho justamente o contrário", diz Fernando Delicato, CEO da Sirius Drones, uma das empresas fornecedoras de drones e LEDs para agremiações que passam pela Marquês de Sapucaí.

"A inteligência artificial pode ser válida se for usada como uma ferramenta. Outra coisa é usá-la como substituta da criatividade", pondera.

Ainda assim, alguns carnavalescos veem a normalização da inteligência artificial como inevitável, mesmo que demore mais para acontecer.

É o caso de Rayner Pereira, natural de Parintins e estreante no comando do baracão da Gaviões da Fiel, tetracampeã no carnaval de São Paulo. A escola vai levar para a avenida o enredo cósmico "Vou te levar para o infinito" e deve explorar o conceito de limites da criatividade em um de seus carros.

"Nos próximos anos, a IA vai vir a calhar, porque facilita alguns processos. Mas ainda preciamos entender mais antes de implementar", diz.

Mauro Quintaes, que assinou o desfile campeão da Porto da Pedra na Série Ouro em 2023, no Rio de Janeiro, garantindo o retorno da escola ao Grupo Especial em 2024, é aberto a novas tecnologias em seus processos criativos.

Carnavalesco parintinense exibe montagem de alegorias no barracão da Gaviões da Fiel
Carnavalesco parintinense exibe montagem de alegorias no barracão da Gaviões da Fiel
Foto: Terra Byte

Ao Byte, o veterano dos barracões, que usa modelagem e impressão 3D em seu trabalho, comentou que a IA não representa uma ameaça. É mais uma tecnologia que os profissionais do carnaval terão a "obrigação" de absorver para otimizar o trabalho como melhor entenderem.

"Vai ficar sempre muito claro o que é uma alegoria assinada por Mauro Quintaes, Rosa Magalhães ou Renato Lage, e o que é uma alegoria assinada por inteligência artificial", diz.

Os dirigentes de baracão no Rio de Janeiro têm uma preocupação tecnológica mais urgente do que a IA. Uma das novidades da Sapucaí, já testada no ano passado, é a nova mesa de iluminação cênica, que possibilita que as escolas adaptem as luzes para cada momento do desfile. 

A maioria das agremiações se prepara deve explorar a ferramenta e a expectativa é que o carnaval de 2024 seja uma espécie de prova de fogo para bons e maus usos da nova luz na avenida.

O que dizem as entidades que organizam o carnaval

O regulamento de São Paulo e do Rio de Janeiro é aberto quanto a possibilidade de inovações na avenida por parte das escolas, desde que cumpram com critérios de segurança, e nenhum deles cita diretamente o uso de inteligência artificial.

Procuramos a Liga-SP e a Liga das Escolas de Samba (LIESA), entidades responsáveis pelos desfiles nos sambódromos de São Paulo e do Rio de Janeiro, respectivamente, para entender como os organizadores se posicionam quanto ao uso de inovações nas escolas, e se a chegada da inteligência artificial mudaria alguma dinâmica nesse sentido.

Até o fechamento da reportagem, não conseguimos resposta.

Como são criadas as músicas por inteligência artificial? Como são criadas as músicas por inteligência artificial?

Fonte: Redação Byte
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