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É Tudo Verdade completa 30 anos com edição festiva e olho no futuro: 'Uma montanha-russa'

Criador do festival, Amir Labaki discute as transformações do gênero documental, desafios de manter o evento no ar e produções para o streaming

3 abr 2025 - 09h40
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Crença reafirmada. É com essas palavras que Amir Labaki define, em entrevista ao Estadão, a sensação de ver o É Tudo Verdade chegar à sua 30ª edição. O diretor e fundador do festival, no entanto, não se deixa levar pelo encantamento e pelo que chama de autocelebração. Para ele, a maior comemoração neste momento é poder mostrar o vigor estético e a variedade de formatos que o gênero documental tem hoje.

Ainda assim, o momento é de felicidade. Ao longo das últimas três décadas, o É Tudo Verdade se estabeleceu como um dos festivais mais importantes do mundo quando o assunto é documentário, sendo palco para filmes premiados internacionalmente e discussões que ajudam a avançar o debate sobre as transformações do audiovisual.

30ª edição do Festival É Tudo Verdade acontece com homenagens e olhar para o futuro; 'É uma montanha-russa', diz fundador Amir Labaki
30ª edição do Festival É Tudo Verdade acontece com homenagens e olhar para o futuro; 'É uma montanha-russa', diz fundador Amir Labaki
Foto: @etudoverdadeoficial via Instagram/É Tudo Verdade/Divulgação / Estadão

Na nova edição, que acontece entre 3 e 13 de abril no Rio de Janeiro e em São Paulo, há espaço para novos filmes nas mostras competitivas e para celebrar os clássicos nas retrospectivas. Neste ano, serão reexibidos os vencedores das primeiras mostras competitivas do festival, da edição de 1997. São eles O Velho - A História de Luiz Carlos Prestes, de Toni Venturi, e Noel Field - A Lenda de um Espião, do suíço Werner Schweizer. Além disso, Labaki considera incontornável celebrar as trajetórias de Eduardo Coutinho e Vladimir Carvalho, que ganha uma retrospectiva especial.

"O É Tudo Verdade sai daqui", afirma, mostrando um fotograma de Cabra Marcado Para Morrer que estampa a capa do catálogo da nova edição do evento. "O É Tudo Verdade sai daqui porque existe essa tradição, porque existiam esses dois imensos cineastas documentaristas, o Coutinho e o Vladimir, fazendo documentários no Brasil com muita dificuldade, e enfrentando desafios ainda maiores para exibi-los. O convívio com eles foi muito inspirador para comprar essa batalha."

'Rock Brasília', de Vladimir Carvalho, está na 30ª edição do É Tudo Verdade; cineasta ganha retrospectiva no evento
'Rock Brasília', de Vladimir Carvalho, está na 30ª edição do É Tudo Verdade; cineasta ganha retrospectiva no evento
Foto: É Tudo Verdade/Divulgação / Estadão

A compra dessa batalha, como define o próprio Labaki, veio também da observação estratégica de um nicho que faltava ser ocupado na América Latina dos anos 90. No entanto, ele relembra que este lugar não foi construído com muita facilidade.

"Quando, em 95, a gente imaginou estabelecer um festival de documentários no Brasil, e o primeiro da história da América Latina, para mim era óbvio que isso era necessário. Mas, no mercado, não estava certo que fosse vingar", recorda. "Nós já tínhamos uma tradição de produção de documentários muito forte, o gargalo era conseguir distribuir esses filmes. Estávamos começando a ter uma evolução digital, mas o Brasil não estava conseguindo acompanhar. A aposta era que esses dois fatores, a história e a análise da situação, levavam ao estabelecimento de um festival internacional de cinema. E isso se confirmou."

'Acontece na raça'

Mesmo com a trajetória de sucesso e edições ininterruptas, Labaki admite que são raros os anos em que o É Tudo Verdade acontece com tranquilidade financeira.

"É uma montanha-russa. As pessoas imaginam que a regra é você fazer festival ou evento de cinema, ou manter uma instituição cultural no Brasil, sem muita preocupação. Mas elas estão enganadas. É uma batalha constante."

Ele revela que a situação não é diferente em 2025. "Na imensa maioria dos anos, o É Tudo Verdade acontece na raça. Essa 30ª edição, apesar de ser festiva e me parecer muito forte, está acontecendo sob condições orçamentárias muito complicadas. Mas isso não é novidade", confessa, destacando os apoiadores. "O Sesc São Paulo, a Secretaria Municipal de Cultura de São Paulo, agora com a Spcine, e o Itaú Cultural são apoios muito importantes", conta.

'Ritas': documentário sobre Rita Lee abre 30ª edição do É Tudo Verdade em São Paulo
'Ritas': documentário sobre Rita Lee abre 30ª edição do É Tudo Verdade em São Paulo
Foto: É Tudo Verdade/Divulgação / Estadão

O evento exibe neste ano um total 85 produções de 30 países, entre filmes inéditos e clássicos. Na competição brasileira de longas e médias metragens há filmes de Eryk Rocha, Bárbara Paz e da dupla Liliane Maia e Jorge Bodanzky. O longa de abertura em São Paulo será Ritas, de Oswaldo Santana, uma arqueologia da vida pessoal e do processo de criação de Rita Lee.

Já a competição internacional de longas engloba países como Ucrânia, França, México, Cuba, Suíça, Estados Unidos e Quênia. Há também as mostras não-competitivas Foco Latino-Americano, O Estado das Coisas e Clássicos É Tudo Verdade.

A versatilidade que sempre foi a cara dos filmes selecionados, portanto, se mantém. Quanto a isso, Amir compreende que há uma espécie de responsabilidade social em jogo quando se fala do poder sociopolítico inerente aos filmes documentais, e da importância de permitir que obras de diferentes temas dialoguem com os diferentes públicos.

"O universo da fake news, por definição, é baseado em coisas que não são verdadeiras e que são anônimas. Por isso que eu digo que o documentário é um antídoto: você sabe quem está trazendo aquela visão ao mundo. Há um compromisso ético de que aquela visão do mundo está enraizada no real."

Streaming, true crime e seriados: as transformações recentes dos documentários

Como acompanhou de um lugar único as evoluções que considera essenciais para o entendimento que existe hoje dos documentários, Labaki vê com bons olhos o fato de o gênero despertar grande interesse nas gerações mais atuais, mas pondera que, muitas vezes, as produções que mais chegam ao público não são necessariamente as mais completas.

Ele traça um panorama e explica que o gênero, historicamente marcado por curtas e média-metragens, foi ganhando espaço com longas sobretudo a partir dos anos 80 no mundo, e uma década mais tarde no Brasil. Isso, segundo ele, tem uma relação direta com a evolução da linguagem.

"Essa busca de um mercado mais amplo para o documentário leva os documentaristas a buscarem formas de narrar mais sedutoras", explica, descartando que o grande volume de séries documentais para o streaming faça parte desta equação.

"Hoje, o documentário é muito mais visível, ele faz parte do cotidiano das pessoas. Quando surge o streaming, e um dos formatos prediletos do streaming é o seriado, é natural que o documentário também o abrace. Infelizmente, de maneira menos original, e eu acho que não por responsabilidade dos realizadores, e sim das plataformas que são mais conservadoras mesmo."

Labaki considera que o streaming, embora produza muito em volume, ainda adota uma visão antiquada do audiovisual, baseada em repetições e formatos pré-estabelecidos.

"Logo que começaram a exibir retratos de artistas e documentários que chamam de true crime, as plataformas viram que isso era popular", nota. "É o que estão fazendo. As plataformas têm que rasgar essa cartilha conservadora e emburrecedora, que não dá conta do que é a produção documentária e não dá muita conta do que é produção ficcional. É tudo muito engessado. O cardápio é muito pobre."

Diante de tantas ideias sobre o passado e o futuro do cinema documental, algo que Labaki definitivamente não faz é tentar prever o que será das próximas edições do festival criado por ele.

"Uma das lições desses 30 anos é que não tem bola de cristal. Passamos por revolução digital, 11 de setembro, guerra ao terror, pandemia, uma nova ascensão de autocracias no mundo. Os filmes eram passados em 35 milímetros e hoje em dia é tudo digital. Arriscar qualquer prognóstico sobre o que vai acontecer seria completamente irresponsável", pontua, não sem finalizar com uma ponta de esperança.

"É uma sensação otimista, mas o que eu vejo é que os festivais de cinema estão se tornando mais importantes no mundo. E eu só posso ser otimista quanto ao documentário como forma. Ele hoje vive o seu ápice. Então, dá para acreditar que, nos próximos 30 anos, a gente ainda vai estar vivendo um pouco dessa paixão."

É Tudo Verdade 2025

  • Data: 3 a 13 de abril de 2025.
  • Circuito São Paulo: CineSesc, Cinemateca Brasileira, IMS Paulista e Centro Cultural São Paulo.
  • Circuito Rio de Janeiro: Estação NET Botafogo e Estação NET Rio
  • Entrada: Gratuita. Ingressos distribuídos 1h antes de cada sessão
  • Programação completa: disponível no site do evento.
Estadão
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