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'Disclaimer' parece boa, mas só Cate Blanchett salva um texto tão ruim

Nova série do Apple TV+ dirigida e escrita por Alfonso Cuarón é estrelada por Cate Blanchett e tem chamado atenção entre fãs.

22 nov 2024 - 05h00
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Cate Blanchett em 'Disclaimer'
Cate Blanchett em 'Disclaimer'
Foto: Apple TV+/Divulgação

À primeira vista, "Disclaimer" impressiona pelos motivos corretos. Afinal, é uma série de Alfonso Cuarón, quatro vezes vencedor do Oscar, estrelada por Cate Blanchett, duas vezes vencedora do Oscar. Só essa apresentação muitas vezes já basta para chamar atenção, sem contar na fotografia de Emmanuel Lubezki, na trilha sonora de Finneas O'Connell e na direção de arte de Alex Baily. Mas, infelizmente, a sensação depois de assistir à série completa é de ter sido vítima de uma grande enganação.

Não é incomum que a alcunha de personagens controversos seja usada para justificar inconsistências na base de uma obra, mas este não é o único problema da nova minissérie do Apple TV+. Há uma confusão no ar quando o que deveria ser uma crítica torna-se, na verdade, uma reprodução acrítica daquilo que deveria ser criticado, e isso está na escolha de estruturar a obra da forma como foi apresentada.

Afinal, a ideia ao adiar para o último dos 7 episódios o momento em que Catherine (Blanchett) enfim conta a sua versão do que aconteceu naquele fatídico verão em Roma tem um sentido claro: denunciar o quanto mulheres são silenciadas e o quanto as pessoas são ávidas por polêmicas e julgamentos precoces. Mas quando a outra versão da história desliza pela tela por seis longas horas sem questionamento, sem um contraponto e com tempo demais para aquilo deixar de ser crível até para o mais desatendo sentado no sofá, tudo o que a série faz é escancarar os próprios problemas de ritmo e o quanto os coadjuvantes são meros rascunhos sem personalidade e à serventia do roteiro. 

Dirigida e escrita por Cuarón, a série é adaptada do livro homônimo de Renée Knight de 2015 ("Difamação", editora Suma), e acompanha a história da renomada documentarista Catherine Ravenscroft, que certo dia recebe em sua casa a cópia de um livro independente cuja semelhança com a realidade, segundo ele mesmo, "não é mera coincidência". Logo ela descobre que aquela história, na verdade, é sobre ela, e um segredo que ela esconde há 20 anos.

A chegada desse livro na vida de Catherine é obra do solitário Stephen Brigstocke (Kevin Kline, excelente), que perdeu a esposa, Nancy (Lesley Manville) há 9 anos e o filho, Jonathan (Louis Partridge), há muito mais tempo. Quando estava limpando os itens deixados pela mulher, acabou encontrando o rascunho de um livro que ela havia escrito, junto a fotos comprometedoras das últimas férias de Jonathan. Tudo isso faz ele mirar em Catherine para se vingar da morte do filho, acusando a mesma de ter sido responsável pela fatalidade. 

A atriz Leila George interpreta Catherine nos flashbacks de 'Disclaimer', e contracena com Louis Partridge (Jonathan)
A atriz Leila George interpreta Catherine nos flashbacks de 'Disclaimer', e contracena com Louis Partridge (Jonathan)
Foto: Apple TV+/Divulgação

Todos esses elementos fazem de "Disclaimer" uma obra sobre luto, culpa e narração de fatos, mas Cuarón parece ter dificuldades para litar com esses temas da maneira intimista que seria ideal. Ao invés de olhar para dentro, o diretor expande os olhares para criar um grande espetáculo que diminui a credibilidade e a verossimilhança do encadeamento de fatos. O uso excessivo da narração em off, na voz de Indira Varma, já denuncia que há uma dificuldade na transposição dos meios. Tal recurso, que funciona muito bem nas páginas de um livro, parece um apoio preguiçoso, uma forma de mastigar para o espectador o que deveria ficar claro na direção de atores. 

E, além disso, não é como se Cate Blanchett realmente precisasse de uma narração para entendermos o que ela está sentindo. 

O grande problema de "Disclaimer" é a escolha de estender por sete episódios o quanto Stephen e seu livro vão preenchendo todos os poros da vida de Catherine, a ponto de tudo parecer exagerado, irreal e uma paródia da crítica ao sexismo que é o objetivo da série. Com alguns episódios a menos, ou mesmo um filme, a concisão faria bem à trama, potencializando o trauma e a capacidade destrutiva de meias verdades. 

Por tudo isso, é inegável também que há méritos na minissérie. A fotografia de Lubezki, iluminada nas cenas de flashback para mostrar o deslumbre de Jonathan por Catherine, e fria nas cenas atuais mostrando o distanciamento de todos, funciona muito bem, e Cuarón volta a utilizar as ondas do mar como uma metáfora para representar os momentos de agonia, dúvida e calmaria mental dos personagens. 

O mérito de segurar tudo isso em pé está na compreensão de Blanchett de sua personagem, mas também no fato de a série ser perfeitamente formatada para o streaming, que divide atenção com a rolagem infinita de feed do TikTok e do Instagram. Episódio após episódio, os ganchos sempre despertam a curiosidade e fazem o play na hora seguinte ser um desejo imediato. Embora o resultado seja frustrante, o sucesso é resultado de um trabalho bem feito de pesquisa de público. 

Como a internet pode ajudar o Brasil a vencer o Oscar:
Fonte: Redação Entre Telas
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